#NãoVolte: não há tempo para ignorar as mudanças climáticas
Para Rodolfo Sirol, presidente do conselho da Rede Brasil do Pacto Global, a economia verde é o único caminho possível para as empresas
Rodrigo Caetano
Publicado em 2 de outubro de 2020 às 09h57.
Última atualização em 15 de outubro de 2020 às 17h15.
A economia verde se apresenta como único caminho possível para o setor empresarial, e para a sociedade, no médio e longo prazo. Como sei que na internet as pessoas costumam ler o primeiro e segundo parágrafos, decidi deixar esta mensagem já na primeira frase deste artigo. Não temos mais tempo. Precisamos reduzir, urgentemente, as emissões de gases de efeito estufa, que encontram-se em níveis alarmantes – mesmo considerando a inusitada diminuição no mundo de 6%, em média, por conta da pandemia.
Nossa geração, como nenhuma outra, tem sentido os efeitos das mudanças do clima. Os últimos cinco anos foram os mais quentes da história das medições, chuvas com volume assustador, com impactos na infraestrutura e nas vidas das pessoas, secas, aumento no nível dos oceanos, incêndios, entre outros eventos extremos, tornam-se cada vez mais comuns. Recentemente, a Rede Brasil do Pacto Global realizou uma discussão de alto nível, com presidentes de empresas e dois especialistas internacionais sobre clima, Johan Rockström e Pavan Sukhdev. Segundo Rockström, a conclusão científica é que o planeta se encontra na era Antropocena, o que significa que a interconectividade entre as mudanças ambientais, do clima, doenças, instabilidades sociais, mudanças financeiras é extremamente elevada, veloz, provocando impactos em grande escala. Nesse sentido, para reduzir os efeitos constantemente registrados da incapacidade de prevenção, nos resta a oportunidade de seguirmos para a adaptação, direcionando nossas decisões para a sustentabilidade. Aqui, considero as decisões que incluem as dimensões, ambiental, social e econômica, juntas, pois acredito que são indivisíveis.
No Brasil, temos atualmente um cenário muito preocupante por conta das queimadas. Essa situação aflige a todos nós e tem impactado fortemente a nossa imagem no exterior, com potencial para prejudicar consideravelmente as empresas brasileiras que atuam em outros países e nossa velocidade de desenvolvimento. Assim, vejo uma mobilização da sociedade muito mais expressiva e o setor empresarial preocupado com a Amazônia, motivado pela sustentabilidade, mas também pela competitividade brasileira. Ações colaborativas que geram alianças empresariais para a preservação desse ecossistema tão relevante para nosso planeta, ou iniciativas estruturantes como a da B3, que lançou um índice ESG, que utiliza critérios ambientais, sociais e de governança na seleção das empresas que compõem a carteira, e que está buscando atuação em mecanismos como “ títulos verdes”, são sinais claros da preocupação com a emergência climática e com abordagens sistêmicas adequadas.
Com a força que o movimento ESG ganha entre os investidores, gestão da sustentabilidade passou a ser, de fato, parte essencial da análise de performance empresarial. Neste ano, a maior gestora de fundos do mundo, a Blackrock, informou que incluiu métricas ESG, transversalmente, em todas as suas avaliações de risco dos fundos que integram sua carteira. Importante sinal tem sido dado por órgãos reguladores brasileiros, a exemplo do Banco Central, que tem reconhecido a questão climática como risco ao sistema e à política monetária. Anunciou, recentemente, incentivo para as finanças verdes e para a concessão de crédito de acordo com premissas sustentáveis. Uma das principais medidas e com efeitos mais imediatos será a obrigatoriedade para as instituições financeiras de adoção do reporte nos moldes do Task Force on Climate Related-Disclosures, o TCFD.
E as empresas precisam responder a estas transformações, para que continuem competitivas e presentes no mercado. Um dos principais pontos é a necessidade de o setor empresarial reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. O Pacto Global lançou no ano passado uma iniciativa nesta linha, pedindo que as empresas estabeleçam um compromisso público de diminuir as emissões com base em critérios científicos em um nível que limite o aumento da temperatura da terra em 1.5 °C. Conseguimos engajar pouco mais de 20 companhias brasileiras e internacionais, com atuação no país. Ainda é pouco, dada a urgência da situação. Precisamos de muito mais. Com esses sinais dos investidores, os eventos extremos e as pressões do mercado consumidor, posso afirmar com toda a certeza que o clima e a sustentabilidade como um todo entraram na agenda da alta liderança. O que há pouco tempo era utopia, hoje começa a virar realidade. Assim, acredito realmente em uma ampliação do engajamento.
De acordo com Rockström, em entrevista à Exame, o que está em risco, neste momento, não é o planeta, que se adapta a novos contextos, mas sim a vida humana. Nesta retomada, precisamos agir conjuntamente para reverter esse cenário. Podemos nos unir em torno das seis ações climáticas propostas por António Guterres, secretário-geral da ONU: 1) investir em empregos verdes; 2) não facilitar para os poluidores; 3) acabar com os subsídios aos combustíveis fósseis; 4) levar em conta os riscos climáticos em todas as decisões; 5) trabalhar juntos; 6) não deixar ninguém para traz. Como diz uma das peças da campanha que acabamos de lançar, #nãovolte a esquecer que um amanhã melhor é uma construção coletiva. Não podemos voltar às práticas que só prejudicavam a sociedade e o planeta. Podemos usar a pandemia como um marco de transformação e caminhar juntos e juntas na direção dos ODS, com foco na ação.
Rodolfo Sirol é Presidente do Conselho da Rede Brasil do Pacto Global e diretor de meio ambiente e sustentabilidade da CPFL Energia.
A campanha #NãoVolte foi idealizada pela Rede Brasil do Pacto Global e conta com o apoio de diversos CEOs de grandes empresas. Saiba mais no site da iniciativa.