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Tire os olhos do mercado e foque na sua vida

Saber a distância entre o seu momento atual e as suas ambições é muito mais importante do que conhecer o comportamento do mercado

'As pessoas obcecam-se por entender o mercado, comparar rentabilidades e índices, e pouco se preocupam em conhecer e dar alguma lógica à composição do seu patrimônio' (VichienPetchmai/Thinkstock)

'As pessoas obcecam-se por entender o mercado, comparar rentabilidades e índices, e pouco se preocupam em conhecer e dar alguma lógica à composição do seu patrimônio' (VichienPetchmai/Thinkstock)

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Da Redação

Publicado em 18 de abril de 2022 às 06h45.

Por Sigrid Guimarães*

Você já checou as cotações do dia? Leu as previsões sobre a bolsa, o dólar, os juros? Ótimo, mas o que isso tem a ver com a sua vida? Todo santo dia, milhões de pessoas vasculham informações sobre o mercado para tomar decisões sobre problemas reais, com consequências concretas para o seu futuro. Iludem-se. O mercado não vai dizer quanto podem investir em um negócio próprio, se podem ou não abrir mão de um emprego bem-remunerado que as atormenta ou realizar o sonho do ano sabático. Na verdade, ele nem mesmo pode dizer que investimento faz sentido para você.

Aparentemente, a sofisticação do mercado financeiro, com seus índices, siglas, operações complexas e um tanto de publicidade em torno, leva muita gente a esquecer o básico: o objetivo real dos seus investimentos é gerar recursos para sustentar as suas necessidades e sonhos, hoje e amanhã.

O mercado não tem nada a ver com isso. Ele vê o mundo em termos de operações. Para ele, se a soma das operações é positiva, o resultado é atingido e, se é significativamente maior do que o dos seus concorrentes, eis aí um desempenho excepcional! Já para quem administra um patrimônio, tomar a rentabilidade dos investimentos como medida do seu sucesso é perigoso, uma cortina de fumaça que pode impedir você de enxergar sua situação real.

O caminho do sucesso na administração patrimonial começa com o entendimento de onde você se encontra hoje, aonde precisa chegar e como. Isso nos leva à discussão sobre a composição do patrimônio, uma questão anterior ao mercado e às aplicações financeiras. É fácil entender: se a moradia, os veículos, a casa de praia e a fazenda sem produção comercial significativa representam 90% do patrimônio de alguém, é irreal e injusto esperar que os rendimentos dos 10% que restam para investimentos financeiros possam sustentar os seus gastos.

No entanto as pessoas obcecam-se por entender o mercado, comparar rentabilidades e índices, e pouco se preocupam em conhecer e dar alguma lógica à composição do seu patrimônio. Os investimentos vão, assim, acontecendo sem muita ou sem nenhuma visão do todo. O gerente sugere um seguro, parece vir a calhar, e você faz. Um amigo indica uma sala em um novo conjunto comercial. No fim do ano, entra um dinheiro extra, e alguém – quem foi mesmo? – fala sobre algumas ações.

Um pouco adiante na vida, você é cliente private de dois bancos. Os seus bankers entendem tudo de mercado, têm acesso a relatórios, análises etc. Só não conhecem a sua vida, muito menos os seus investimentos no outro banco. Por isso, nenhum deles, por mais competente que seja, pode dizer se o seu patrimônio está sendo bem administrado ou não; isto é, se a sua diversificação, os seus riscos e a sua rentabilidade global correspondem às suas necessidades.

Quase todo dia, há um caso no escritório para me lembrar da diferença fundamental que conhecer o próprio patrimônio e as suas condições faz na vida das pessoas. Há o casal que vive em pé de guerra porque um cônjuge está convencido de que o outro gasta mais do que pode. Aí, fazemos as contas e descobrimos que, se gastassem o dobro, ainda poderiam manter seu nível de vida até os 120 anos. Um suspira, o outro sorri, e os dois saem de mãos dadas.

Há também o cliente que, um belo dia, surge para agradecer a bolada que acaba de receber em uma ação judicial. O que nós temos com isso? Ele explica: há alguns anos, mantinha investimentos em diversos bancos, recebia os relatórios, tomava as providências que julgava necessárias e seguia sem conhecer seu patrimônio. A proposta, contudo, veio quando, após um processo de planejamento, ele já tinha domínio sobre seu potencial e seus limites. Sabia que a quantia ofertada no acordo não lhe faria grande diferença, mas ganhar a ação, sim. Aguardou tranquilamente o desfecho do processo e, agora, vinha contar que tomara a decisão correta graças ao simples fato de saber o que tinha, do que precisava e o que podia.

O resumo da ópera é que não há decisão razoável sobre o futuro se não sabemos onde estamos no presente. Saber a distância entre o seu momento atual e as suas ambições é muito mais importante do que conhecer o comportamento do mercado. Como eu disse em artigos anteriores, investir é indispensável. Contudo saltar a etapa de organização do patrimônio pode levá-lo a dar com os burros n’água, independentemente da qualidade intrínseca das suas aplicações. Para isso, só há duas alternativas: ou você assume a tarefa pessoalmente ou conta com um gestor patrimonial, como são os family offices.

*Sigrid Guimarães é sócia e CEO da Alocc Gestão Patrimonial e colunista da EXAME Invest.

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