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Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h23.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem minoria tanto na Câmara quanto no Senado, aparentemente não terá muita dificuldade para aprovar as reformas da Previdência e tributária no Congresso, se depender do que dizem hoje os partidos que assumem a próxima legislatura. Com exceção do PRONA, do deputado Enéas Carneiro, que ainda não se pronunciou sobre a questão, todos os partidos de oposição afirmam que votarão a favor das reformas do Estado.
Com a vitória de Lula nas eleições de outubro, o PT abandonou o discurso de oposição, esvaziou a resistência às reformas e criou no Congresso uma realidade singular: não há quem não apóie as mudanças na Previdência Social e no sistema tributário como soluções urgentes para a retomada do crescimento nacional.
Como se traduz, em números, esse cenário pró-reforma? Na teoria, será uma goleada do governo. Na Câmara, além dos 229 deputados da base governista, o presidente Lula tem o apoio declarado de mais 275 parlamentares do PPB, PFL, PMDB e PSDB. Faltariam apenas os seis votos do PRONA para que, de acordo com as lideranças, o PT conseguisse unanimidade para mexer na Constituição. No Senado, onde o PT tem apenas 31 votos contra 49 da oposição (fora o voto do PPB, ainda indefinido), a virada é total: ninguém se negaria a aprovar as reformas.
A razão do apoio quase irrestrito ao governo é a coerência dos partidos de centro e direita que sempre defenderam as reformas e agora, na oposição, mantêm suas posições. "O PT sabe que ser minoria no Congresso não impede a governabilidade", diz Fernando Limongi, cientista político da Universidade de São Paulo. "Pegaria mal com a opinião pública se eles [os partidos da oposição] deixassem a coerência de lado e mudassem de opinião."
Uma frase do deputado José Carlos Aleluia, futuro líder do PFL na Câmara, revela um pouco do sentimento do partido que estreará na oposição com a obrigação moral de votar com o governo: "Eu diria que teremos o governo votando com o PFL. Se o PT passou a apoiar as reformas, seria incoerente a gente sair só para ser do contra". Assim como o PFL, o PSDB, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, pretende dar início à tal oposição consciente. "O PSDB não vai fazer oposição como o PT fez", diz o deputado Jutahy Magalhães Junior, líder do partido na Câmara. "Faremos uma oposição a favor do país, e isso implica apoiar as reformas da Previdência e tributária." O PMDB, que até tem uma ala simpatizante do governo Lula liderada pelo ex-presidente José Sarney, também se conserva na oposição, mas não nega apoio às reformas, como já adiantou o presidente do partido, deputado Michel Temer.
Resta o PPB, do ex-ministro Delfim Netto e do ex-prefeito de São Paulo Paulo Maluf, outro partido da oposição que promete votar com o governo petista. "Existem reformas que, independentemente de apoiar ou não o governo, o partido quer fazer", afirma o deputado Celso Russomano, do PPB de São Paulo. "Mudar a Previdência Social e o sistema tributário são indispensáveis para o país atualmente." Mais do que votar com o PT, o PPB decide nesta semana se irá apoiar formalmente o governo ou engrossar a oposição. O partido tem 49 deputados e um senador. A ida do PPB para a base governista daria ao presidente Lula a maioria simples na Câmara, com cerca de 280 votos. Com esse cenário, o governo teria espaço para aprovar projetos que não precisam de alteração na Constituição.
O único partido de oposição que poderá votar contra as reformas é o Prona. O deputado Enéas Carneiro, o mais votado no país nas eleições de outubro, mantém segredo sobre a posição do partido em relação à Previdência e às mudanças no sistema tributário. "Só tomaremos uma decisão após a posse", informou Enéas por meio de sua assessoria. "Depois da posse teremos um comportamento de observação e votaremos a favor do país." Faltou definir, no entanto, o que, exatamente, a bancada de seis deputados do Prona avalia como melhor para a sociedade.
Casa de ferreiro, espeto de pau
Nem tudo conspira a favor do governo petista. A mesma coerência de posição que joga a favor do presidente Lula no caso dos partidos de centro e direita, cria um certo desconforto dentro do próprio PT: são os radicais que, não abrindo mão da coerência, continuam defendendo as posições encampadas pelo PT no governo Fernando Henrique Cardoso. Lideranças da facção, como o deputado João Batista de Oliveira Araújo, o Babá, do PT do Pará, ou a senadora Heloisa Helena, de Alagoas, ensaiam discursos que podem não ficar apenas nas palavras. Eles não concordam, por exemplo, com a proposta de reforma da Previdência apresentada pelo ministro Ricardo Berzoini. "Hoje eu votaria contra", diz Babá. "Não podemos aceitar a proposta do ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, sem antes discutir com os trabalhadores."
Para não ver parte de seu partido eventualmente unindo-se ao Prona, de extrema-direita, o presidente Lula terá de criar meios para convencer ou silenciar a bancada radical. "Os radicais do PT são minoria e, no fim, vão acatar a decisão da cúpula do partido. Eles não serão obstáculo para a aprovação da reforma da Previdência", diz o cientista político Fernando Abrúcio, da PUC-SP. Se ninguém do PT marcar gol contra, Lula poderá entrar para a história como o presidente que mais convergiu opiniões e votos no Congresso a favor das reformas. O ex-presidente Fernando Henrique, do PSDB, bem que tentou, mas tinha exatamente uma pedra em seu caminho: o PT. O presidente Lula, em princípio, inicia o governo com estrada livre. "Eles aprenderam rápido a ser governo", diz o deputado Aleluia, do PFL. "Nós propomos uma nova oposição." Resta saber, porém, até quando irá durar a coerência da oposição ou ainda se surgirá, no primeiro desentendimento com o Planalto, alguma voz afirmando que a reforma do PT não é a reforma com que sempre sonhamos.