Oferta de dívida em leilão do Tesouro é a menor desde maio
O aumento do imposto cobrado de investidores estrangeiros e a expectativa de aumento da taxa de juros foram os motivos que derrubaram as vendas
Da Redação
Publicado em 26 de novembro de 2010 às 06h42.
Brasília e Chicago - Novembro teve o menor volume de vendas de títulos do Tesouro Nacional desde maio. Contribuiram para a queda o aumento do imposto cobrado de investidores estrangeiros e a expectativa de aumento da taxa de juros pelo Banco Central no ano que vem. Os dois fatores estão reduzindo a demanda por papeis da dívida pública.
As vendas de títulos do Tesouro, em novembro, renderam R$ 19,49 bilhões, já considerando os R$ 5,14 bilhões obtidos com o leilão de prefixados realizado ontem. Em outubro, as vendas foram de R$ 38,2 bilhões. Em maio, com o agravamento da crise europeia e a consequente elevação das taxas pagas aos investidores nos mercados emergentes, o Tesouro arrecadou R$ 13,4 bilhões com leilões de dívida doméstica.
O rendimento da Nota do Tesouro Nacional - série F com vencimento em 2021 chegou a 12,77 por cento, maior patamar em seis meses. A taxa saltou 59 pontos-base desde a primeira das duas elevações do Imposto sobre Operações Financeiras nas aplicações estrangeiros em 4 de outubro, movimento que superou a alta de 42 pontos-base dos papeis mexicanos de mesmo vencimento.
“O que eles acabaram fazendo foi elevar o custo de financiamento”, disse Edwin Gutierrez, que administra investimentos de US$ 6 bilhões em títulos de países emergentes, incluindo papeis brasileiros, na Aberdeen Management Plc, em Londres. “O mercado não gostou do rumo dessas medidas no Brasil e expressou seu descontentamento nas vendas de títulos da dívida.”
O Tesouro vendeu 170.337 NTN-F com vencimento em 2021 no leilão de ontem, a uma taxa média de 12,3575 por cento. No leilão anterior, realizado em 11 de novembro, foram vendidas 105.000 NTN-F à taxa de 12,1730 por cento. Em 21 de outubro, o Tesouro rejeitou todas as ofertas por esse título.
Pressão no mercado
O subsecretário do Tesouro para a Dívida Pública, Paulo Valle, afirmou que o cronograma de leilões em novembro foi preparado para reduzir a oferta de títulos prefixados mais longos. O objetivo dessa medida, segundo ele, é evitar “adicionar pressão ao mercado”.
“Isso é temporário”, disse Valle em entrevista por telefone em Brasília. “Esses papeis já estavam bem precificados antes do início do período de volatilidade.”
O País vai ter de voltar a aumentar a oferta de títulos se quiser evitar usar os recursos do colchão de liquidez, disse Vivienne Taberer, que trabalha na gestão de US$ 5 bilhões aplicados em dívida de países emergentes na Investec Asset Management na Cidade do Cabo. A Investec reduziu suas posições em papeis brasileiros depois de o governo aumentar o IOF.
Colchão de liquidez
“O governo não pode dizer que quer se beneficiar dos fluxos financeiros, mas, ao mesmo tempo, limitar a velocidade de entrada desses recursos no país”, disse Taberer em entrevista pelo telefone. “O Brasil pode aguentar alguns meses na atual situação, mas terá de voltar ao mercado cedo ou tarde.”
O Tesouro não está preocupado com a possibilidade de as ofertas menores de títulos reduzirem seu caixa. De acordo com o coordenador-geral de Operações da Dívida Pública, Fernando Garrido, o colchão de liquidez continua suficente para vencimentos de seis meses.
“Não tem sentido relacionar a redução da oferta de prefixados mais longos, em novembro, com diminuição de recursos públicos no futuro”, disse Garrido em entrevista por telefone de Brasília. “O Tesouro não tem problemas de caixa.”
