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Escassez e altos preços levam venezuelanos a mudar cardápio

Carne, frango, queijos e até ovos se transformaram em produtos de luxo para muitas famílias que precisam organizar as contas para adquirir algum destes artigos

Venezuela: "Dois quilos de bife é (quase) o salário mínimo", contou o açougueiro (Marco Bello / Reuters)
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Da Redação

Publicado em 7 de junho de 2016 às 10h14.

Caracas - As dificuldades para comprar e o orçamento cada vez mais apertado obrigam os venezuelanos a ajustar diariamente seu cardápio, que em muitas ocasiões não é preparado com o que preferem, mas com o que "se consegue" ou com o que cabe no bolso.

Carne, frango, queijos e até ovos se transformaram em produtos de luxo para muitas famílias que, com um salário básico de 15.051 bolívares (US$ 1.505 na taxa mais baixa do mercado oficial e US$ 27 na mais alta), precisam organizar as contas para adquirir algum destes artigos.

"Eu não como arroz há 15 dias, porque não tenho arroz", disse à Agência Efe uma dona de casa em um mercado popular que abre aos sábados em Los Palos Grandes, região no leste de Caracas, e que admitiu que substitui o ingrediente que é tradicional nas mesas venezuelanas por batatas, embora não "rendam" o mesmo.

Esta mulher relatou com resignação que em sua casa não tem açúcar nem leite e que espera o retorno de sua mãe, que está em viagem ao Panamá, para encher sua despensa.

"Ontem fui a uma fila e a única coisa que estavam vendendo eram dois quilos de farinha de trigo", comentou antes de lamentar ter perdido o dia no qual, de acordo com o número de seu cartão, poderia ir ao supermercado para comprar artigos da cesta básica.

Enquanto esperava por um quilo de carne bovina a 4.800 bolívares (US$ 480 ou US$ 8,8, segundo a taxa), a mulher comenta que antes era comum observar uma fila longa neste mercado pela quantidade de compradores.

"Agora o povo compra somente o necessário", complementou um açougueiro, que calcula que as vendas de carne e frango "diminuíram quase 50%", enquanto as de peixe caíram muito mais.

Segundo este homem, que disse viver na região popular de Caricuao, o salário "não dá". "Dois quilos de bife é (quase) o salário mínimo", contou o açougueiro.

Próximo a uma fila para comprar frangos, outra mulher, que garantiu que é médica de profissão, declarou à Efe que tem comprado mais vegetais do que carnes.

"Não compro a mesma quantidade de antes, mas falei com meus filhos que já são grandes: 'Vamos comer menos, não comemos mais dois bifes, agora só um; não comemos proteína três vezes por semana, agora comemos duas'. E assim estamos", relatou a mulher, que já não vai aos supermercados porque seu horário de trabalho não lhe permite entrar em longas filas.

Como médica, lamentou que os menores na Venezuela "estão comendo menos" e alertou que "as crianças venezuelanas estão crescendo dois centímetros a menos".

"As mães têm desnutrição", apontou esta venezuelana ao comentar que "sem boa nutrição, não se tem boa aprendizagem, e sem aprendizado a cadeia de desnutrição e de falta de conhecimento persiste".

A afirmação desta venezuelana se contrapõe com a da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), que premiou a Venezuela no ano passado por reduzir, entre 1990 e 2015, a taxa de pessoas que passam fome no país para cerca de 5% da população, o equivalente a 30 milhões de habitantes.

Também no mercado, mas como vendedor, César relatou as dificuldades que enfrenta para adquirir seus produtos.

"Alguns de nossos fornecedores tiveram problemas particularmente com a farinha de trigo", afirmou o vendedor, que indicou que no caso da farinha de milho pré-cozida, precisa de aproximadamente 30 quilos por semana, mas nos supermercados só é possível comprar de dois em dois.

Perante esta realidade e para não fechar o negócio do qual dependem outras cinco famílias além da sua, César afirmou que teve que pagar com sobrepreço os "bachaqueros", como são conhecidos no país os que revendem produtos da cesta básica.

