Economia

O Cade precisa de reforma?

Na opinião do jurista João Grandino Rodas, presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), a resposta é sim. Rodas, o único a votar a favor da compra da Garoto pela Nestlé, falou a EXAME sobre os argumentos da polêmica decisão e também sobre a necessidade de uma reforma no órgão antitruste: EXAME - Como […]

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 11h19.

Na opinião do jurista João Grandino Rodas, presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), a resposta é sim. Rodas, o único a votar a favor da compra da Garoto pela Nestlé, falou a EXAME sobre os argumentos da polêmica decisão e também sobre a necessidade de uma reforma no órgão antitruste:

EXAME - Como o senhor interpreta o veto à compra da Garoto pela Nestlé?
João Grandino Rodas - O veredicto representa uma quebra na linha que vinha sendo tomada em decisões anteriores pelo conselho e não poderá ser ignorado nas próximas. Não digo que isso seja bom ou ruim. Apenas criou-se um novo precedente.

EXAME - O senhor foi o único a votar a favor do negócio. Quais são os seus argumentos?
Rodas - Parti do princípio da livre iniciativa, que está na Constituição. No meu ponto-de-vista, a interferência do Cade tem de estar limitada pela excepcionalidade e deve ser minimalista. Se não, fere os princípios da livre iniciativa e torna-se inconstitucional. No meu voto, considero que seria necessária uma intervenção. Mas não tão drástica, como foi. Uma interferência menor poderia resolver o problema. Respeito a decisão dos conselheiros, mas discordo.

EXAME - O senhor teve a oportunidade de discutir o caso durante o andamento do processo?
Rodas - Muitas vezes. Foi notório o afã das partes - Nestlé e Kraft, a atual líder do mercado - de apresentar argumentos.

EXAME - A discussão com base em modelos econômicos elaborados deve se tornar praxe daqui pra frente?
Rodas - Os modelos são importantes e muito úteis, mas não são soberanos e absolutos. É provável que as discussões se aprofundem daqui para frente e é bom que seja assim. Só sou contra a ditadura dos modelos econômicos. No Cade, temos sobretudo que verificar as questões do direito.

EXAME - O senhor acha que o Cade demora para tomar decisões? Por quê?
Rodas - Na maior parte das decisões, os casos são resolvidos rapidamente - numa média de 82 dias. Os de maior complexidade, que são também os amplamente divulgados, demoram mais. O caso Nestlé-Garoto especificamente demorou em grande parte porque os interessados começaram a trazer a cada semana estudos cada vez mais sofisticados. Não há, na legislação, uma regra que defina o prazo para as partes entregarem todos os documentos. O dono do processo é o relator. Ele é o único que pode impedir que um processo se prolongue indefinidamente.

EXAME - Quais são os problemas do Cade?
Rodas - Se a lei fosse mais moderna, as empresas teriam de fazer uma apresentação prévia do caso ao conselho, como acontece nos Estados Unidos e na Europa. Hoje as empresas podem submeter uma negociação à análise antes ou 15 dias depois de ter o negócio sacramentado. A maioria fica com a segunda opção. Mas não dá para simplesmente mudar a lei, sem rever a estrutura do Cade. Não teríamos estrutura para avaliar as decisões rapidamente, o que é exigido em casos de aprovação prévia. Temos um orçamento bem razoável, só que, por lei, não podemos usá-lo para contratação de pessoal. O conselho é uma autarquia sem plano de carreira. Os técnicos são terceirizados. Há poucos dias, saiu uma medida provisória permitindo que o Cade contrate 30 técnicos.

EXAME - Quais são os outros obstáculos para acelerar as decisões do conselho?
Rodas - Precisaríamos de uma mudança maior, de base estrutural: uma fusão das secretarias. A existência de duas instâncias de aprovação anteriores ao veredicto do Cade - a Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, a SDE, e a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, a Seae - não é ideal. Toda a dualidade resulta em perda de tempo e de meios. Além disso, seria importantíssimo aumentar os parâmetros que indicam se um processo deve ou não ser submetido ao Cade. Hoje, qualquer negociação que envolva empresas com vendas acima de 400 milhões de reais é considerada. No ano passado, analisamos 700 casos. Desses, 90% são absolutamente irrelevantes.

EXAME - O que a Nestlé pode fazer agora para reverter a decisão?
Rodas - A Constituição diz que todas as questões podem ir ao judiciário no Brasil. Nessa salvaguarda genérica, a Nestlé poderia entrar na Justiça comum. Mas não é muito provável, porque seria um processo muito demorado.

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