Na pandemia, seis em cada 10 empresas aceleram digitalização
Estudo da IBM mostra que 51% dos executivos brasileiros têm a digitalização como prioridade de investimento nos próximos dois anos
Karina Souza
Publicado em 23 de outubro de 2020 às 06h10.
Última atualização em 23 de outubro de 2020 às 11h59.
Dizer que a pandemia mudou a forma como trabalhamos já não é mais novidade. Em um mundo no qual já se discute o aumento das ações trabalhistas por causa do home office, parece até difícil lembrar tempo em que fazia parte da rotina ir até o escritório todos os dias. Com a necessidade de mudança urgente, executivos de diferentes setores já traçam planos de continuar investindo em tecnologia, mesmo após o fim da pandemia. De acordo com o estudo “Covid-19 e o futuro do negócios”, feito pela IBM com mais de 3.800 executivos C-Level em 20 países e 22 setores, seis em cada vez empresas aceleraram projetos de digitalização e mais da metade (51%) dos executivos vai priorizar projetos desse tipo nos próximos dois anos. O mundo está mais complexo, mas dá para começar com o básico. Veja como, no Manual do Investidor
Na corrida para transformar os planos em realidade, há quem já tenha “largado” na frente, enquanto outros se esforçam para recuperar o tempo perdido. “Historicamente, os setores financeiro e de telecomunicações são pioneiros na adoção de novas tecnologias e estão mais avançados em suas jornadas digitais. O varejo também se destaca, enquanto o industrial é mais tímido no uso de novas tecnologias”, afirma Thais Marca, Managing Partner para IBM Services na América Latina.
Do lado das empresas de telecomunicações, a Vivo registrou aumento de 40% no volume de tráfego das redes. De olho no potencial a ser aproveitado, a companhia anunciou recentemente mais uma etapa para construção da infraestrutura 5G em oito cidades: São Paulo, Salvador, Brasília, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Goiânia Curitiba e Belo Horizonte.
Além disso, a companhia investe em melhorias contínuas para a Aura, inteligência artificial da empresa, que deve atingir 90% de precisão em respostas sobre serviços, consumo de dados, conta, recarga e outras dúvidas.
“Agora é o momento de olhar para frente, imaginando como os brasileiros vão balancear seus hábitos novos e antigos. Vamos usar os aprendizados vividos em uma realidade inédita de isolamento para oferecer novos serviços que digitalizem e aproximem, pois entendemos que as tendências da transformação digital só vão se acelerar”, afirma Márcio Fabbris, vice-presidente de Marketing e Vendas da Vivo.
A necessidade de investir em tecnologia vem até mesmo de quem já pertence ao setor. A 99, empresa de transporte por aplicativo, investiu R$ 90 milhões durante a pandemia para criar soluções acessíveis de mobilidade. Hoje, a empresa é a primeira no país a criar um novo modelo de corridas, totalmente feito pelo WhatsApp.
“Lançamos a nova solução no dia 15, com foco em atender a população das classes C e D. Identificamos que houve aumento de 26% nas corridas em regiões periféricas de março a julho e quisemos trazer ao mercado uma oferta capaz de proporcionar segurança e facilidade a essa população”, explica Lívia Pozzi, diretora de operações da 99.
Atualmente, a solução está disponível em quatro cidades do interior de São Paulo – Araraquara, São Carlos, Bauru e Presidente Prudente – e já traz resultados significativos: esses locais já registraram 95% de recuperação da demanda em relação ao período pré-covid. Nas demais regiões, esse patamar está em 80%.
Outro setor que conseguiu se reinventar durante a pandemia e obter bons resultados é o varejo digital. De acordo com estimativas da Neotrust/Compre&Confie, empresa de inteligência de mercado focada em e-commerce, o setor faturou R$ 33,4 bi só no último trimestre.
De olho no potencial das plataformas digitais, a Marabraz lançou, durante a pandemia, sua plataforma de marketplace. “É um orgulho muito grande para nós. Hoje, temos 15 lojas cadastradas e esperamos ter 25 até o fim do ano. Lançamos a plataforma em julho e esperávamos o retorno do investimento em dez meses, mas, surpreendentemente, já batemos 80% dessa meta. Até hoje, temos 1,2 milhão de compras realizadas nessa nova plataforma”, explica Felipe Cazita, diretor de marketplace da empresa.
A Magazine Luiza conduziu um esforço massivo para substituir o atendimento presencial das lojas físicas por uma comunicação via aplicativos. Para isso, realizou um treinamento com mais de 14 mil vendedores, que passaram a atender pelo WhatsApp.“Criamos um perfil para cada vendedor com um link para as redes sociais, para que eles pudessem fazer a divulgação. O cliente vê os dados do vendedor da loja mais próxima, via geolocalização”, diz Gisele Morila, gerente de produto de transformação digital do Magazine Luiza.
E a saúde?
Para Fábio de Miranda, coordenador dos cursos de computação do Insper, a saúde deve ser um dos setores com crescimento significativo de investimentos nos próximos anos.
“O monitoramento de doenças crônicas e o mapeamento constante de estilo de vida para prevenir problemas no futuro são só a ponta de uma cadeia de benefícios a serem gerados. Cada vez mais veremos o avanço da tecnologia para esse setor, especialmente no pós-pandemia”, explica.
Hoje, é possível encontrar aplicações variadas da digitalização em meio à pandemia. O Hospital São Camilo, por exemplo, investiu em iniciativas num estágio inicial de digitalização, como o sistema Citrix, que permite aos radiologistas acessar prontuários de paciente de forma mais segura.
Ao mesmo tempo, a Fundação Instituto de Pesquisa e Estudo de Diagnóstico por Imagem ( FIDI ) desenvolveu uma nova solução para o sistema público de saúde de São Paulo, que permitiu priorizar atendimentos com suspeita de coronavírus em 47 unidades de saúde da capital. Como resultado, o SUS paulista já economizou 60 mil horas no atendimento de pacientes.
O potencial é tão amplo que até mesmo pequenas empresas estão de olho nesse mercado. Exemplo disso é a rede Terça da Serra, de residenciais sênior, que encontrou na inteligência artificial a melhor aliada para melhorar a saúde de idosos. A rede, que fatura R$ 30 milhões por ano, investiu R$ 250 mil em um robô que interage com os pacientes, promovendo a capacidade de conversarem com a família em tempo real, além de colaborar para monitorar a saúde deles.
“Temos 70 unidades espalhadas pelo Brasil e, com a pandemia, notamos que os idosos ficaram mais reclusos e tristes sem ver a família. Para consertar isso, desenvolvemos o ‘Seu Bartô’, um robô presente em cada uma das unidades e que interage com os idosos, falando sobre assuntos dos quais cada um gosta. Além disso, as famílias podem conversar com seus parentes usando o robô, por meio de um link. Com a mudança, esperamos ter 22 novas franquias abertas ainda este ano, um número bem acima do registrado em 2019”, destaca Joyce Duarte Caseiro, médica e idealizadora da rede.
O que falta para avançar?
As iniciativas representam somente a ponta do que devemos ver nos próximos anos, de acordo com Miranda. Para ele, o que falta para avançar de forma mais consistente não é dinheiro – mas sim o conhecimento sobre o assunto.
“Muitas empresas querem partir direto para o uso de tecnologias frequentemente faladas, como inteligência artificial e machine learning. Porém, isso demanda a organização de processos e a automatização deles para atingir esse patamar. Muitas empresas ainda não sabem como fazer isso e como colher os benefícios que os estágios iniciais da digitalização podem oferecer”, finaliza.