Mercados

Ouro, ’na maior das bolhas’ para Soros, sobe com mineradoras

Fundo liderado por empresas da mineração nos EUA ajudou na maior alta do metal em 90 anos, fechando a US$ 1.431,25 a onça em 7 de dezembro

O bilionário George Soros: fundo do investidor tem US$ 664,8 milhões em ouro (Miguel Villagran/Getty Images)

O bilionário George Soros: fundo do investidor tem US$ 664,8 milhões em ouro (Miguel Villagran/Getty Images)

DR

Da Redação

Publicado em 22 de junho de 2011 às 12h29.

Londres - Dos US$ 142,8 bilhões que ele administrava como presidente do Sistema de Aposentadoria dos Funcionários Públicos da Califórnia (Calpers) em 2002, James Burton não havia colocado um centavo em ouro. E por que ele faria isso? Há duas décadas, o metal estava em fase de baixa no mercado.

Mas logo que anunciou que se aposentaria do comando do maior fundo de pensão dos Estados Unidos, Burton concordou em ir a Londres para discutir uma proposta de emprego vinda de uma associação de mineradoras. Enquanto caminhava com sapatos alugados por um campo de golfe encharcado em junho de 2002, ele ouviu o que soava como uma ideia de outro mundo: vender ouro como investimento às massas.

Era hora de convencer investidores a comprar um metal precioso que eles vinham ignorando há uma geração, disse a ele o novo presidente do Conselho Mundial de Ouro, Christopher Thompson, naquele dia. O segredo era transformar barras de ouro em instrumentos negociáveis na Bolsa de Nova York. Ele queria que Burton liderasse a iniciativa, em parte por causa de suas ligações com investidores institucionais. Na ocasião, a onça era negociada a cerca de US$ 328 no mercado londrino.

“Eu estava convencido de que havia um mercado para o homem comum”, disse Thompson, 62 anos, que na época também presidia o conselho da Gold Fields Ltd., de Joanesburgo.

US$ 1.431,25 a onça

Thompson ganhou a partida de Burton no décimo sétimo buraco, convencendo-o a aceitar o emprego como presidente do Conselho Mundial do Ouro. O que os dois fizeram em seguida mostra o papel que as mineradoras desempenharam na maior valorização do ouro em pelo menos 90 anos, com a onça atingindo US$ 1.431,25 em 7 de dezembro.

Sob a liderança deles, um fundo estabelecido pelo Conselho Mundial do Ouro, que inclui produtoras como Barrick Gold Corp. E Newmont Mining Corp., recebeu aprovação da comissão de valores mobiliários dos Estados Unidos - a SEC, na sigla em inglês - para oferecer um produto garantido por ouro e negociado em bolsa. O instrumento daria aos investidores acesso ao ouro sem o custo e os obstáculos à entrega física do metal.

O fundo, SPDR Gold Trust (pronuncia-se spider, ou aranha, em inglês), agora detém 1.299 toneladas de ouro avaliadas em cerca de US$ 57 bilhões, mais do que o banco central da Suíça. Entre os investidores, estão a Universidade de Notre Dame, o fundo de aposentadoria dos professores do Estado americano do Texas e um rol de titãs de fundos de hedge e administradores de fundos como John Paulson, da Paulson & Co., Laurence Fink, da BlackRock Inc., e George Soros, do Soros Fund Management LLC.

Maiores fundos

Globalmente, os 10 maiores fundos desse tipo detêm em conjunto 2.113 toneladas de ouro, mais do que as reservas oficiais acumuladas por todos os países exceto Estados Unidos, Alemanha, Itália e França.

A popularidade desses fundos ajudou a embalar ganhos sem precedentes no metal precioso. Algumas pessoas, incluindo analistas do Goldman Sachs Group Inc., dizem que o ouro pode subir ainda mais.

Soros, que ganhou US$ 1 bilhão apostando contra a libra esterlina em 1992, disse que o ouro estava na “maior das bolhas” durante o Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, em janeiro, quando a onça estava em US$ 1.087,10. Hoje, às 13h04, a onça estava em US$ 1.400,55. O fundo dele detinha US$ 664,8 milhões em fundos garantidos por ouro e negociados em bolsa em 30 de setembro.


A ascenção do ouro lembra o movimento que antecedeu os três grandes estouros da última década: a bolha de ações de tecnologia da Nasdaq em 2000, a bolha do mercado imobiliário americano de 2005-2006, e a disparada da cotação do petróleo em 2008, segundo dados compilados pela Bloomberg.

Em entrevista em 14 de dezembro, Jason Toussaint, o diretor-gerente do Conselho Mundial do Ouro para os Estados Unidos e investimento, citou um relatório de setembro do grupo, argumentando que o ritmo e o crescimento do preço do ouro não é comparável as características das bolhas recentes. A alta do metal é consistente com a média de longo prazo quando comparada a outros ativos, como índices de ações e petróleo, segundo o relatório.

Escalada parabólica

A história mostra que, quando o preço de um ativo entra em escalada parabólica como o ouro entrou, está fadado a desabar, de acordo com Mark Williams, executivo em residência e palestrante-mestre do departamento de Finanças e Economia da Universidade de Boston.