Segundo Garrido, o Tesouro emitiu R$ 44,6 bilhões em outubro e esse desempenho mostrou que “não há a menor dificuldade na rolagem da dívida pública”. Além disso, afirmou que o governo também pode emitir títulos em reais no exterior pagando taxas menores que as verificadas no mercado brasileiro.
Vendas no exterior
Em 20 de outubro, o Brasil vendeu US$ 1 bilhão na reabeertura do Global BRL 2028. A taxa paga aos investidores foi de 8,85% ao ano, abaixo dos 12,35 por cento relativos à NTN-F com vencimento em 2021, o título mais longo vendido no mercado interno.
As negociações com títulos também são prejudicadas porque o mercado aposta que o próximo presidente do BC, Alexandre Tombini, terá de elevar a taxa de juros para frear a inflação já na sua primeira reunião do Comitê de Política Monetária, em janeiro. A presidente eleita Dilma Rousseff indicou Tombini, diretor de Normas do BC desde 2005, para substituir Henrique Meirelles a partir de 2011.
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, adotado pelo sistema de metas de inflação do BC, acumula alta de 5,2 por cento nos doze meses até outubro. Está acima do centro da meta de 4,5 por cento e reflete a maior demanda influenciada por um aumento nominal de 27 por cento na despesa total do governo central para o período janeiro-setembro, se comparado ao mesmo período de 2009.
Alta da Selic
Os diretores do BC mantêm a taxa de juros Selic em 10,75 por cento desde julho, o que representa aumento de 200 pontos- base, ou dois pontos percentuais.
As taxas dos contratos de juros futuros para janeiro de 2012 subiram 31 pontos-base desde 17 de novembro, chegando a 11,89 por cento, o que mostra que a expectativa do mercado é a de o Banco Central elevar a taxa de juros até 12,75 por cento até o fim do ano que vem.
Tombini, de 46 anos, recusou-se a comentar a perspectiva de juros durante entrevista dada em 24 de novembro em Brasília.
“Em algum momento, para o mercado, a inflação vai começar a impactar as taxas de juros”, disse, em entrevista por telefone, Enrique Alvarez, chefe do departamento de renda fixa para a América Latina do IDEAglobal, em Nova York. “Em algum momento, as taxas terão de ser elevadas.”
Superaquecimento
O custo de proteção contra o não pagamento da dívida brasileira, por meio dos credit-default swaps de cinco anos, elevou-se 3 pontos-base nesta semana para 112, de acordo com informações da CMA. Os credit-default swaps pagam o valor de face em troca do equivalente em dinheiro se o emissor, governos ou companhias, descumprirem seus compromissos.
O prêmio de risco exigido pelos investidores para ficarem com títulos brasileiros em dólar, comparado ao dos títulos do tesouro americano, caiu 1 ponto-base nesta semana para 176, segundo o JPMorgan.
O Produto Interno Bruto do Brasil deve aumentar 7,6 por cento em 2010, de acordo com a média das previsões colhidas pela pesquisa semanal Focus, do BC, publicada em 22 de novembro. Em 2009, o PIB brasileiro teve retração de 0,2 por centro.
Enquanto o PIB brasileiro se expande, cresce o receio com o impacto da crise fiscal europeia, principalmente na Irlanda, na ecconomia mundial. A Irlanda deve se unir à Grécia no grupo de países que precisam de pacotes de ajuda financeira. A classificação de risco da dívida irlandesa de longo prazo foi rebaixada dois níveis, para AA-, pela Standard & Poor’s em 23 de novembro.
“Falando francamente, a economia brasileira está superaquecida”, disse Gutierrez, da Aberdeen. “Eles precisam apertar a polítca e não estão fazendo isso. Portanto, o mercado está sinalizando sua desaprovação. O ambiente de aversão ao risco, em todo o mundo, também agrava o problema.”