Desânimo afasta investidor da bolsa, apesar das pechinchas
De dezembro de 2010 para cá, o Ibovespa perdeu 31,76%, caindo de 69.301 pontos para 47.288 pontos ontem
Da Redação
Publicado em 21 de fevereiro de 2014 às 15h35.
São Paulo - O mercado de ações brasileiro vive uma situação difícil, com o Índice Bovespa em queda de 8% no ano até o dia 20 de fevereiro, depois de perder 15,4% em 2013. Mas a má fase vem de longe. De dezembro de 2010 para cá, o Ibovespa perdeu 31,76%, caindo de 69.301 pontos para 47.288 pontos ontem. Considerando apenas a inflação, de 19,38%, pelo IPCA, o Ibovespa deveria estar em 82.732 pontos, o que elevaria a perda real do investidor em ações do índice a 42,84% em três anos.
A piora dos preços não consegue, porém, atrair compradores, pois as perspectivas também são desanimadoras. “O governo ficou intervencionista, definindo regras de maneira aleatória, determinando os ganhadores e perdedores com incentivos e, com a melhora das economias desenvolvidas, o dinheiro começa a voltar para lá”, afirma Otávio de Magalhães Coutinho Vieira, da Fides Asset Management.
Pessoa física vende
Dados da BM&FBovespa levantados pela corretora UM Investimentos mostram que, nos últimos 12 meses, as pessoas físicas venderam R$ 5,575 bilhões a mais em ações do que compraram, enquanto os institucionais venderam R$ 4,958 bilhões liquidamente. Os compradores foram os estrangeiros, com R$ 4,369 bilhões em compras líquidas em 12 meses.
Percepção de risco
A percepção de risco do Brasil também aumentou, com a piora da inflação, das contas públicas e das contas externas, que tornaram o país mais frágil às turbulências internacionais, em um momento em que os juros voltam a subir nos Estados Unidos. “E isso faz o investidor estrangeiro reavaliar o mercado brasileiro, jogando o Ibovespa para baixo dos 50 mil pontos e elevando nossa taxa de risco para quase o dobro da do México, que estava quase igual há dois anos”, observa. O ambiente de aversão ao risco faz o dólar subir e obriga o Banco Central (BC) a atuar mais no mercado para evitar que a moeda suba muito além dos atuais R$ 2,40 e ameace a inflação.
Piorar antes de melhorar
O desânimo vem ainda da expectativa de que, como este ano tem eleição presidencial, qualquer grande ajuste vai ter de ser feito no ano que vem. “Ou seja, para melhorar, o Brasil vai ter de piorar um pouco mais em 2015, subir os juros, cortar gastos do governo – que vai deixar de ser fomentador de demanda -, o que fará o país crescer menos e o desemprego aumentar”, afirma.
Esse é o cenário otimista. Se o novo governo não fizer nada disso, aí a coisa se complicará, pois o investimento não voltará a crescer o suficiente e os problemas de infraestrutura e capacidade de produção continuarão pressionando a inflação. “Com a falta de investimentos e a má gestão nos últimos anos, que dificultou as concessões públicas e a melhora da infraestrutura, qualquer crescimento maior da economia fará a inflação subir”, afirma Vieira. “O risco é continuar crescendo pouco com inflação alta”, diz.
Estrangeiros e ofertas
Um sinal da falta de perspectivas é a saída dos investidores estrangeiros da bolsa. Principais compradores de ações brasileiras, em dezembro e janeiro, eles retiraram R$ 1,067 bilhão da Bovespa, o que explica a queda do índice. Este mês, depois do indicador chegar aos 46 mil pontos, a procura por pechinchas atraiu os estrangeiros e o saldo voltou as ser positivo em R$ 420 milhões.
A saída dos estrangeiros trouxe efeitos ainda nas ofertas públicas, que este ano estão nos menores níveis em 10 anos. Ao mesmo tempo, o número de empresas recomprando seus papéis disparou, confirmando que as ações estão realmente baratas. “Só quem compra ações hoje são as empresas, que conhecem sua realidade”, diz Vieira.
Descolamento da realidade das empresas
Para ele, há um descolamento entre o mercado, antecipando a piora das condições do país, e a situação real das empresas, que continuam produzindo e lucrando, mesmo que num ritmo menor.
Para o investidor, a situação se torna muito desconfortável, pelo aumento da aversão ao risco no mundo todo, que faz o estrangeiro vender a qualquer preço, enquanto as perspectivas internas seguem ruins, com falta de confiança nas políticas econômicas do governo. “O resultado é que ninguém está comprando, mesmo na baixa, ninguém tem coragem de aumentar ativos de risco neste momento, quando poderiam estar fazendo isso”.
Em busca de pechinchas
A Fides aproveitou a queda dos preços recente para aumentar usa posição em ações, comprando papéis de empresas boas como Natura, Brasil Foods e Copel, que estavam baratas em relação ao seu potencial de ganhos e onde a interferência do governo é menor. “O problema é que algumas ações baratas ficam ainda mais baratas no dia seguinte, o que desanima o comprador”, diz. Ele cita o caso da Alliance, que estava barata cotada a R$ 21 e caiu para R$ 16,00. “Isso para uma empresa de shopping centers, bem posicionada, que crescer 10% ao ano”, afirma.