Já Alicia, que em um pequeno posto oferece molhos e refeições gourmet, admite ter inconvenientes para comprar as garrafas nas quais vende seus produtos, assim como o sal, o açúcar e o azeite que usa como base para suas receitas.

No entanto, ela ressaltou que está inventando "coisas novas" o tempo todo em seu negócio, tanto no preparo de seus produtos como para contornar a escassez.

"Nós venezuelanos temos uma coisa, nós não paramos por nada (...), ao venezuelano, graças a Deus, quando se fecha uma porta abrem-se cinco janelas", concluiu a empreendedora.

São Paulo - Filas quilométricas nos mercados se tornaram comuns na Venezuela. Já faltaram papel higiênico para turistas, cevada para a maior cervejaria do país, além da energia elétrica, que agora é cortada q uatro horas por dia. O pior, porém, vem a seguir: famílias têm pulado refeições e se alimentado mal, por não terem mantimentos suficientes. Durante os 14 anos do ex-presidente Hugo Chávez no poder, a renda do petróleo, principal produto de exportação, foi usada para subsidiar comida para a população mais pobre. Como consequência, houve uma melhora na alimentação desses venezuelanos. O problema é que com o colapso nos preços da commodity, agora sob o governo de Nicolás Maduro, essa política econômica ruiu. Segundo a agência de notícas Reuters, um estudo realizado por três universidades revela que 1.500 famílias do país têm aumentado o consumo de carboidratos em suas dietas. Para completar o quadro, 12% dos entrevistados já não fazem três refeições por dia.A brasileiraSilvone, que reside em Caracas, capital do país, há quase 8 anos e prefere que seu sobrenome não seja identificado, descreve o quadro de escassez no país."As filas começam às 22h do dia anterior. Quando chega a sua vez, não tem mais nada", conta a EXAME.com.Ela diz que compra mercadorias de "bachaqueros", pessoas que ficam nas filas e depois vendem os produtos por um valor bem mais alto.Mesmo assim, não é possível encontrar tudo o que se quer. "Leite, por exemplo, tem mais de um ano que eu não consigo", diz a brasileira.Em uma série de reportagens, a Reuters visitou famílias em Caracas para fotografar o que havia em suas casas para comer. Conheça nas fotos essas pessoas e as suas "dispensas".
  • 2. Antonio Marquez

    2 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

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    Antonio Marquez e sua esposa Maria de Marquez, na casa deles, no dia 23 de abril de 2016. "Nós estamos comendo menos, porque temos nos limitado. Nós costumávamos manter o freezer cheio, mas agora não é mais assim", disse Antonio.
  • 3. Antonio Marquez

    3 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

  • Toda a comida presente na casa de Antonio Marquez no dia 23 de abril de 2016
  • 4. Mario Bedoya

    4 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Mario Bedoya e sua esposa Carmem Bedoya posam para foto na casa deles.
  • 5. Mario Bedoya

    5 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Toda a comida presente na casa de Mario Bedoya em 21 de abril de 2016.
  • 6. Romulo Bonalde

    6 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Romulo Bonalde e sua esposa Maria de Bonalde. "Antes nós conseguíamos comprar comida para 15 dias, agora só podemos comprar para as necessidades do dia", diz Rômulo.
  • 7. Romulo Bonalde

    7 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Tudo o que a família de Romuo Bonalde tinha para comer no dia 23 de abril de 2016
  • 8. Yunni Perez

    8 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Yunni Perez com seus parentes Carlos Acosta, Adrian Gonzalez, Luis Oliveros, Luis Oliveros e Hector Acosta, na residência do casal.
  • 9. Yunni Perez

    9 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Toda a comida que havia na casa de Yunni Perez no dia 22 de abril de 2016
  • 10. Victoria Mata

    10 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Victoria Mata com seus parentes Naibeth Pereira, Sebastian, Delis Pereira, Denis Pereira e Wenderly. "Nós estamos comendo menos, porque não conseguimos achar comida. Quando ela aparece, as filas são cruéis e nós não podemos comprar. Não temos comido três vezes ao dia. Nós comemos duas refeições, quando as temos", diz Victoria.
  • 11. Victoria Mata

