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Justiça chilena ainda tenta punir criminosos da ditadura

Chile avança nos julgamentos de pessoas acusadas de crimes de lesa-humanidade durante a ditadura como poucos países na América Latina

Passeata em memória das vítimas da ditadura chilena: além da Argentina, o Chile é o único país da América Latina que mantém na prisão os chefes da ditadura (Eliseo Fernandez/Reuters)
DR

Da Redação

Publicado em 10 de setembro de 2013 às 09h14.

Santiago do Chile - Passados 40 anos desde o golpe militar que derrubou o governo de Salvador Allende, o Chile avança nos julgamentos de pessoas acusadas de crimes de lesa-humanidade durante a ditadura como poucos países na América Latina.

Os tribunais tramitam hoje 1.250 processos, pelos quais foram julgados 911 ex-agentes, dos quais 263 receberam sentença condenatória definitiva e o resto espera ainda o resultado.

Além da Argentina, o Chile é o único país da América Latina que mantém na prisão os chefes dos organismos repressivos da ditadura de Augusto Pinochet: a Direção de Inteligência Nacional (Dina), que existiu até o final de 1977, e a Central Nacional de Informações (CNI), que a sucedeu até 1990.

Tanto o general Manuel Contreras Sepúlveda, chefe da Dina, como o general Hugo Salas Wenzel, último chefe da CNI, estão condenados à prisão perpétua. O major do exército, Álvaro Corbalán Castilla, que foi chefe da CNI em Santiago, cumpre a mesma pena.

Mas, apesar disso, as organizações de direitos humanos se mostram críticas com a atuação do Poder Judiciário nestes casos.

Uma das principais críticas é a quantidade de agentes que receberam penas baixas, que, de acordo com a legislação processual penal chilena, podem ser cumpridas em liberdade vigiada.

Neste contexto, dos 263 condenados com sentenças definitivas, só 66 as cumprem realmente em presídios, o que evidencia que 197 agentes foram beneficiados com penas menores, que cumprem em liberdade.

Familiares das vítimas denunciam que frequentemente se cruzam nas ruas com quem assassinou ou fez desaparecer seus entes queridos.


Por outra parte, dos 66 agentes que cumprem penas efetivas, pelo menos 15 recebem benefícios penitenciários, desde a saída dominical ou de fim de semana até a saída diária com retorno À prisão apenas para pernoitar.

As organizações de direitos humanos também criticam a lentidão dos processos, alguns dos quais se mantêm abertos há 15 ou 20 anos. Isto traz como consequência a morte de processados sem cumprir pena alguma, o que acrescenta o sentimento de impunidade entre os familiares.

Atualmente, apenas 30 juízes se dedicam exclusivamente a este tipo de julgamento e vários deles devem abordar até 50 causas ao mesmo tempo.

Outra queixa está relacionada com as prisões especiais para militares que cometeram delitos de lesa-humanidade.

Em algumas, como no Penal Cordillera, nos arredores de Santiago, os condenados vivem em celas individuais e contam com comodidades das quais não gozam os demais presos.

O mesmo acontece no presídio de Punta Peuco, 35 quilômetros ao norte de Santiago, construído especialmente para que ali cumprissem suas penas em 1995 Manuel Contreras e seu segundo em comando na Dina, o brigadeiro Pedro Espinoza.

Ambos foram sentenciados a oito e sete anos de prisão respectivamente, pela responsabilidade no atentado que matou o ex-chanceler de Salvador Allende, Orlando Letelier, e sua assistente, a americana Ronnie Moffit, cometido em Washington em 1976.

Punta Peuco abriga atualmente várias dezenas de agentes condenados.

No Chile ainda está vigente uma Lei de Anistia decretada pela ditadura em 18 de abril de 1978, que expressamente perdoa os que cometeram delitos entre 11 de setembro de 1973, data do golpe de Estado, e 10 de março de 1978.


E, apesar de que desde meados dos anos 90 os tribunais já não a aplicam, o Parlamento chileno e seus partidos não a anularam devido à oposição da direita.

Pouco depois do golpe, o Poder Judiciário chileno, por meio da Suprema Corte, reconheceu o governo de fato e seu presidente naquela época, Enrique Urrutia Manzano, proclamou que o Chile vivia "um Estado de direito" e se reuniu com o ditador Pinochet para expressar-lhe apoio institucional.

Israel Bórquez Montero, sucessor de Urrutia à frente do alto tribunal, pronunciou anos depois uma frase que passou para a história: "Os prisioneiros desaparecidos estão me cansando".

Mais de 10 mil recursos de habeas corpus apresentados pelos familiares dos detidos foram negados pela Justiça chilena desde os primeiros dias da insurreição militar.

Apenas um recurso foi recebido, apresentado em novembro de 1976 a favor de Carlos Contreras Maluje, um dirigente comunista que, para evitar sua detenção, se jogou sob as rodas de um ônibus no centro de Santiago.

Apesar de gravemente ferido, foi detido enquanto gritava seu nome aos transeuntes. Isso tornou possível o recurso judicial, que não serviu para nada, uma vez o governo militar negou qualquer colaboração. Contreras Maluje é até hoje um prisioneiro desaparecido.

Após 40 anos, no último dia 6 de setembro, a Suprema Corte do Chile admitiu que os tribunais negaram a justiça aos perseguidos, o que abriu caminho para a tortura, a execução extrajudicial e o desaparecimento de pessoas.

