Após protestos, Hong Kong suspende proposta sobre extradições para a China
A população de Hong Kong, região especial da China, teme que a lei de extradição possa ser usada contra opositores
AFP
Publicado em 15 de junho de 2019 às 09h17.
Última atualização em 15 de junho de 2019 às 09h18.
O governo pró-Pequim de Hong Kong suspendeu, neste sábado, 15, o projeto de lei sobre extradições para a China, pressionado pelas manifestações da oposição, que decidiu manter a mobilização até a retirada total do texto.
"O governo decidiu suspender o procedimento de emenda legislativa, reativar nossa comunicação com todos os setores da sociedade, trabalhar mais (...) e ouvir as diferentes visões da sociedade", disse Carrie Lam, chefe do Executivo.
A China expressou apoio à decisão. "Nós apoiamos, respeitamos e compreendemos esta decisão", afirmou um porta-voz do ministério das Relações Exteriores, Geng Shuang, em um comunicado.
Pouco depois do anúncio oficial, os líderes dos protestos informaram que vão manter a manifestação prevista para o domingo, 16.
"Temos de dizer ao governo que o povo de Hong Kong persistirá e manterá seus protestos até que o Executivo retire a lei", disse Jimmy Sham, da Frente Civil de Direitos Humanos.
Em 1997, o Reino Unido transferiu a soberania desta colônia para a China, com um status político e econômico especial.
Este território, um centro financeiro internacional, registrou cenas de grande violência na quarta-feira, quando a polícia de choque dispersou com gás lacrimogêneo e balas de borracha dezenas de milhares de manifestantes.
Três dias antes, uma manifestação gigantesca de um milhão de pessoas exigiu a extinção da lei que, segundo seus críticos, deixaria as pessoas à mercê do sistema judicial da China continental, opaco e sob a influência do Partido Comunista.
A nova manifestação aumentou a pressão sob Lam, mesmo dentro de suas fileiras, onde algumas vozes lhe pediram para recuar.
Neste sábado, em coletiva de imprensa, a chefe do governo local anunciou a suspensão do projeto, afirmando que não havia data definida para reintroduzi-lo.
"O conselho vai parar de trabalhar no projeto de lei até que tenhamos completado nossas explicações e ouvido as opiniões", disse. "Não pretendemos estabelecer um prazo para este trabalho", acrescentou.
Segundo Lam, a lei de extradição é necessária para resolver vácuos legais e evitar que Hong Kong se torne um refúgio para criminosos, mas admitiu que o governo subestimou a reação da opinião pública.
"Sinto-me um profundo pesar e lamento que as deficiências do nosso trabalho e outros fatores tenham despertado controvérsias substanciais e conflitos na sociedade após o período relativamente calmo dos últimos dois anos", afirmou.
Violência inédita desde 1997
Os protestos contra esse projeto geraram nos últimos dias a pior onda de violência política desde 1997.
A oposição ao projeto reuniu influentes organizações jurídicas, advogados, empresários, câmaras de comércio, jornalistas e diplomatas estrangeiros.
O setor empresarial temia que a reforma afetasse a imagem internacional e a atratividade do centro financeiro.
Em virtude do princípio "um país, dois sistemas", a ex-colônia britânica goza de liberdades políticas e econômicas desconhecidas no resto da China.
Mas nos últimos anos, o desaparecimento de vários editores e de um milionário chinês crítico de Pequim causou preocupação em Hong Kong. Eles então reapareceram na China, onde enfrentam acusações judiciais.
De acordo com o South China Morning Post, Carrie Lam realizou na sexta-feira à noite uma reunião de emergência com seus conselheiros, enquanto as autoridades chinesas também se reuniram na cidade vizinha de Shenzhen para tentar encontrar uma saída para a crise.
"Não deveríamos tranquilizar os cidadãos? Acho que adiar um pouco (o projeto de lei) não é uma coisa ruim (...)" declarou na sexta Ann Chiang, uma parlamentar pró-Pequim.
Mas outros parlamentares fortemente ligados à China aconselharam Lam a não ceder aos manifestantes, para evitar que "Hong Kong se tornasse ingovernável".
Para Pequim, preocupado com a desaceleração de sua economia em razão das tensões comerciais com os Estados Unidos, as manifestações na antiga colônia não são bem-vindas, a poucos meses do aniversário de 70 anos da fundação da China comunista.
Esta comemoração servirá para ilustrar o poder do onipresente presidente Xi Jinping , cujo "pensamento" entrou no final de 2017 na Constituição chinesa, tornando-se um equivalente ao fundador da dinastia comunista, Mao Tsé Tung.