Economia

Viagem de Bolsonaro frustra negociadores e traz poucos avanços comerciais

Apesar de acordos na área de inteligência e segurança, país voltou sem parcerias sobre entrada sem condições na OCDE e exportação de carne

Bolsonaro-Trump: líderes passaram o dia em reunião (Kevin Lamarque/Reuters)

Bolsonaro-Trump: líderes passaram o dia em reunião (Kevin Lamarque/Reuters)

R

Reuters

Publicado em 19 de março de 2019 às 21h46.

Washington - Esperada como o grande avanço na relação Brasil-Estados Unidos, a viagem presidencial deixou um gosto de frustração para os negociadores brasileiros, que saíram de Washington com poucos avanços nas áreas comercial e agrícola, de acordo com duas fontes ouvidas pela Reuters.

"Se é para avançar desse jeito, melhor até que fique como está', disse à Reuters uma das fontes envolvida diretamente na tentativa de abrir o mercado americano para novos produtos agrícolas brasileiros.

O Brasil leva para casa o acordo de salvaguardas para uso da base de Alcântara pelos Estados Unidos e outros na área de segurança pública e inteligência, mas não conseguiu nada além de promessas vagas nas áreas que interessavam --uma solução para a questão da exportação de carne in natura e um apoio sem condições à entrada do país na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), por exemplo.

Ao final da visita, ao lado de Bolsonaro, Trump declarou apoio ao pleito brasileiro mas, na declaração conjunta, o apoio está condicionado ao Brasil abdicar de estar na lista de países com tratamento especial e diferenciado da Organização Mundial do Comércio (OMC). Mais cedo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, havia afirmado que o apoio à entrada na OCDE não podia depender de uma troca.

"Quem está preocupado com uma parceria estratégica somos nós, não eles. Eles estão preocupados com o varejo", reclamou um dos negociadores brasileiros.

De acordo com a fonte, a reunião entre Guedes e o representante de comércio norte-americano, Robert Lighthizer, não foi boa e incomodou o ministro brasileiro. O duro discurso feito por Guedes na Câmara de Comércio, na tarde de segunda, foi um reflexo disso.

"Eles pedem tudo, mas não estão dispostos a ceder em nada", reclamou a fonte. "A questão dessa viagem é a aproximação, que funciona em algumas áreas, mas em outras não."

No lado agrícola, o Brasil pretendia ver avançar com mais rapidez a solução da suspensão da venda de carne in natura do Brasil, que se arrasta há dois anos, uma abertura maior para o açúcar brasileiro e para autopeças, entre outros pontos.

"Eles não querem nada que a gente quer. Querem etanol, mas não querem dar açúcar. Nós já entregamos toda a documentação da carne in natura, fizemos tudo que eles pediram. Precisa de um pouco de boa vontade. Mas toda a conversa está muito difícil", disse a primeira fonte.

A declaração conjunta dos presidentes mostra mais benefícios aos norte-americanos do que ao Brasil, quando se fala de comércio. O Brasil cedeu, unilateralmente, e vai implementar a cota de importação de trigo sem tarifas de 750 mil toneladas por ano. Apesar de não ser restrita aos EUA, a medida beneficia diretamente o país, que seria hoje um dos únicos a conseguir exportar o suficiente para preenchê-la.

Em troca, o governo Trump faz promessas vagas de acelerar o envio de uma missão ao Brasil para verificar as condições de produção de carne in natura, mas sem uma data nem uma solução em vista.

O governo norte-americano queria ainda uma outra exigência: a promessa do Brasil de que abriria para estrangeiros a possibilidade de terras no Brasil, contou uma fonte. O projeto, que já existe, está parado no Congresso há alguns anos e não tem a simpatia da ala militar do governo.

China

Uma das maiores cobranças do governo norte-americano foi sobre o tamanho do espaço que a China tem no comércio com o Brasil. A resposta, dada por Guedes no discurso na Câmara de Comércio, foi de que o Brasil irá negociar com quem oferecer o melhor negócio, o que incomodou os norte-americanos.

"Eles têm uma visão diferente em relação à China. Acham que estão entrando demais na América do Sul. Mas cabe a eles ajudar a mudar isso", disse uma das fontes.

Acompanhe tudo sobre:Donald TrumpEstados Unidos (EUA)Jair Bolsonaro

Mais de Economia

Oi recebe proposta de empresa de tecnologia para venda de ativos de TV por assinatura

Em discurso de despedida, Pacheco diz não ter planos de ser ministro de Lula em 2025

Economia com pacote fiscal caiu até R$ 20 bilhões, estima Maílson da Nóbrega

Reforma tributária beneficia indústria, mas exceções e Custo Brasil limitam impacto, avalia o setor