    11 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Todos os alimentos que a família de Victória tinha para comer no dia 21 de abril de 2016
  • 12. Duglas Shanchez

    12 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Duglas Shanchez posa sozinho em sua casa: "Nós estamos comendo mal, não conseguimos comer de forma balanceada. Se temos almoço, não temos jantar e, se temos jantar, não temos café-da-manhã", afirma.
  • 13. Duglas Sanchez

    13 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Tudo o que Duglas Sanchez e sua família tinham para comer do dia 23 de abril.
  • 14. Yaneidy Guzman

    14 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Yaneidy Guzman e suas filhas Esneidy Ramirez, Steffany Perez e Fabiana Perez. "Agora comer é um luxo. Antes nós podíamos ganhar algum dinheiro e comprar roupas, ou coisas do tipo. Agora gastamos tudo em comida", diz a mãe
  • 15. Yaneidy Guzman

    15 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Todos os alimentos na casa de Yaneidy Guzman no dia 22 de abril de 2016.
  • 16. Ricardo Mendez

    16 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Ricardo Mendez e seus parentes Raymari Guerra, Natalia Gerra, Ricardo Mendez, Dayana Mendez, Antonela Mendez, Yolimar Vetancourt e Liz Torres. "Somos uma grande família e comer tem ficado cada vez mais difícil para nós", diz Ricardo.
  • 17. Ricardo Mendez

    17 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Toda a comida que a família Mendez tinha em casa o dia 23 de abril de 2016
  • 18. Antonia Torres

    18 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    "Eu tenho comido menos e me alimentado de muitas coisas que não deveria", diz a senhora Antonia Torres em sua casa.
  • 19. Antonia Torres

    19 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Os alimentos que Antonia Torres tinha em sua casa em 22 de abril de 2016.
  • 20. Jhonny Mendez

    20 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Jhonny Mendez e seus parentes Yoelver Barreto, Yorver Barreto, Leida Bolivar e Yoalvier Barreto. "Eu tenho que sair de casa às 5h da manhã, correndo o risco de ser morto. Ficar na fila o dia todo para comprar apenas dois ou três produtos", conta Mendez.
  • 21. Jhonny Mendez

    21 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Tudo o que a família de Jhonny Mendez tinha para comer no dia 14 de abril de 2016.
  • 22. Alida Gonzaleze

    22 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Alida Gonzalez e seus parentes Manuel Garcia, Jesus Garcia, Maira Hernandez e Nixon Urbano. "Com o dinheiro que costumávamos gastar no café da manhã, almoço e jantar, nós agora conseguimos comprar apenas o café da manhã, e não para todos", diz Alida.
  • 23. Alida Gonzaleze

    23 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Os alimentos presentes na casa de Alida Gonzalez em 15 de abril de 2016.
  • 24. Lender Perez

    24 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Lender Perez, sua esposa Isamar Ramirez e suas filhas Lismar e Lucia. "Nós estamos há 15 dias comendo pão ou arepa com queijo. Estamos comendo pior que antes, porque não conseguimos achar comida e não podemos paga pelo que achamos", diz o pai da família.
  • 25. Lender Perez

    25 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Tudo o que Lender Perez e sua família tinham em casa para comer no dia 14 de abril de 2016.
  • 26. Francisca Landaeta

    26 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Francisca Landadeta e seus parentes Luisa Gomez, Gabriel Castillo, Kerlin Garrido e Antony Arias. "Nós comemos hoje, mas não sabemos se comeremos amanhã. Não estamos bem. Eu nunca pensei que isso aconteceria", diz Francisca.
  • 27. Francisca Landaeta

    27 /28(Carlos Garcia Rawlins/ Reuters)

    Todos os alimentos que Francisca e sua família tinham no dia 14 de abril de 2016
  • 28. Para saber mais

    28 /28(Meridith Kohut/Bloomberg)

    Aprovete para ver quais são as 10 maiores recessões previstas para 2016.
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