O barato pode ter desconto
Assim, o investidor acaba sofrendo com a bipolaridade do mercado, com preços baixos que continuam caindo. “A situação é clara, não dá para pegar faca caindo de ponta com a mão, mas o investidor pode começar a aproveitar as oportunidades que surgem, comprando empresas que não tenham endividamento em dólar nem necessidade de acessar o mercado de capitais”, sugere Vieira.
Para ele, há muita coisa barata na bolsa, mas o ambiente econômica terá de melhorar para os preços se recuperarem. “Se o governo der as respostas positivas, o mercado terá um norte e pode se recuperar, mas parece que a vontade segue sendo de repetir as mesmas coisas”, diz.
Investir aos poucos
A sugestão de Vieira para quem quer aproveitar o momento de preços baixos na bolsa é parcelar a compra. “Coloque o dinheiro aos poucos em ações, para aproveitar eventuais quedas e formar um preço médio”, recomenda o gestor. É preciso lembrar também que o custo de oportunidade de deixar a renda fixa é alto, uma vez que os juros voltaram a subir e pagam mais de 12% reais ao ano. “O investidor não pode se dar ao luxo de ter perdas”, afirma. Ele considera também os papéis corrigidos pela inflação, as NTN-Bs, que pagam 6,60%, 6,75% ao ano mais IPCA para vencimentos em 2024 e 2035, são convidativas.
Uma alternativa para o investidor é procurar fundos de ações, com gestão ativa, que estão conseguindo resultados melhores que o Ibovespa. “Há muitos gestores independentes, casas boas, ou mesmo bancos cujos fundos estão se saindo melhor que o índice”, diz. “Usar o achismo e tentar descobrir os papéis mais baratos sozinho não é muito legal neste momento de incerteza”, diz.
Papéis baratos
Vieira observa que Vale, Gerdau, Copel, Duratex, Alliance e Cosan estão baratas, mas não estão subindo. “Se o cenário externo para os emergentes piorar e o gringo vender,elas podem cair mais, por isso a ideia de comprar aos poucos”, diz.
Segundo o gestor, uma pessoa de 30 anos que está acumulando patrimônio para a aposentadoria deve ter uma parcela importante em juros de curto prazo, como CDI, e uma parcela em NTN-B, bem como em dólar e ações. “É uma combinação boa, tomando o cuidado de aplicar gradualmente em ações, pois é difícil acertar o mínimo do mercado”.
São Paulo - O mercado de ações brasileiro vive uma situação difícil, com o Índice Bovespa em queda de 8% no ano até o dia 20 de fevereiro, depois de perder 15,4% em 2013. Mas a má fase vem de longe. De dezembro de 2010 para cá, o Ibovespa perdeu 31,76%, caindo de 69.301 pontos para 47.288 pontos ontem. Considerando apenas a inflação, de 19,38%, pelo IPCA, o Ibovespa deveria estar em 82.732 pontos, o que elevaria a perda real do investidor em ações do índice a 42,84% em três anos.
A piora dos preços não consegue, porém, atrair compradores, pois as perspectivas também são desanimadoras. “O governo ficou intervencionista, definindo regras de maneira aleatória, determinando os ganhadores e perdedores com incentivos e, com a melhora das economias desenvolvidas, o dinheiro começa a voltar para lá”, afirma Otávio de Magalhães Coutinho Vieira, da Fides Asset Management.
Pessoa física vende
Dados da BM&FBovespa levantados pela corretora UM Investimentos mostram que, nos últimos 12 meses, as pessoas físicas venderam R$ 5,575 bilhões a mais em ações do que compraram, enquanto os institucionais venderam R$ 4,958 bilhões liquidamente. Os compradores foram os estrangeiros, com R$ 4,369 bilhões em compras líquidas em 12 meses.
Percepção de risco
A percepção de risco do Brasil também aumentou, com a piora da inflação, das contas públicas e das contas externas, que tornaram o país mais frágil às turbulências internacionais, em um momento em que os juros voltam a subir nos Estados Unidos. “E isso faz o investidor estrangeiro reavaliar o mercado brasileiro, jogando o Ibovespa para baixo dos 50 mil pontos e elevando nossa taxa de risco para quase o dobro da do México, que estava quase igual há dois anos”, observa. O ambiente de aversão ao risco faz o dólar subir e obriga o Banco Central (BC) a atuar mais no mercado para evitar que a moeda suba muito além dos atuais R$ 2,40 e ameace a inflação.
Piorar antes de melhorar
O desânimo vem ainda da expectativa de que, como este ano tem eleição presidencial, qualquer grande ajuste vai ter de ser feito no ano que vem. “Ou seja, para melhorar, o Brasil vai ter de piorar um pouco mais em 2015, subir os juros, cortar gastos do governo – que vai deixar de ser fomentador de demanda -, o que fará o país crescer menos e o desemprego aumentar”, afirma.
