Gestor vai ganhar bolada por aposta contra a Vale – e doar às vítimas
James Gulbrandsen, da administradora americana NCH Capital, previa queda das ações da empresa por motivos macroeconômicos. Mas tragédia acelerará ganhos
Denyse Godoy
Publicado em 27 de janeiro de 2019 às 07h25.
Última atualização em 27 de janeiro de 2019 às 09h57.
Segunda-feira deve a ser um dia caótico para a mineradora Vale na bolsa, com uma queda brusca nas ações pelo rompimento da barragem de Brumadinho (MG). Como foi feriado na sexta-feira, a B3, a bolsa brasileira, não abriu, adiando a reação negativa para esta segunda. Como sempre acontece nos mercados, alguém vai sair ganhando. James Gulbrandsen, gestor da administradora de investimentos americana NCH Capital no Brasil, é um deles. Mas não está nada animado.
Ele realizou uma operação na bolsa de valores que equivale a uma aposta na queda das ações da Vale. Chamada de “short selling” ou venda a descoberto, consiste em vender, no mercado, um papel que não se possui esperando que seu preço caia para depois recomprar mais barato e ganhar a diferença. A equipe da NCH no Brasil montou essa transação na B3, a bolsa de São Paulo, ao longo das últimas duas semanas por acreditar que as ações da Vale devem engatar uma tendência de queda daqui para a frente com a desaceleração econômica da China, maior compradora de minério de ferro do mundo.
Mas Gulbrandsen afirmou a EXAME que não vai embolsar o lucro da operação, e sim doar o dinheiro às vítimas de Brumadinho. Sua aposta em uma queda da empresa, afinal, tinha fundamentos bem diferentes a uma nova tragédia ambiental e humana.
“Todo ciclo ótimo nos preços das commodities é, por natureza, seguido por um ciclo difícil. Com a desaceleração da China, os nossos softwares estão indicando que se aproxima uma baixa nos preços do minério de ferro”, diz James. “Infelizmente, a nossa posição deu lucro no curtíssimo prazo por um motivo muito triste, que é o rompimento da barragem em Brumadinho. Não podemos ficar com o ganho dessa operação.”
A NCH, por ser obrigada a seguir as normas da Securities and Exchange Commission (SEC), o órgão regulador do mercado financeiro nos Estados Unidos, não divulga o tamanho da sua operação de venda a descoberto com as ações da Vale nem expectativas de ganho. A gestora, que tem um patrimônio de 3,2 bilhões de dólares sob administração no mundo (e 500 milhões de reais no Brasil), tem que repassar para os cotistas do seu fundo que abriga a transação o lucro com a recompra dos papéis, mas doará a receita obtida com a taxa de performance dessa transação.
“Faremos o que pudermos para ajudar as famílias atingidas pelo desastre e esperamos que outros investidores façam o mesmo”, diz o gestor da NCH. “Acreditamos que nossos investimentos devem refletir nossos valores e que devemos fazer o bem. Eu, que vim de família pobre, sei que quem vive do mercado financeiro tem uma situação muito melhor do que a média, e é nosso dever ter solidariedade com a sociedade.”
Desde a tragédia de Mariana, no fim de 2015, a Vale vive um ótimo ciclo na Bolsa. A tonelada do minério de ferro passou de 40,50 dólares para 69,15 dólares. Desde então, acompanhando a elevação dos preços do minério de ferro e uma reestruturação corporativa que elevou o pagamento de dividendos pela companhia, a ação da empresa teve seu preço multiplicado por quase sete vezes, tendo fechado cotado a 56,15 reais na quinta-feira.