Trump, Kamala e rotação do mercado: o que acompanhar
Descubra como os eventos recentes podem impactar seus investimentos
Colunista
Publicado em 26 de julho de 2024 às 14h21.
Os desdobramentos recentes das eleições dos EUA adicionaram mais tempero a um mercado que já tinha muitos ingredientes no caldo. Nas últimas semanas, especialmente após o primeiro debate entre os então pré-candidatos, vimos as bolsas de valores migrarem para um movimento conhecido como Trump Trade.
Para contexto, de maneira geral, o mercado espera que um segundo governo Trump seja mais protecionista, aumentando tarifas de importação e estimulando as indústrias americanas, inclusive com potencial flexibilização de regulações e diminuição de impostos corporativos. Tudo isso tenderia a pressionar a inflação e potencialmente manter as taxas de juros altas por mais tempo nos EUA.
Por um lado, esse movimento poderia estimular o crescimento de algumas categorias, como small caps e o setor financeiro; por outro, empresas de tecnologia, cujas operações são muito ligadas a players chineses, tendem a ser afetadas negativamente.O posicionamento do candidato a favor de combustíveis fósseis também pode trazer fluxo investidor a companhias ligadas a essas atividades, em detrimento de empresas mais focadas em energias renováveis.
Como antecipação e expectativas dão o nome do jogo na bolsa, tudo isso foi precificado no mercado por um período, especialmente na sequência do atentado que feriu a orelha de Trump em 14 de julho. Mas até quando seguiremos nessa toada?
Há alguns pontos de atenção em relação a uma aposta muito forte no Trump Trade. O primeiro questionamento essencial é o quanto de fato os discursos e futuras atitudes de Trump em um segundo mandato seriam semelhantes aos do primeiro: quanto é possível efetivamente cortar em impostos? Quais medidas serão tomadas em prol do protecionismo? Muitas vezes, o ruído é muito diferente do fato.
O segundo é Kamala Harris. As apostas e pesquisas de intenção de voto mudaram radicalmente desde o último domingo (21), quando Joe Biden desistiu da reeleição e passou a apoiar a candidatura de sua vice, Kamala Harris (que ainda não está oficializada). Há agora mais incerteza sobre quem será o futuro presidente do país.
Por fim, é essencial acompanhar os movimentos macro, como a própria trajetória da inflação, a atividade econômica e a taxa de juros. Paralelamente ao Trump Trade, os mercados vêm se apoiando na forte probabilidade de cortes de juros pelo Fed já em setembro, expectativa que contribuiu para a rotação já mencionada na bolsa. A pergunta agora é o quanto desse movimento já foi precificado e o que podemos esperar para frente.
O índice de preços ao consumidor (CPI) dos Estados Unidos de junho, divulgado na semana passada, é o principal indicador econômico de 2024 até agora. Com números mais benignos que o esperado e reforçando uma tendência em direção à meta de 2% do Federal Reserve (Fed, banco central americano), a divulgação estimulou um movimento forte de rotação no mercado. Será que uma nova fase começou?
Para contextualizar, na virada do ano, o mercado previa início do ciclo de cortes de juros nos EUA já no primeiro trimestre, com queda de 1 ou 1,25 ponto percentual para as Fed Funds em 2024. Em abril, o sentimento era radicalmente diferente, com pouca clareza do espaço para a flexibilização monetária e parte do mercado antecipando até mesmo novas altas. A partir do CPI de junho, a neblina se dissipou, e as projeções agora apontam fortemente para um início de cortes em setembro e entre 2 e 3 cortes ainda este ano.
Com isso, a curva de juros fechou, indicando taxas mais baixas no futuro. O mercado reagiu derrubando as ações que estavam “carregando o rali recente nas costas” (ou seja, as grandes responsáveis pelas altas da bolsa nos últimos 18 meses: big techs) e levando um enorme fluxo para papéis até então “esquecidos”, como small caps e setores muito sensíveis a juros, especialmente o imobiliário. O Russell 2000, principal índice de Small Caps, subiu mais de 6% na semana, e, entre os ETFs setoriais, os que acompanham o mercado imobiliário foram os de melhor desempenho, com altas próximas de 4,5%.
Então, as big techs deixaram de ser as únicas cartas do jogo? Ajustes em fundos de investimentos, se afastando das teses de “taxas altas por mais tempo” rumo a mercados descontados, podem manter a bolsa nesse mesmo caminho por algumas semanas. Na renda fixa, aumenta a atratividade de fixar ganhos nas taxas atuais, com chances de capturar valorização quando os cortes de juros se efetivarem.
Mas nada disso é certo. Por ora, seguimos de olho nos dados. Além da própria flexibilização monetária, a manutenção da atividade econômica em níveis saudáveis, fora de um contexto de recessão, é importante para manter o bom desempenho das ações que ficaram para trás nos últimos 18 meses. Os resultados corporativos, que já começaram a ser divulgados, serão um bom termômetro da saúde financeira no micro.