O aquecimento global é o aumento da temperatura terrestre por conta da grande quantidade de gases na atmosfera. Hoje, estima-se que o aumento de temperatura da Terra seja de 1,5ºC (NASA/NOAA/GSFC/Suomi NPP/VIIRS/Norman Kuring/Reprodução)
Talita Abrantes
Publicado em 27 de outubro de 2022 às 06h00.
Última atualização em 18 de novembro de 2022 às 13h25.
O filósofo e semiólogo francês Roland Barthes (1915-1980), em seu livro Mitologias, de 1950, apresentou ao mundo da mídia o debate sobre a presença de mitos na linguagem utilizada pelos meios de comunicação em massa – o que, na época, não incluía a internet. Escreve Barthes, no início do livro:
O ponto de partida dessa reflexão era, o mais das vezes, um sentimento de impaciência frente ao “natural” com que a imprensa, a arte, o senso comum mascaram continuamente uma realidade que, pelo fato de ser aquela em que vivemos não deixa de ser por isso perfeitamente histórica.
As crises, ou melhor, a palavra “crise”, nesse contexto proposto por Barthes, se torna uma espécie de “mito”, ou lenda, que permeia a narrativa sobre determinados eventos e, da representação de um estado das coisas, se torna a própria coisa. Em 1929, a derrocada da bolsa americana figura nas palavras de quem a descreveu -- ou ainda descreve -- o fenômeno como “A Crise de 29”. Em 2008, a quebra do Lehmann Brothers se torna “A Crise de 2008”, e esse “mito” se instala no imaginário popular como o sinal das trombetas do Apocalipse.
Há um óbvio fascínio na sociedade por informações a respeito do fim do mundo, o que se comprova facilmente com o fato de o título deste artigo, “quanto tempo ainda temos para salvar o planeta?”, figurar entre as expressões mais buscadas no Google em temas relacionados ao ESG e à COP27. Estamos, afinal, diante de uma crise climática, e as mudanças climáticas têm, segundo a ciência, o potencial de acabar com as condições tênues de vida terrena.
Mas há, afinal, tempo para salvar o planeta, ou a representação midiática da crise climática acaba por naturalizar um sentimento ancestral de que o céu cairá sobre nossas cabeças?
Um relatório da ONU divulgado nesta quarta-feira, 26, traz um pouco de ciência para essa pergunta. Ele mostra que o mundo está “dobrando a curva” das emissões de carbono para baixo, o que é uma boa notícia. Os compromissos firmados pelos países no Âmbito do Acordo de Paris, as chamadas NDCs (saiba que são e como elas são definidas aqui), garantem que o volume de carbono emitido crescerá apenas 10,6% até 2030, em comparação a níveis de 2010.
É um resultado melhor do obtido no relatório do ano passado, quando esse aumento estava em 13,7%. O problema é que esses compromissos ainda são insuficientes para atingir a principal meta do Acordo, que é a de manter o aquecimento global abaixo de 2 graus Celsius até o final deste século, e com esforço extra para se chegar a um limite ideal de 1,5 grau Celsius. Para isso, as emissões teriam de cair 43% até o final desta década. No atual cenário, o mundo caminha para um aumento de 2,5 graus Celsius, o que não evita os maiores impactos das mudanças climáticas.
Como consequência desse desequilíbrio, todos os ciclos de vida na Terra são impactados. É um efeito cascata, pois o aumento das temperaturas influencia no derretimento das geleiras, aumenta o nível do mar e impacta a biodiversidade.
E esses pequenos desequilíbrios combinados podem aumentar eventos mais extremos em quantidade e intensidade, como por exemplo, secas e frios mais intensos. O que pode acontecer, ninguém sabe ao certo, existem estudos e previsões de acordo com o que já está acontecendo. Mas é inegável, quanto mais a Terra aquecer, maior serão os desequilíbrios. O IPCC (Painel Intergovernamental de Mudança Climática), por exemplo, afirma que a mudança climática se trata da ação humana e já está em curso.
As emissões de CO2 estão intimamente ligadas às mudanças climáticas e, principalmente, ao aquecimento global. São os gases do efeito estufa os responsáveis por permitir a vida humana na Terra por, de maneira simplista, auxiliarem na manutenção da temperatura terrestre.
Gases, como o carbono, são soltos na atmosfera naturalmente. Mas, o corte constante de árvores, os processos industriais e a produção energética não-renovável, têm acelerado a emissão de carbono na atmosfera. Então, pode-se afirmar que as atividades humanas – como a queima de combustíveis fósseis, emissão de gases poluentes e poluição do solo, rios e mares – estão contribuindo para o aquecimento do planeta e permitindo que os gases de efeito estufa sejam emitidos em maior quantidade.
