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Cancelamento de captação mostra resistência a títulos junk

Plano go Grupo Farias foi cancelado, mostrando que a disparada dos chamados “junk bonds” tem um limite

O rendimento dos junk bonds de países emergentes caiu para 8,52% (Karen Bleier/AFP)

O rendimento dos junk bonds de países emergentes caiu para 8,52% (Karen Bleier/AFP)

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Da Redação

Publicado em 13 de fevereiro de 2012 às 08h22.

Nova York - O cancelamento do plano do Grupo Farias de fazer uma captação em dólar no exterior na semana passada com taxa de 12,5 por cento demonstra que a disparada mundial dos chamados “junk bonds” tem um limite.

O produtor paulista de etanol e açúcar, com nota seis níveis abaixo do grau de investimento pela Moody’s Investors Service Inc., suspendeu em 9 de fevereiro o que seria sua primeira captação externa em dólar, disse uma pessoa familiarizada com a operação que não pode ser identificada porque não está autorizada a falar publicamente a respeito. Empresas brasileiras com nota abaixo do grau de investimento captaram US$ 2,9 bilhões em dívida no exterior este ano. As emissões mundiais de títulos com nota inferior a Baa3 pela Moody’s e BBB- pela Standard & Poor’s Ratings Services somam US$ 44,3 bilhões, segundo dados compilados pela Bloomberg.

Os sinais cada vez mais claros de que a expansão econômica está se acelerando nos Estados Unidos ressuscitaram a demanda por ativos de alto risco. O rendimento dos junk bonds de países emergentes caiu para 8,52 por cento, em comparação ao nível mais alto em dois anos, de 11,88 por cento em outubro, segundo o JPMorgan Chase & Co. O Grupo Farias não conseguiu convencer investidores de que valeria a pena comprar dívida de um emissor estreante com uma nota de crédito tão baixa, disse Robert Abad, que ajuda a administrar US$ 37 bilhões em ativos de mercados emergentes na Western Asset Management.

“Um emissor de primeira viagem vindo a mercado, e que tem nota B-?”, disse Abad em entrevista por telefone da cidade de Pasadena, no estado americano da Califórnia. “Isso é um teste ainda maior para o mercado. Eu não sei se já chegamos lá.”

O Grupo Farias não retornou um telefonema e um e-mail da Bloomberg News solicitando comentário.

‘Muito suscetível’

A companhia buscava captar US$ 300 milhões em títulos com prazo de sete anos, disse a Moody’s em 31 de janeiro. A dívida do governo brasileiro de prazo similar paga 2,75 por cento. A classificação de risco B3 da empresa está sete níveis inferior à nota de crédito do País.

A posição de caixa do Grupo Farias de R$ 13,7 milhões em março de 2011 cobria cerca de 8,5 por cento de sua dívida de curto prazo, de acordo com a Moody’s.

O setor de açúcar e álcool “é muito suscetível aos preços das commodities e ao clima e, em nossa visão, isso restringe as notas de todo o setor”, disse Marianna Waltz, analista da Moody’s em São Paulo, em entrevista por telefone. “A capacidade da direção de enfrentar os pontos baixos dos ciclos é muito importante nesse negócio. Por isso, realmente queremos ver resultados mais estáveis e menos voláteis de forma mais sustentável.”


Colocação do Minerva

A companhia, que tentava ser a primeira estreante brasileira no exterior com nota junk desde maio, contratou o Banco Bradesco SA, o Deutsche Bank AG e o UBS AG para coordenar a captação, de acordo com uma pessoa a par da oferta. John Gallagher, porta-voz do Deutsche Bank em Nova York, e Christiaan Brakman, porta-voz do UBS em Zurique, não quiseram fazer comentários. A assessoria de imprensa do Bradesco em São Paulo também se recusou a comentar.

O frigorífico Minerva SA, cuja nota de crédito B2 está cinco níveis inferior ao grau de investimento, captou US$ 350 milhões em títulos com cupom de 12,25 por cento em 3 de fevereiro. A taxa foi a mais alta para um papel brasileiro em dólar desde 2003, excluindo uma oferta pós-calote do Independência SA há dois anos. O Minerva, sediado em Barretos, interior de São Paulo, emitiu dívida no exterior duas vezes nos últimos três anos, segundo dados compilados pela Bloomberg.

“Esta ficou baixa demais no espectro de qualidade de crédito para que eu participasse”, disse Raymond Zucaro, que ajuda a administrar e recomendar cerca de US$ 230 milhões em ativos na SW Asset Management LLC, em entrevista por telefone de Miami. “Francamente, a empresa era muito ruim. Era demais.”

Virgolino

Alexandre Menezes, analista de crédito da S&P, disse que o Grupo Farias se beneficia de diversificação geográfica e preços em alta. Os preços do açúcar bruto disparam 86 por cento nos últimos três anos. O Grupo Farias tem classificação B- na escala da S&P, seis níveis abaixo do grau de investimento.

“Em termos de preços, é um cenário muito bom”, disse Menezes em entrevista por telefone de São Paulo.

O Virgolino de Oliveira, outro fabricante de açúcar e etanol, captou US$ 300 milhões em títulos com taxa de 12 por cento em 2 de fevereiro. Diferentemente do Grupo Farias, o Virgolino já havia acessado o mercado internacional em janeiro de 2011.

“As pessoas conheciam o caso do Virgolino”, disse Abad, da Western Asset Management. “O Virgolino já tinha uma emissão e as pessoas fizeram sua pesquisa no passado. Aí chega o Grupo Farias, um novato em captações, e sim, está no mesmo setor, está no Brasil, mas as pessoas não estão familiarizadas com a empresa. Talvez queiram considerar, mas é preciso fazer uma pesquisa antes de entrar em um nome como esse. Qual vai ser a grande barreira para o mercado de altos rendimentos? Serão os novos emissores.”

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