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Remy Sharp
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Como antecipava o mercado, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anunciou na última quarta-feira, 22, a manutenção na taxa básica de juros, a Selic, em 13,75% ao ano.

A decisão era esperada, mas o tom surpreendeu. Quem esperava uma sinalização de cortes de juros, viu justamente o contrário: o tom foi duro, com o Copom focando nos riscos de alta de juros como incertezas fiscais, efeitos sobre a trajetória da dívida e desancoragem da inflação para prazos longos.

“Havia uma percepção por parte do mercado de que o Copom iria olhar as pressões baixistas tanto aqui quanto no exterior para incluir no balanço de riscos e amenizar o tom, talvez já abrindo espaço para cortes nas próximas reuniões. Não foi o que aconteceu”, avalia Luca Mercadante, economista da Rio Bravo, em entrevista à EXAME Invest

Entre as pressões baixistas mencionadas por Mercadante estão a crise bancária nos Estados Unidos após a falência do Silicon Valley Bank (SVB), que inclusive mudou a trajetória dos juros por lá. Internamente, o economista destaca os desafios para o mercado de crédito como um ponto de atenção.

A decisão foi avaliada como positiva pela Rio Bravo, por destacar a independência do Banco Central. A casa projeta cortes na Selic apenas a partir de setembro, com a taxa terminando em 2023 em 13% ao ano. Para 2024, a previsão é de uma Selic a 10% ao ano. Veja abaixo a entrevista completa:

O Copom manteve a Selic em 13,75%, decisão que estava dentro das expectativas. O tom do comunicado, no entanto, foi uma surpresa?

Luca Mercadante: Sim, não houve surpresa em termos de decisão, mas o comunicado surpreendeu. Havia uma percepção por parte do mercado de que o Copom iria olhar as pressões baixistas tanto aqui quanto no exterior para incluir no balanço de riscos e amenizar o tom, talvez já abrindo espaço para cortes nas próximas reuniões. Copom colocou a questão de crédito no Brasil e a crise bancária nos Estados Unidos como elementos de pressão baixista, mas manteve uma comunicação muito dura ainda em relação à inflação.

O que você destacaria como sinais mais duros dentro do comunicado?

Mercadante: Foram sinais bem sutis de comunicação, escolhas de palavras que chamam bastante atenção. A primeira coisa que saltou aos olhos é que esta foi a primeira vez em que o Copom usou a palavra "desancoragem" para caracterizar o aumento das expectativas de inflação – mostrou uma preocupação maior com esse movimento. O segundo ponto é a colocação de um cenário em que mantém a Selic estável durante todo o horizonte. Ao fazer isso, sinaliza que não tem muito espaço para cortar os juros, chegando na meta de 3% apenas em 2024.

Como você avalia a decisão do Copom em manter a taxa em 13,75% ao ano?

Mercadante: É claro que a gente gostaria que, em condições corretas, os juros fossem cortados, mas não parece ser o momento. Nesse momento de ataques do presidente Lula ao Banco Central e de inflação ainda muito alta, é positivo que o Copom mantenha uma postura dura. Isso garante que o BC, de fato, é independente e que realmente vai fazer uma política monetária de acordo com seu mandato – que é atingir a meta de inflação.

Além do presidente e do governo, diversos agentes de mercado esperavam uma possibilidade de corte. Como o mercado deve receber a postura do BC?

Mercadante: É possível que ocorra uma pressão nos indicadores de mercado, especialmente na curva de juros. Na parte mais curta da curva devemos ter uma abertura, com a retirada de expectativa de cortes nas próximas reuniões. É um realinhamento de expectativas com as variáveis atuais. O choque para o mercado é hawkish [indicador de juros mais altos], que pode prejudicar também a bolsa de valores.

O Copom deixou a porta aberta para retomar a trajetória de alta se necessário. Entre os pontos de pressão, estão a alta da inflação, as incertezas sobre o arcabouço fiscal e uma maior desancoragem. A apresentação do arcabouço fiscal pode reverter o cenário de alguma maneira?

Mercadante: Pode sim. A incerteza de hoje ocorre porque não se sabe como o arcabouço será e como ele pode afetar a expectativa sobre a trajetória da dívida. Se for uma regra que melhore as expectativas, pode gerar um ambiente para corte de juros. Acalmar os ânimos é essencial.

Como a crise bancária nos Estados Unidos deflagrada pelo SVB pode impactar os juros americanos? Em que medida isso se reflete no Brasil?

Mercadante: É difícil ver quais os mecanismos de transmissão da questão lá fora. Os mais claros seriam efeitos diretos nos nossos bancos gerando um aperto no mercado de crédito, mas não parece ser o caso. Temos pouca exposição aos bancos estrangeiros, especialmente aos que quebraram. De toda forma, tem um movimento de grande aversão a risco no exterior, então devemos ver uma desaceleração da atividade econômica e da atividade de crédito, com bancos americanos oferecendo menos empréstimos. E não só nos Estados Unidos, mas uma desaceleração global que afeta também o Brasil. Nesse sentido, do ponto de vista teórico, é uma pressão baixista que facilita uma melhor dinâmica da inflação.   

Você mencionou que o crédito no Brasil também é uma pressão baixista. Como fica o mercado interno com mais uma manutenção da Selic?

Mercadante: O mercado de crédito está desacelerando por conta da política monetária e isso é de alguma forma esperado e está contabilizado nas expectativas do Copom. Tivemos eventos locais, como o caso Americanas que foi bem específico, mas tivemos ainda outros casos,  como o da Light, que devem gerar uma desaceleração no mercado de crédito um pouco mais veloz do que já se esperava. Afinal é um aperto monetário muito duro. A preocupação é uma desaceleração do mercado de crédito que afete, também, o ritmo de queda da inflação. Mas é um ponto a que o Banco Central se mostrou atento.

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Para onde vai a Selic em 2023?

A principal dúvida no momento é sobre quando o BC iniciará trajetória de corte na Selic. A expectativa para 2023 é de redução na Selic, sobretudo a partir do segundo semestre, após os ciclos de altas nos juros nos últimos dois anos.

O último boletim Focus nesta semana traz mediana das projeções em 12,75% até o final do ano, isto é, com uma queda de somente 1 ponto percentual em relação ao valor atual. A projeção tem aumentado, com inflação de médio prazo persistente. Em novembro passado, na primeira projeção após as eleições presidenciais, a aposta era de que a Selic terminasse o ano em patamar menor, de 11,25%.

A taxa de juros está em seu maior patamar desde 2016 e, com isso, o juro real fica em torno de 8% (com juro nominal de 13,75%, descontada a inflação de 5,6%). O patamar tem sido criticado pelo governo federal, que pressiona por uma queda mais rápida nos juros.

Frentes como o novo arcabouço fiscal a ser apresentado pelo governo em abril e a redução na projeção de déficit (que o governo atualizou hoje para 1% do PIB, ante os 2,1% do começo do ano) podem lançar as bases para o início de cortes na Selic nas próximas reuniões.

*Com colaboração de Carolina Riveira

 

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