O presidente venezuelano, Nicolás Maduro. (AFP/AFP)
Agência de notícias
Publicado em 18 de agosto de 2024 às 14h47.
Enquanto opositores marchavam em centenas de cidades venezuelanas e do mundo afora para contestar o resultado das eleições do último dia 28, o presidente Nicolás Maduro, liderando uma passeata favorável aos chavistas e em defesa de sua reeleição, pediu à Assembleia Nacional que aprovasse "muito rapidamente" a lei contra o fascismo, o neofascismo e os crimes de ódio, e provocou o candidato da oposição Edmundo González Urrutia, afirmando que o ex-diplomata preparava "sua fuga da Venezuela".
— Estamos enfrentando um povo malévolo, fascista, vocês entendem o que é o fascismo? É o ódio, a intolerância, transformados em violência — disse o chavista em frente ao Palácio Miraflores, fazendo referência à coalizão opositora, e acrescentou: — Por isso, apoio com todas as minhas forças o que o povo está fazendo com a Assembleia Nacional e peço que aprove muito rapidamente [a lei] contra o fascismo, o neofascismo e os crimes de ódio.
A "lei antifascismo" propõe a punição a quem promova reuniões ou manifestações que, na visão do regime, façam "apologia ao fascismo", além da ilegalização de partidos políticos e multas de até US$ 100 mil para empresas, organizações ou meios de comunicação que financiem atividades ou divulguem informações que "incitem o fascismo".
O texto faz parte de um pacote legislativo solicitado por Maduro em meio ao impasse instaurado após as eleições. Na última quinta-feira, o Parlamento, de maioria chavista, sancionou o primeiro deles:
o projeto de lei que busca regulamentar as ONGs do país,
denunciado por ativistas, defensores de direitos humanos e a comunidade internacional como um meio para reprimir os direitos civis e recrudescer a repressão no país.
Em seu discurso, Maduro afirmou ainda que a oposição "não tem líderes" e questionou a presença de González Urrutia, que não aparece em público desde 30 de julho. O ex-diplomata foi a principal aposta da oposição após a líder da oposição, María Corina Machado, ter sido inabilitada por 15 anos e a política indicada para substituí-la, Corina Yoris, alegar que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) barrou seu registro como candidata.
— Onde está escondido Edmundo González Urrutia?! — questionou o chavista, ironizando: — Está escondido em uma caverna e preparando sua fuga da Venezuela.
Assim como a líder da oposição, o ex-diplomata está na clandestinidade desde que as autoridades abriram uma investigação penal contra ambos por "instigação à rebelião", entre outros crimes. Em um vídeo publicado nas redes sociais, González Urrutia afirmou que as manifestações de sábado "são uma força que fará respeitar a decisão de mudança".
Maduro alegou ainda que se o governo não tivesse "derrotado na segunda-feira, 29 de julho", as manifestações convocadas pela oposição, eles teriam "ido matar mais de um" dos presentes no evento que defendia sua vitória. Os protestos começaram poucas horas após o CNE divulgar a reeleição de Maduro com apenas 80% das urnas apuradas — e apesar do resultado ser contestado pela oposição e boa parte da comunidade internacional.
O procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, divulgou na semana passada que pelo menos 25 pessoas morreram e mais de 192 ficaram feridas nos protestos que contestavam a reeleição de Maduro. A ONU, por sua vez, estima que mais de 2,4 mil pessoas foram detidas em meio à repressão do governo, enquanto um novo balanço da ONG Foro Penal, divulgado no sábado, registrou 1.416 detenções, das quais 188 seriam mulheres e 127, menores de idade.
Na sexta-feira, nas horas que precederam as manifestações lideradas pela oposição, Corina Machado denunciou em uma publicação no X que Piero Maroún, líder do partido social-democrata Ação Democrática, "estava com sua esposa e cunhada em um restaurante às 22h20 (de sexta-feira) quando foi detido por três pessoas não identificadas". Maroún foi libertado no sábado. Já no sábado, em meio ao protestos, partidos e ONGs de direitos humanos denunciaram a prisão de um político, um padre e um advogado.
O secretário de organização regional da sigla Um Novo Tempo (UNT), Carlos Molina, foi detido após participar de uma concentração na cidade de Valência, em Carabobo. De acordo com o partido de Corina Machado, Vem Venezuela, "forças repressivas o tiraram de uma van”. A ONG Provea denunciou que o padre Elvis Cabarca foi preso pela Guarda Nacional Bolivariana (GNB) enquanto rezava um rosário em uma capela. O sacerdote foi detido em Puerto Ayacucho, no estado do Amazonas, onde também foi registrada a prisão do advogado de direitos humanos Henry Alexander Gómez Fernández.
Uma jovem, identificado como Mabel Meléndez, também teria sido detida no sábado. De acordo com o jornal venezuelano Efecto Cocuyo, a jovem teria sido responsável pela construção de um tanque de madeira que desfilou em meio aos manifestantes concentrados em Carabobo. A obra trazia as palavras "perdão, reconciliação e união". Pessoas próximas à jovem disseram que os policiais esperaram que Meléndez ficasse sozinha antes de detê-la.
O jornal também informou sobre a prisão de um diretor de um meio de comunicação, Gilberto Reina, em sua casa. O comunicador, de acordo com o Efecto Couyo, teria utilizado as redes para convocar cidadãos da capital para participarem das manifestações que contestavam a vitória de Maduro.
— Eles não poderão esconder com sua repressão o que todos sabem (...) Liberdade para todos os sequestrados e presos políticos — bradou Corina Machado em Caracas.
A líder da oposição saiu da clandestinidade para participar da manifestação. Na prática, não há uma ordem de prisão em seu nome, mas tanto ela quanto González Urrutia são alvos de uma investigação pelo Ministério Público.
Em uma promessa e uma advertência ao governo durante as manifestações, a líder da oposição disse que "não vamos deixar as ruas!"
Corina Machado afirma ter cópias de mais de 80% das atas que demonstram, segundo a oposição, a vitória acachapante de González Urrutia e desmentem o resultado oficial de 52% dos votos para Maduro, divulgados pelo CNE. O órgão pró-governo ainda não publicou a apuração detalhada, argumentando que o sistema de votação automatizado foi alvo de um "ataque ciberterrorista". (Com AFP)