Economia

Por que a reforma tributária preocupa os municípios

Debate na Amcham expõe o temor da perda de receita com o ISS após unificação; Eurico de Santi destaca que a PEC 45 aumenta a competência dos municípios

Eurico de Santi, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (C.CiF) (Mário Miranda/Amcham/Divulgação)

Eurico de Santi, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (C.CiF) (Mário Miranda/Amcham/Divulgação)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 19 de setembro de 2019 às 19h21.

Última atualização em 20 de setembro de 2019 às 16h35.

São Paulo - É difícil discordar de que o sistema tributário brasileiro precisa de uma simplificação, mas as propostas de reforma esbarram em um obstáculo: ninguém quer perder dinheiro. Os municípios que o digam.

Há atualmente no Congresso dois projetos de reforma tributária: a PEC 45, na Câmara dos Deputados e a PEC 101, no Senado. Eles podem vir a se unificar mais à frente, já que ambos se baseiam na criação de um imposto sobre valor agregado, modelo usado em países desenvolvidos.

No caso da PEC 45, esse imposto seria o IBS (imposto sobre bens e serviços), que substituiria cinco tributos já existentes: os federais PIS, Cofins, IPI e os estaduais ICMS e ISS.

Os entes não têm competência para tributar circulação de mercadorias, mas são os principais arrecadadores do Imposto Sobre Serviços (ISS) e não querem perder essa prerrogativa, já que esse é tipo de imposto que mais cresce, por conta do avanço da tributação digital.

O ISS representa 43% da arrecadação dos municípios brasileiros, de acordo com Philippe Duchateau, da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), que participou nesta quinta-feira (19) com outras autoridades de um evento da Câmara Americana de Comércio (Amcham), em São Paulo, sobre a reforma tributária.

Sem o ISS, a previsão é que aumentará o fosso entre as crescentes despesas municipais e suas receitas próprias: "A unificação de ICMS com ISS aumenta ao longo dos anos as receitas dos estados em detrimento das receitas municipais", diz ele.

"Os municípios vão abrir mão de um tributo que é 100% dele, além de ser o que mais cresce. É um duplo prejuízo em potencial", diz Rafael Rodrigues Aguirrezábal, diretor de Assuntos Estratégicos da Associação Nacional dos Auditores-Fiscais de Tributos dos Municípios e Distrito Federal (Anafisco).

Ele afirma que o ISS cresceu quase o dobro do ICMS em 15 anos (arrecadação nacional) e tem potencial de crescer ainda mais.

A ideia da PEC 45 é que os dois primeiros anos da transição sejam um teste, no qual será definida alíquota e a eficiência das novas regras. Nos demais oito anos, haverá uma redução gradativa dos impostos que já existem e um aumento do IBS, até que ele se torne um imposto único.

Aguirrezábal calcula que a perda de arrecadação com a aprovação da reforma seria da ordem de 10,7 bilhões de reais nos 10 primeiros anos de transição. Nos 10 anos seguintes, a perda seria ainda maior, de 55 bilhões de reais.

"O setor de serviços não tem a mesma demanda de débito e credito de outro impostos. As empresas de serviços vão assimilar isso?", questiona.

A eventual inclusão da cobrança sobre serviços na incidência do IBS também agravaria, segundo Duchateau, o quadro de sonegação no país, uma vez que os serviços são imateriais e, portanto, não estocáveis. "O controle de serviços é muito mais difícil em comparação com mercadorias", diz.

Duchateau diz ainda que, com eventuais perdas na receita que seriam causadas pelo novo modelo, os municípios seriam obrigados a aumentar suas alíquotas, gerando um aumento da carga tributária. "Tudo o que ninguém queria", diz.

A FNP é contrária a eventuais mudanças na repartição da arrecadação do ISS por temer queda de arrecadação e perda de autonomia tributária dos municípios. 

Segundo Eurico de Santi, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), porém, a PEC vai aumentar a competência dos municípios, que, além disso, ficariam livres para escolher suas alíquotas por meio de leis ordinárias municipais.

"Os municípios passam a poder também tributar mercadorias além de serviços. Isso é muito relevante, principalmente para os municípios que são turísticos", diz de Santi. A PEC 45 tem como base uma proposta do CCif e de seu coordenador, o economista Bernard Appy.

No chamado novo federalismo cooperativo, proposto pelas PECs, uma Agência Tributária Nacional seria responsável por distribuir os créditos tributários no lugar da União.

Acompanhe tudo sobre:Câmaras municipaiscidades-brasileirasImpostosReforma tributária

Mais de Economia

Boletim Focus: mercado eleva estimativa de inflação para 2024 e 2025

Oi recebe proposta de empresa de tecnologia para venda de ativos de TV por assinatura

Em discurso de despedida, Pacheco diz não ter planos de ser ministro de Lula em 2025

Economia com pacote fiscal caiu até R$ 20 bilhões, estima Maílson da Nóbrega