Depois da alta de 43% em dois meses, o Ibovespa pode subir mais? Entenda
Para especialistas ouvidos pela EXAME, a guinada desde 23 de março é resultado de uma correção de preços. Ainda não dá para falar em tendência de alta
Natália Flach
Publicado em 3 de junho de 2020 às 17h56.
Última atualização em 3 de junho de 2020 às 18h52.
Acertar uma projeção não é fácil, em um ano com tantas reviravoltas como 2020, fica ainda mais difícil. Em janeiro, a expectativa era que o Ibovespa seria negociado por volta dos 140.000 pontos em dezembro. Mas veio a crise econômica, e o otimismo foi por água abaixo. Em 23 de março, o principal índice da bolsa encerrou o pregão em 63.570 pontos, menor nível do ano. O pessimismo também não durou muito. O Ibovespa já subiu 43% desde então e, graças a essa guinada, acumula uma perda anual de 21%. Com tanto vaivém, o que esperar da bolsa daqui para frente?
EXAME consultou especialistas, e as respostas foram uníssonas: tenha cautela. A alta dos últimos meses indica uma correção ante uma queda brusca demais. Não é possível falar ainda em uma reversão de tendências, tanto é que as casas ouvidas pela reportagem mantêm suas projeções ao redor dos 90.000 pontos para dezembro - apesar de o índice ter encerrado o dia negociado acima dos 93.000 pontos hoje.
A explicação é simples: ninguém sabe ao certo o tombo do produto interno bruto porque a resposta depende de como e de quando será a reabertura econômica no Brasil. Se o fim do isolamento for feito de forma desorganizada a ponto de gerar um novo ciclo de quarentena, por exemplo, o impacto sobre o lucro das empresas será significativo, com reflexos para as ações e consequentemente para o Ibovespa.
A guinada dos últimos meses é fruto do otimismo dos investidores - locais, diga-se de passagem - com notícias sobre medicamentos e vacinas contra o novo coronavírus e, mais recentemente, com a reabertura das economias na Europa e nos Estados Unidos. Aliás, é nesse cenário que o S&P 500 reverteu a perda acumulada no ano e hoje é negociado no mesmo patamar de janeiro. Ou seja, está no zero a zero.
Mas no Brasil não é tão simples. Por aqui, o aumento expressivo de casos da covid-19 (ontem São Paulo registrou recorde de mortes pela doença em 24 horas), associado aos embates políticos entre os três poderes e às tensões entre Estados Unidos e China fazem com que os analistas prefiram esperar para ver. "Os mercados estão fortes, mas o cenário ainda está deteriorado", diz Henrique Esteter, analista da Guide. "É bom ter cautela,as perspectivas têm mudado muito rapidamente."
A tese de correção apontada pelos especialistas ganha força quando se analisa outros ativos, como câmbio. Em 13 de maio, a moeda americana encerrou o pregão em 5,90 reais, no nível mais alto do ano. De lá para cá, a divisa perdeu força contra o real e hoje fechou cotada em 5,08 reais, um recuo de 2,384%.
"A combinação de câmbio depreciado com Ibovespa em queda fez com que o indicador tivesse o pior desempenho em dólar entre os emergentes até meados de maio", afirma João Dibo, analista de ações da Rio Bravo. "Estamos vendo uma correção do exagero: a lógica é que a liquidez dos mercados se sobrepôs ao fundamento." É bom lembrar que, apesar de o Ibovespa estar barato para os estrangeiros, eles não vieram. Na verdade, as saídas de capital somam 65 bilhões de reais no ano.
Então, se não é uma alta de 43% nos últimos dois meses que caracteriza uma tendência de alta, o que caracterizaria? Para Esteter, a resposta é a volta do Ibovespa para níveis próximos a 120.000 pontos - só que para isso acontecer é necessário que seja dado o pontapé inicial de uma retomada econômica. "Quando isso ocorrer, o clima político precisa ser propício. Se houver crise entre os poderes, a retomada pode ser postergada e, com isso, a conta ficará ainda mais cara", comenta Rafael Panonko, analista-chefe da Toro Investimentos. Conta, aliás, é o que não falta. A dúvida é se alguma acertará a pontuação do principal índice da bolsa no fim de 2020.