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Fernández se desculpa após fala racista sobre brasileiros; Bolsonaro reage

Presidente da Argentina disse que brasileiros vieram da selva e argentinos chegaram de barco da Europa

Alberto Fernandez, presidente da Argentina congela tarifas de serviços de telefonia (Agustin Marcarian/File Photo/Reuters)

Alberto Fernandez, presidente da Argentina congela tarifas de serviços de telefonia (Agustin Marcarian/File Photo/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 10 de junho de 2021 às 08h05.

Última atualização em 10 de junho de 2021 às 20h21.

O presidente argentino, Alberto Fernández, pediu desculpas nesta quarta-feira, 9, por ter dito que mexicanos vieram dos índios, brasileiros vieram da selva e argentinos, de barco da Europa. "Eu não quis ofender ninguém", afirmou em sua conta oficial no Twitter. A declaração foi feita durante um encontro com o premiê da Espanha, Pedro Sánchez.

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"Afirmou-se mais de uma vez que 'os argentinos descendem de navios'. Na primeira metade do século 20, recebemos mais de 5 milhões de imigrantes que viviam com nossos povos nativos. Nossa diversidade é um orgulho", escreveu o presidente argentino em seu Twitter. "Eu não quis ofender ninguém, em qualquer caso, peço desde já desculpas a quem se sentiu ofendido ou invisibilizado."

Na reunião com Sánchez, Fernández creditou sua inspiração a uma frase erroneamente atribuída ao diplomata mexicano e Prêmio Nobel da Paz Octavio Paz, que teria dito “os mexicanos são descendentes de astecas, os peruanos dos incas e os argentinos dos barcos”.

Meios de comunicação argentinos, no entanto, identificaram que o trecho vem de uma música chamada Llegamos de los barcos, do cantor argentino Litto Nebbia, que diz exatamente as mesmas palavras.

O momento foi registrado em vídeo publicado no Twitter oficial da Casa Rosada. A declaração pode ser ouvida a partir dos 19 minutos.

Repercussão

No Twitter, sem citar a declaração do presidente argentino, o presidente Jair Bolsonaro reagiu ao publicar foto ao lado de índios. Na legenda, Bolsonaro escreveu a palavra "selva" e postou a bandeira do Brasil.

A apoiadores nesta quinta-feira, Bolsonaro ironizou a fala de Fernández e o comparou com o presidente da Venezuela, Nícolas Maduro. "Eu lembro que, logo depois que o Chávez morreu, assumiu o Maduro, e ele falava que conversava com os passarinhos que estavam encarnados na figura do Chávez. Acho que Maduro e Fernández, para eles não tem vacina", brincou em seguida.

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Bolsonaro, questionou se a fala do presidente argentino foi racista. "Não dirão que foi RACISTA contra indígenas e africanos que formaram o Brasil? Porém, afirmo: o barco que está afundando é o da Argentina", disse.

A presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Kátia Abreu (PP-TO) comparou o presidente argentino com Bolsonaro. “Não vou comentar o que vomitou o Bolsonaro portenho. Brasil e Argentina estão padecendo da mesma moléstia. Só loucura e preconceito”, escreveu, apagando a publicação em seguida.

Na Câmara, Aécio Neves (PSDB-MG), presidente da Comissão de Relações Exteriores na Casa, afirmou que Fernandez quis agradar o primeiro ministro espanhol e mostrar “subserviência à Europa”. “É lamentável a declaração preconceituosa feita pelo presidente Fernandéz. O tom depreciativo que reproduz uma visão colonialista, atrasada e superada da história merece repúdio”, disse.

O jornal argentino Clarín destacou em sua manchete a forte reação brasileira e a indignação no México. O Lá Nacion classificou as declarações de Fernandez como uma "vergonha nacional" e chamaram o presidente de "Filósofo racista do século 21".

O espanhol El País definiu a frase como desastrosa e disse que o presidente argentino cometeu "um erro lamentável".

Vínculos

Embora grande parte da população argentina seja composta por descendentes de imigrantes, muitos deles vindos da Europa no século 19 e 20, o país tem uma importante herança indígena, que mescla as culturas incas, mapuches, patagônicas entre outras etnias. O país também teve mão de obra africana durante seu período colonial.

Na segunda metade do século 19, a Campanha do Deserto (1878-1885), liderada pelo general Julio Argentino Roca, conquistou as estepes do sul do país, amplamente povoada por povos originários. A maioria deles foi aculturada, morta e submetida a trabalhos forçados. Muitos dos escravos afroamericanos argentinos também morreram durante a Guerra do Paraguai (1864-1870).

O presidente argentino e o premiê espanhol destacaram nesta quarta-feira a importância de União Europeia e Mercosul chegarem a um entendimento sobre o acordo comercial. "Os vínculos entre América Latina e UE são fundamentais", afirmou Sánchez.

Ele apontou questões ambientais e o combate à pandemia de covid-19 como prioridades. "Entendemos as objeções que os governos podem ter, mas acreditamos que podemos aumentar o desenvolvimento de nossos países, criando uma área comercial única no mundo", declarou.

"Precisamos avançar em acordos para enfrentar as mudanças climáticas, e a Argentina está comprometida nisso", afirmou por sua vez Fernández."Muitos pensam que Argentina não quer avançar em um acordo, mas também há problemas na Europa", indicou, destacando especialmente a questão climática.

Outro tema abordado foi a vacinação. O espanhol destacou que o país doará de mais de 20 milhões de vacinas em 2021, "especialmente para a América Latina, que necessita de solidariedade por estar sendo mais golpeada". Os líderes reforçaram que os imunizantes devem ser um "bem público global", e que é necessário aumentar sua distribuição.

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