Falta de biodiversidade e extração de madeira atrasam mercado voluntário de carbono, diz pesquisa
Estudo da Fundação Eco+ e Social Carbon aponta que empresas priorizam o estoque de carbono do que a restauração florestal
Repórter de ESG
Publicado em 26 de novembro de 2024 às 16h48.
Em meio ao aumento da adesão das empresas ao mercado voluntário de carbono nos últimos anos – e à proximidade de uma sanção presidencial no mercado regulado –, as práticas de restauração florestal utilizadas podem não ser as melhores para o reestabelecimento dos ecossistemas no longo prazo. A baixa diversidade das espécies nativas replantadas atualmente não assegura que a recuperação dos biomas seja consistente e natural.
A informação é de uma pesquisa da Fundação Eco+, instituição ambiental criada pela indústria química BASF para atender às necessidades ambientais de cada região. Também participa a Social Carbon Foundation, ONG inglesa focada em mitigação climática.
O estudo avaliou mais de 200 projetos de florestamento, reflorestamento e revegetação (FRR) de organizações internacionais desde 1999, buscando identificar as tendências utilizadas nos projetos – e que, ao longo dos anos, passaram a integrar as práticas do mercado de carbono voluntário. Para Tiago Egydio, biólogo e gerente da Fundação Eco+, a garantia de escala e crescimento dos projetos pode ter ocorrido às custas da perda da biodiversidade.
“Isso acontece devido a uma incapacidade de compensar diretamente as perdas de habitat florestal em regiões tropicais com ganhos florestais em outras zonas ecológicas”, explica.
Apenas 12% dos projetos de FRR utilizam dez ou mais espécies nativas aos locais, o que, de acordo com os pesquisadores envolvidos, éabaixo da meta de 50% de biodiversidade. Esse valor é considerado o mínimo ideal na variedade das árvores plantadas, por gerar oportunidades de recuperação natural para o ecossistema. Entre as iniciativas que focam apenas em espécies nativas, a taxa de diversificação é de 18%.
De acordo com o levantamento, 44% das iniciativas de FRR implementadas utilizam espécies nativas, enquanto 32% utilizam espécies não nativas.
Bom para reduzir as emissões, ruim para a floresta
Uma das percepções foi a prevalência de espécies consideradas de crescimento rápido, como eucalipto e teca, que atingem a maturidade em cerca de 20 anos. Elas foram mais observadas em projetos que utilizam espécies mistas (nativas e não nativas) e não nativas para sua estratégia de recuperação florestal.
O problema é que essa tendência, observada no mundo todo, mostra que as organizações estão priorizando o estoque de carbono e não a saúde dos biomas ao estruturar seus projetos de replantio e regeneração.
“Se esse for o caso, isso poderia prejudicar muitos dos benefícios que uma abordagem correta traria no futuro”, conta Divaldo Rezende, especialista em mudanças climáticas, energias renováveis e sustentabilidade da Social Carbon.
Os impactos negativos dessa redução na variedade das árvores ainda não podem ser quantificados, segundo Egydio. Os benefícios da biodiversidade de árvores, no entanto, são muitos: “Podemos citar a resiliência que o bioma teria para sobreviver e se adaptar àsmudanças climáticase do solo, além da restauração de uma biodiversidade que voltaria a abrigar espécies nativas e até mesmo em extinção, tanto de animais como de plantas”, conta.
A capacidade das florestas em oferecer recursos naturais, como água potável, também é um fator previsto, além de poder restaurar as características florestais vistas antes da degradação.
Garantir que as empresas e organizações utilizem a biodiversidade na implementação do mercado voluntário de carbono ainda pode contribuir para estabelecer uma descarbonização mais sustentável – e que colabore com a credibilidade das instituições e sua estratégia ambiental.
Extração de madeira
A pesquisa ainda avaliou que as áreas de plantio também são foco da extração de madeira. A prática foi identificada em metade de todos os projetos analisados, sendo observada em quase 90% das iniciativas onde são plantadas espécies não nativas.
Isso causa um efeito direto na capacidade de captura de CO2 das árvores – e, consequentemente, na qualidade do crédito de carbono emitido. Em média, os locais com plantio de espécies não nativas já capturam 31% a menos de gases do que os projetos que utilizam espécies nativas em alguma medida. Egydio explica que, com a extração de madeira, esse número ainda aumenta,uma vez que o carbono armazenado na biomassa é liberado de volta à atmosfera.