Segundo dados oficiais, 3.200 chilenos foram assassinados por agentes do Estado durante a ditadura, dos quais 1.192 estão ainda desaparecidos, e outros 33 mil sofreram com torturas e prisões.

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Santiago do Chile - Passados 40 anos desde o golpe militar que derrubou o governo de Salvador Allende, o Chile avança nos julgamentos de pessoas acusadas de crimes de lesa-humanidade durante a ditadura como poucos países na América Latina.

Os tribunais tramitam hoje 1.250 processos, pelos quais foram julgados 911 ex-agentes, dos quais 263 receberam sentença condenatória definitiva e o resto espera ainda o resultado.

Além da Argentina, o Chile é o único país da América Latina que mantém na prisão os chefes dos organismos repressivos da ditadura de Augusto Pinochet: a Direção de Inteligência Nacional (Dina), que existiu até o final de 1977, e a Central Nacional de Informações (CNI), que a sucedeu até 1990.

Tanto o general Manuel Contreras Sepúlveda, chefe da Dina, como o general Hugo Salas Wenzel, último chefe da CNI, estão condenados à prisão perpétua. O major do exército, Álvaro Corbalán Castilla, que foi chefe da CNI em Santiago, cumpre a mesma pena.

Mas, apesar disso, as organizações de direitos humanos se mostram críticas com a atuação do Poder Judiciário nestes casos.

Uma das principais críticas é a quantidade de agentes que receberam penas baixas, que, de acordo com a legislação processual penal chilena, podem ser cumpridas em liberdade vigiada.

Neste contexto, dos 263 condenados com sentenças definitivas, só 66 as cumprem realmente em presídios, o que evidencia que 197 agentes foram beneficiados com penas menores, que cumprem em liberdade.

Familiares das vítimas denunciam que frequentemente se cruzam nas ruas com quem assassinou ou fez desaparecer seus entes queridos.


Por outra parte, dos 66 agentes que cumprem penas efetivas, pelo menos 15 recebem benefícios penitenciários, desde a saída dominical ou de fim de semana até a saída diária com retorno À prisão apenas para pernoitar.

As organizações de direitos humanos também criticam a lentidão dos processos, alguns dos quais se mantêm abertos há 15 ou 20 anos. Isto traz como consequência a morte de processados sem cumprir pena alguma, o que acrescenta o sentimento de impunidade entre os familiares.

Atualmente, apenas 30 juízes se dedicam exclusivamente a este tipo de julgamento e vários deles devem abordar até 50 causas ao mesmo tempo.

Outra queixa está relacionada com as prisões especiais para militares que cometeram delitos de lesa-humanidade.

Em algumas, como no Penal Cordillera, nos arredores de Santiago, os condenados vivem em celas individuais e contam com comodidades das quais não gozam os demais presos.

O mesmo acontece no presídio de Punta Peuco, 35 quilômetros ao norte de Santiago, construído especialmente para que ali cumprissem suas penas em 1995 Manuel Contreras e seu segundo em comando na Dina, o brigadeiro Pedro Espinoza.

Ambos foram sentenciados a oito e sete anos de prisão respectivamente, pela responsabilidade no atentado que matou o ex-chanceler de Salvador Allende, Orlando Letelier, e sua assistente, a americana Ronnie Moffit, cometido em Washington em 1976.

Punta Peuco abriga atualmente várias dezenas de agentes condenados.

No Chile ainda está vigente uma Lei de Anistia decretada pela ditadura em 18 de abril de 1978, que expressamente perdoa os que cometeram delitos entre 11 de setembro de 1973, data do golpe de Estado, e 10 de março de 1978.


E, apesar de que desde meados dos anos 90 os tribunais já não a aplicam, o Parlamento chileno e seus partidos não a anularam devido à oposição da direita.

Pouco depois do golpe, o Poder Judiciário chileno, por meio da Suprema Corte, reconheceu o governo de fato e seu presidente naquela época, Enrique Urrutia Manzano, proclamou que o Chile vivia "um Estado de direito" e se reuniu com o ditador Pinochet para expressar-lhe apoio institucional.

Israel Bórquez Montero, sucessor de Urrutia à frente do alto tribunal, pronunciou anos depois uma frase que passou para a história: "Os prisioneiros desaparecidos estão me cansando".

Mais de 10 mil recursos de habeas corpus apresentados pelos familiares dos detidos foram negados pela Justiça chilena desde os primeiros dias da insurreição militar.

Apenas um recurso foi recebido, apresentado em novembro de 1976 a favor de Carlos Contreras Maluje, um dirigente comunista que, para evitar sua detenção, se jogou sob as rodas de um ônibus no centro de Santiago.

Apesar de gravemente ferido, foi detido enquanto gritava seu nome aos transeuntes. Isso tornou possível o recurso judicial, que não serviu para nada, uma vez o governo militar negou qualquer colaboração. Contreras Maluje é até hoje um prisioneiro desaparecido.

Após 40 anos, no último dia 6 de setembro, a Suprema Corte do Chile admitiu que os tribunais negaram a justiça aos perseguidos, o que abriu caminho para a tortura, a execução extrajudicial e o desaparecimento de pessoas.

Segundo dados oficiais, 3.200 chilenos foram assassinados por agentes do Estado durante a ditadura, dos quais 1.192 estão ainda desaparecidos, e outros 33 mil sofreram com torturas e prisões.

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