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Título de inflação tem perda em ano de IPCA em alta. O que acontece?

Investidor precisa entender o funcionamento de produtos ligados à inflação para inseri-los corretamente no portfólio

Prédio do Banco Central em Brasília: aumento dos juros diante da escalada da inflação influencia preços dos ativos | Foto: Adriano Machado/Reuters (Adriano Machado/Reuters)

Juliana Machado*

Publicado em 2 de setembro de 2021 às 11h20.

Última atualização em 3 de dezembro de 2021 às 00h54.

Sempre que um investidor deseja se defender do aumento generalizado de preços na economia e preservar o seu poder de compra, ele precisa buscar um rendimento acima da inflação, o que é bastante simples depois da popularização dos investimentos e do acesso ao mercado financeiro. É bem fácil, por exemplo, adquirir um Tesouro IPCA+, nome bonito das NTN-Bs, títulos de dívida pública federal indexados ao IPCA. O difícil é entender o porquê de esses produtos apresentarem um rendimento negativo justamente quando o IPCA está subindo. Afinal, o que está acontecendo?

Quem entra no site do Tesouro Direto neste momento vai encontrar uma tabela com os títulos disponíveis para compra. No caso do Tesouro IPCA+, os vencimentos possíveis vão desde 2026 a 2055, com um rendimento anual que corresponde ao índice de inflação acrescido de uma taxa. É aqui que mora a pegadinha. Essa taxa prefixada, definida no momento da aquisição do título, só terá validade se o título for carregado até o vencimento. Se o investidor quiser vender antes (ou se ficar olhando o rendimento na tela do celular), ele vai receber o que o mercado estiver pagando – e esse preço é influenciado pela perspectiva dos investidores para a economia e outros indicadores.

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Prazer, você acabou de conhecer o funcionamento da chamada marcação a mercado. É ela que explica o fato de as NTN-Bs estarem todas com rendimento negativo em 2021 enquanto o IPCA avança.

Se os preços de hoje são orientados pelas perspectivas e elas são negativas, você já consegue imaginar o que acontece. Se a percepção é que o risco no geral aumentou, os investidores exigem prêmio maior (ou taxas maiores) para emprestar recursos, seja para o governo, seja para emissores privados. E se a percepção é que o risco aumentou, o preço dos ativos vai para baixo. Taxa sobe, preço cai. Essa é a conta.

Daí que a percepção de risco é que a coisa está pior mesmo, pelo menos aqui no Brasil. O endurecimento da inflação no pós-pandemia, por si só, já dificulta o cenário para as contas públicas do governo, além de estimular os agentes de mercado a esperar mais altas da Selic, a taxa básica de juros, para conter esse movimento. A isso se somam os riscos de piora da crise hídrica, com reflexo sobre inflação e atividade, além de sanhas populistas pré-eleições (leia-se: aumento de gastos).

Com esse cenário, a conta fecha. No vermelho, mas fecha. Os juros futuros, que justamente capturam as perspectivas dos investidores, disparam, o prêmio de risco vai para cima... e os títulos de inflação são marcados a mercado para baixo, valendo menos e pesando, portanto, na carteira de quem os comprou. Vale para quem investe diretamente, via Tesouro Direto, e vale para quem investe via fundos, como é meu caso. E vale também para os menos conhecidos fundos de debêntures incentivadas, porque esse é um instrumento cuja referência é o IPCA.

Isso significa que é hora de se desfazer dessas alternativas de investimento? Quem investe diretamente precisará avaliar caso a caso, mas para quem está via fundos, a resposta é, provavelmente, não. Se a posição estiver muito elevada, faz sentido revisitá-la, mas o longo prazo está aí justamente para quem quiser aproveitar a alta da inflação com o passar do tempo, o chamado carrego – aí sim, a volatilidade da marcação a mercado será diluída no tempo e a parte do título que acompanha a inflação fará seu papel de proteger o poder de compra. Para quem foi inteligente o suficiente para ter fundos de debêntures incentivadas, que pagam mais do que os títulos de inflação, esse movimento será ainda mais satisfatório.

Fora isso, o que não dá é esperar milagre. O mercado até pode estar “errado” no que ele está precificando ou esperando do futuro, mas isso não interessa. O que interessa é o que você, como investidor e investidora, vai fazer com isso.

*Juliana Machado é analista CNPI e integra o time de análise de fundos de investimento do BTG Pactual digital. É jornalista formada pelo Mackenzie, com pós-graduação em economia brasileira pela Fipe-USP. Atuou com análise e seleção de fundos de investimento na Exame e escreveu por quatro anos para o Valor Econômico, nas áreas de governança corporativa e bolsa de valores. Escreve para a Exame Invest quinzenalmente.

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