Pela 1ª vez, cai patrocínio de marcas à Copa do Mundo
Marcas dão menos dinheiro à Fifa após escândalo de corrupção, mas faturamento com Copa da Rússia cresce
Guilherme Dearo
Publicado em 20 de junho de 2018 às 14h38.
Última atualização em 20 de junho de 2018 às 15h29.
São Paulo - Antes da Copa de 2002, na Coreia do Sul e Japão, a Fifa não era uma máquina de ganhar dinheiro. Na Copa de 98, na França, o futebol ainda vivia na "era moderna" do século 20. Dinheiro não era, exatamente, a prioridade. Faltava o mundo contemporâneo.
Quatro anos depois e em um novo século e milênio, a globalização e a internet tornaram o futebol mais profissional, mais globalizado e mais capitalista. Os fãs aumentaram, assim como os telespectadores e os salários astronômicos dos jogadores. Mais coisa estava em jogo (dentro e fora do campo).
Desde 2002, a Fifa viu as suas receitas dispararem, dos direitos de transmissão dos jogos aos patrocínios. Mas, na Copa do Mundo da Rússia , pela primeira vez, o dinheiro vindo dos apoios de marcas caiu. Um cartão amarelo para a entidade.
Levantamento da Sports Value, empresa especializada em marketing esportivo, mostra que, em 2018, a Fifa arrecadou US$ 1,33 bilhão de seus patrocinadores. É 18% menos que na Copa do Mundo do Brasil, em 2014, quando de marcas veio US$ 1,63 bilhão.
Este ano, sete marcas são as "parceiras oficiais" da Fifa e da Copa, ou seja, as marcas da "cota master" dos patrocínios, o lugar de mais destaque: Adidas, Coca-Cola , Wanda Group, Gazprom, Hyundai, Qatar Airways e Visa.
Já entre os "patrocinadores oficiais" (uma cota menor) estão Budweiser, McDonald's, Hisense, Mengniu e Vivo (marca chinesa de tecnologia e celulares, não a empresa brasileira de telefonia).
O motivo da queda? A saída de algumas marcas grandes, que cortaram seus patrocínios antes da Copa, como Johnson & Johnson, Castrol e Continental, além da pisada no freio de outras marcas que mantiveram o apoio.
Na visão de Amir Somoggi, sócio-diretor da Sports Value, o receio dessas marcas se deve aos escândalos de corrupção que envolveram a entidade nos últimos anos e que estourou em 2015, derrubando o presidente Joseph Blatter.
Amir Somoggi também analisa que as marcas estão mais cautelosas, já que é caro patrocinar a Copa e o retorno é difícil e incerto.
"É caro para as marcas. Se elas não conseguem ativar (promover ações durante o evento e dentro dos estádios, montar estandes, promover mídia durante os jogos), só sai caro e não há retorno. Marcas mais populares conseguem ativar bem, como Coca-Cola e Adidas. Outras, não", explica Somoggi.
Apesar da queda, o faturamento com patrocínios ainda sem mantém elevado. Em 2002, por exemplo, era de apenas 512 milhões de dólares. De 2006 a 2014, um crescimento acelerado. De 562 milhões de dólares, passou para 1,63 bilhão de dólares.
Faturamento
Mesmo com a queda nos patrocínios de marca, a receita da Fifa vai crescer na Rússia. O motivo é o aumento do faturamento com direitos de transmissão. É o carro-chefe da entidade quanto o assunto é ganhar dinheiro.
Na Rússia, a Fifa espera arrecadar, no total, US$ 5,2 bilhões. Isso é 8% mais que no Brasil, em 2014, quando faturou US$ 4,8 bilhões. Novamente, uma crescente que disparou de 2002 para cá. No Catar, em 2022, espera-se faturamento de US$ 6,5 bilhões.
Neste ano, a receita com direitos de transmissão de TV deve ser de US$ 2,76 bilhões, 11% mais que na Copa do Brasil (já em 2002, era apenas US$ 991 milhões).
Novas marcas
Se algumas marcas abandonaram o barco da Copa por conta dos escândalos de corrupção, outras aproveitaram o vácuo deixado.
A Wanda Group, empresa chinesa, é uma delas. Pela primeira vez, patrocina a Copa e fechou acordo até 2030, ou seja, para a Copa da Rússia e mais três torneios.
Entre as empresas do grupo está a InFront Media, empresa de marketing esportivo e que retém direitos de mídia da Copa em 26 países asiáticos.
Além disso, o grupo é dono de 20% do clube Atlético de Madrid.
A chegada da Wanda (que já chamou a atenção dos telespectadores brasileiros por sempre mostrar seu logotipo durante os jogos) mostra o interesse crescente do mercado chinês pelo futebol e pela Copa.
A China ainda marca presença com a Vivo e com a Mengniu, empresa de sorvetes e laticínios.
Outra novata é a Gazprom, empresa de energia russa. Claro, uma grande empresa russa precisava estar interessada na Copa de seu país. Entre as ideias ousadas da empresa está a construção de um gasoduto que passaria pela Coreia do Sul e norte.
Futuro do dinheiro
Apesar do crescimento no faturamento, o salto da receita foi de apenas 8% entre a Copa do Brasil e a Copa da Rússia. Crescimento modesto, dado que, em outros anos, houve saltos de 59% (entre 2010 e 2006) e 65% (entre 2006 e 2002).
Esse crescimento fraco, ao lado da queda da receita de patrocínio, deixa a Fifa preocupada. O que fazer, então, para ganhar mais dinheiro (tomando como base que esse é o interesse primordial da entidade)?
Na visão da atual diretoria e do presidente Gianni Infantino, a resposta é óbvia: aumentar o número de seleções. Em 2026, na Copa da América do Norte (Canadá, EUA e México), serão 48 seleções no lugar das atuais 32. A Fifa ainda pressiona para que essa novidade já comece em 2022, no Catar.
Mais seleções significa mais jogos e espectadores ao redor do globo. Mais jogos significa mais cota de patrocínio, mais espaço para mídia e mais dinheiro com direitos de transmissão.
Há um porém. O torneio com 48 times permitirá a presença de seleções muito fracas e jogos francamente ruins. A marca perderá um pouco do valor percebido de exclusividade e prestígio, podendo ver sua marca se desvalorizar e afugentar patrocinadores.
Outra preocupação da Fifa é com as novas tecnologias. No futuro, mais pessoas assistirão os jogos do celular, via streaming e redes sociais. A entidade teme que o faturamento com TV caia. Aumentar o número de seleções significaria chegar a países mais pobres da Ásia e África, onde e TV ainda é a realidade.
CBF
Não foi só a Fifa que sofreu com a saída de patrocinadores. A Confederação Brasileira de Futebol , também envolvida em denúncias de corrupção, perdeu o apoio da Chevrolet, que lhe dava, antes, 54 milhões de reais.
Para a Copa na Rússia, a CBF não conseguiu encontrar substituto à altura. A entidade ainda tem Nike, Vivo, Guaraná Antarctica e Itaú entre seus parceiros. Também há um contrato com a Technogym.
Com a saída da Chevrolet, o faturamento da CBF com patrocínio caiu drasticamente. DeR$ 410,9 milhões em 2016 para R$ 353,3 milhões em 2017, número semelhante a 2015 a 2014.