Sem o efeito estufa a terra seria um planeta frio e inabitável. O efeito estufa consiste em permitir que parte dos raios solares fiquem retidos na atmosfera, enquanto outra parte é absorvida. Porém, com a poluição, parte da camada de ozônio do planeta tem se rompido. Com isso, o calor dos raios solares não é retido pela atmosfera, pelo contrário, com a influência do homem, a Terra tem sofrido um aumento de temperatura que resulta no aquecimento global.
O aquecimento global é o aumento da temperatura terrestre por conta da grande quantidade de gases na atmosfera. Hoje, estima-se que o aumento de temperatura da Terra seja de 1,5ºC. Tal informação parece algo simples, porém esse aumento é suficiente para impactar os biomas da terra, causando o derretimento das calotas polares, o aumento do nível dos mares e seu aquecimento e o aumento de queimadas, por exemplo.
Cada efeito desses tem um potencial destrutivo enorme. A subida do nível dos mares, por exemplos, coloca em risco áreas intensamente populosas nos litorais, que podem ficar submersas e provocar êxodos humanos sem precedentes. O aumento da temperatura dos mares também coloca em risco um ecossistema que gera alimento e condições de vida para mais de 3 bilhões de pessoas, sendo responsável por 30 milhões de empregos diretos e gerando uma riqueza de 3 trilhões de dólares ao ano.
Se há uma dose de mitologia, como aponta Barthes, na forma como a mídia trata as crises, no caso das mudanças climáticas, suas consequências são reais e pode levar ao fim de vários mundos, ou ao fim do mundo como se conhece hoje.
Confira aqui um mapa interativo com os grandes emissores de carbono do mundo
Os países que mais emitem carbono são aqueles com mais produções industriais e, geralmente, são os países mais desenvolvidos. De acordo com um estudo feito no final de 2021 pelo Carbon Brief, dentre os países com maior acúmulo de emissões entre 1850 e 2021, estão, nessa ordem:
Para os EUA, China e Rússia, a maior causa do aumento de emissões é a queima de combustíveis fósseis. Enquanto para o Brasil e Indonésia, a maior razão das emissões são o manuseio do solo e desmatamento.
A resposta vai depender do esforço que esses grandes emissores farão para conter as emissões, e do quanto o setor privado está disposto a colaborar para a causa. Essa é uma discussão que acontece há décadas, desde o primeiro grande evento climático global, a Rio 1992, no Rio de Janeiro, que deu origem à primeira Conferência das Partes, ou COP. A primeira aconteceu em Berlim, na Alemanha, em 1995.
Nela, foi definido que os países desenvolvidos deveriam reduzir as emissões de gases estufa dos anos 1990 até os anos 2000. Por isso, as partes combinaram que deveria ser feito um tratado com comprometimento legal para que os objetivos fossem alcançados. Ali, foi estabelecido o Mandato de Berlim.
O Mandato de Berlim foi um consenso entre os países. Ele estabeleceu um processo para lidar com as mudanças do clima, o desafio do aquecimento global e reduzir os seus efeitos. O tratado esperava estabilizar as emissões dos gases de efeito estufa para evitar a interferência humana no sistema ambiental.
Depois da criação do protocolo e para fortalecer o compromisso dos países desenvolvidos, foi criado o grupo Ad Hoc sobre o Mandato de Berlim (AGBM), que esboçou um protocolo que resultou no Protocolo de Kyoto da COP3.
O objetivo da COP, ou Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC), é ser um espaço internacional onde diversos países possam dialogar para estabilizar as a quantidade de gases do efeito estufa na atmosfera. Isso é feito através da análise de comunicações nacionais e do inventário de emissões apresentados pelos países-membros. E por meio desses documentos, é avaliado o progresso e são definidas as próximas medidas e metas.
Nos últimos anos, as COPs resultaram em alguns dos acordos mais importantes da história, como o Acordo de Paris, na COP21, e a criação do mercado global de carbono, na COP26.
Saiba mais sobre o histórico e a evolução das COPs e o que aconteceu na COP26
O balneário de Sharm El-Sheihk, no Egito, será o palco do principal encontro climático deste ano: a 27ª sessão da Conferência das Partes, a COP27.
A chamada COP27 estava originalmente prevista para ocorrer de 8 a 20 de novembro de 2021, mas por conta da pandemia de covid-19, a 26ª edição ocorreu em novembro do ano passado, deixando a 27ª edição para 7 a 18 de novembro de 2022.
Apesar de ainda não ter sido divulgada uma agenda fechada, já é possível esperar a participação de autoridades, como do alto escalão da ONU, entre eles Antonio Guterres, secretário-geral da ONU e Sanda Ojiambo, diretora-executiva do Pacto Global. Presidentes e representantes nacionais dos ministérios de clima, meio ambiente e sustentabilidade também são esperados.