Esse é o cenário otimista. Se o novo governo não fizer nada disso, aí a coisa se complicará, pois o investimento não voltará a crescer o suficiente e os problemas de infraestrutura e capacidade de produção continuarão pressionando a inflação. “Com a falta de investimentos e a má gestão nos últimos anos, que dificultou as concessões públicas e a melhora da infraestrutura, qualquer crescimento maior da economia fará a inflação subir”, afirma Vieira. “O risco é continuar crescendo pouco com inflação alta”, diz.
Estrangeiros e ofertas
Um sinal da falta de perspectivas é a saída dos investidores estrangeiros da bolsa. Principais compradores de ações brasileiras, em dezembro e janeiro, eles retiraram R$ 1,067 bilhão da Bovespa, o que explica a queda do índice. Este mês, depois do indicador chegar aos 46 mil pontos, a procura por pechinchas atraiu os estrangeiros e o saldo voltou as ser positivo em R$ 420 milhões.
A saída dos estrangeiros trouxe efeitos ainda nas ofertas públicas, que este ano estão nos menores níveis em 10 anos. Ao mesmo tempo, o número de empresas recomprando seus papéis disparou, confirmando que as ações estão realmente baratas. “Só quem compra ações hoje são as empresas, que conhecem sua realidade”, diz Vieira.
Descolamento da realidade das empresas
Para ele, há um descolamento entre o mercado, antecipando a piora das condições do país, e a situação real das empresas, que continuam produzindo e lucrando, mesmo que num ritmo menor.
Para o investidor, a situação se torna muito desconfortável, pelo aumento da aversão ao risco no mundo todo, que faz o estrangeiro vender a qualquer preço, enquanto as perspectivas internas seguem ruins, com falta de confiança nas políticas econômicas do governo. “O resultado é que ninguém está comprando, mesmo na baixa, ninguém tem coragem de aumentar ativos de risco neste momento, quando poderiam estar fazendo isso”.
Em busca de pechinchas
A Fides aproveitou a queda dos preços recente para aumentar usa posição em ações, comprando papéis de empresas boas como Natura, Brasil Foods e Copel, que estavam baratas em relação ao seu potencial de ganhos e onde a interferência do governo é menor. “O problema é que algumas ações baratas ficam ainda mais baratas no dia seguinte, o que desanima o comprador”, diz. Ele cita o caso da Alliance, que estava barata cotada a R$ 21 e caiu para R$ 16,00. “Isso para uma empresa de shopping centers, bem posicionada, que crescer 10% ao ano”, afirma.
O barato pode ter desconto
Assim, o investidor acaba sofrendo com a bipolaridade do mercado, com preços baixos que continuam caindo. “A situação é clara, não dá para pegar faca caindo de ponta com a mão, mas o investidor pode começar a aproveitar as oportunidades que surgem, comprando empresas que não tenham endividamento em dólar nem necessidade de acessar o mercado de capitais”, sugere Vieira.
Para ele, há muita coisa barata na bolsa, mas o ambiente econômica terá de melhorar para os preços se recuperarem. “Se o governo der as respostas positivas, o mercado terá um norte e pode se recuperar, mas parece que a vontade segue sendo de repetir as mesmas coisas”, diz.
Investir aos poucos
A sugestão de Vieira para quem quer aproveitar o momento de preços baixos na bolsa é parcelar a compra. “Coloque o dinheiro aos poucos em ações, para aproveitar eventuais quedas e formar um preço médio”, recomenda o gestor. É preciso lembrar também que o custo de oportunidade de deixar a renda fixa é alto, uma vez que os juros voltaram a subir e pagam mais de 12% reais ao ano. “O investidor não pode se dar ao luxo de ter perdas”, afirma. Ele considera também os papéis corrigidos pela inflação, as NTN-Bs, que pagam 6,60%, 6,75% ao ano mais IPCA para vencimentos em 2024 e 2035, são convidativas.
Uma alternativa para o investidor é procurar fundos de ações, com gestão ativa, que estão conseguindo resultados melhores que o Ibovespa. “Há muitos gestores independentes, casas boas, ou mesmo bancos cujos fundos estão se saindo melhor que o índice”, diz. “Usar o achismo e tentar descobrir os papéis mais baratos sozinho não é muito legal neste momento de incerteza”, diz.
Papéis baratos
Vieira observa que Vale, Gerdau, Copel, Duratex, Alliance e Cosan estão baratas, mas não estão subindo. “Se o cenário externo para os emergentes piorar e o gringo vender,elas podem cair mais, por isso a ideia de comprar aos poucos”, diz.
Segundo o gestor, uma pessoa de 30 anos que está acumulando patrimônio para a aposentadoria deve ter uma parcela importante em juros de curto prazo, como CDI, e uma parcela em NTN-B, bem como em dólar e ações. “É uma combinação boa, tomando o cuidado de aplicar gradualmente em ações, pois é difícil acertar o mínimo do mercado”.