Segundo ele, quando isso acontece, quase sempre são os investidores individuais, os de poucos recursos, que abandonam o barco tarde demais.

Até metade do ouro em fundos negociados em bolsa pertence a investidores individuais, segundo a BlackRock, maior administradora de recursos do mundo.

“O cara pequeno vai ser atingido na saída”, disse Williams.

Enquanto trabalhavam na criação do fundo, Burton e sua equipe temiam que uma grande dose de sucesso pudesse causar uma valorização rápida demais do ouro, resultando num estouro como o ocorrido em janeiro de 1980. Na ocasião, a bolha estourou em um dia e a recuperação demorou duas décadas.

‘Estimular a demanda’

No fim das contas, as pessoas que elaboravam o que se tornaria o SPDR Gold decidiram que não era função delas se preocupar com isso.

“Nossa missão fundamental era encontrar todas as maneiras possíveis de estimular a demanda”, diz Burton, que hoje é sócio da California Strategies LLC, consultoria de questões públicas. “Nós também sabíamos que tínhamos lançado algo que não poderíamos controlar.”

O momento foi perfeito. Eles ofereceram um investimento em um ativo de reputação segura foi aberto para potencialmente milhões de novos investidores logo antes da crise financeira de 2007 e 2008, que foi seguida por uma desaceleração da economia global. Até então, o ouro era visto por muitos como um ativo periférico para os ricos com cofres em bancos suíços ou para pessoas pouco convencionais que amealhavam o metal para se proteger no Apocalipse.

“Eles atenderam uma necessidade real e profunda do investidor comum de poder comprar e vender ouro como feito com as ações”, diz Jeremy Siegel, professor de finanças da Escola Wharton, da Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia.

‘Momento crucial’

A criação do fundo foi um “momento crucial”, diz Scott Malpass, diretor de investimentos da Universidade de Notre Dame em South Bend, no Estado americano de Indiana. Ele começou a adquirir ações do SPDR Gold após o colapso do Lehman Brothers Holdings Inc. em 2008, comprando cerca de US$ 111 milhões até 1º de julho de 2009. A universidade tinha cerca de US$ 65,8 milhões no fundo em 30 de setembro, segundo registros junto à SEC.


De número atômico 79 na tabela periódica, o ouro fascina as pessoas há pelo menos 6 mil anos, desde que ourives começaram a transformar o metal em objetos decorativos e jóias na costa do Mar Negro, onde fica hoje a Bulgária. No século 20, os Estados Unidos e a maioria dos países haviam adotado formalmente o chamado padrão-ouro.

O preço da onça foi fixado em US$ 35 até que o presidente americano Richard Nixon abandonou o padrão-ouro em agosto de 1971, abrindo caminho para a disparada do preço. Investidores correram para o ouro naquela década de turbulência financeira e política.

Em 21 de janeiro de 1980, a cotação chegou ao recorde de US$ 850, o que, ajustado pela inflação, valeria hoje US$ 2.266. O ouro desabou no dia seguinte.

Barras de chocolate

Em 18 de novembro de 2004, Burton passeou pela Bolsa de Nova York distribuindo barras de chocolate embrulhadas em papel dourado aos operadores do pregão. Ele e Thompson tocaram o sino de abertura dos negócios, enquanto o Conselho Mundial do Ouro lançava seu fundo negociado em bolsa sob o nome StreetTracks Gold Trust e símbolo GLD. O Bank of New York Co. foi custodiante, enquanto uma unidade do State Street Corp. vendia o fundo.

A BlackRock, sediada em Nova York, administra um dos fundos de ouro que maior crescimento atualmente. A instituição transforma cada onça de ouro em aproximadamente 100 ações, na comparação com 10 ações como faz o fundo negociado em bolsa do Conselho Mundial do Ouro.

Ao fazer essa divisão, o iShares Gold Trust permite que os chamados day traders e estudantes universitários apostem no mercado de ouro por cerca de US$ 13,44 -- menos do que o preço de uma pizza de pepperoni em Chicago.

‘Incerteza’

Um desses day traders é James King, 25 anos, conhecido pelo apelido Pat e diplomado em finanças pela Universidade de Boston. Ele começou a operar no porão da casa dos pais em Lincroft, no Estado de Nova Jersey, após perder o emprego em Wall Street em agosto de 2009.

King tinha investido no fundo SPDR Gold em abril daquele ano. Ele manteve o investimento, e negocia ações do iShares Gold Trust da BlackRock com mais frequência, na esperança de ganhar com as oscilações de preço do metal em função do noticiário.
Ele não sabe como descobrir a hora certa de vender.

“Há tanta incerteza com a situação macroeconômica”, disse ele. Isso se traduz em “uma entrada maciça de dinheiro que estava parado em ouro, mesmo gente comum e gente rica quer ganhar com isso.”

Acompanhe tudo sobre:Bolhas econômicasCommoditiesIndústriaMineraçãoPreços

Mais de Mercados

BTG vê "ventos favoráveis" e volta recomendar compra da Klabin; ações sobem

Ibovespa opera em queda e dólar sobe após cancelamento de reunião sobre pacote fiscal

Donald Trump Jr. aposta na economia conservadora com novo fundo de investimento

Unilever desiste de vender divisão de sorvetes para fundos e aposta em spin-off