Para a economista, houve erro de avaliação: os gargalos na infraestrutura e no mercado de trabalho continuam a criar incertezas e perda de competitividade, mas não foram atacados pelo governo (©AFP / vanderlei almeida)
Da Redação
Publicado em 24 de junho de 2013 às 10h49.
Washington - Ao valer-se da "contabilidade criativa", o resultado primário das contas públicas brasileiras foi "esvaziado" e não mais reflete o quanto a política fiscal tem ajudado no crescimento da economia, constatou a consultora Teresa Ter-Minassian, ex-diretora da área Fiscal do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Dizendo-se "desanimada" com os rumos da economia brasileira, Teresa - que na década de 90 chefiou as negociações dos programas de ajuda financeira do FMI ao Brasil - avalia que a falta de noção exata sobre a frouxidão fiscal e de "sinais claros do governo" vai se somar a problemas que já estão no horizonte: a desaceleração da China e a incerteza sobre a expansão da atividade nos Estados Unidos.
"O significado do resultado primário, como indicador do quanto a política fiscal expansionista impulsiona o crescimento, está se perdendo", afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo.
"Na minha opinião, teria sido melhor o governo dizer: estamos em uma situação de queda na demanda agregada; o ritmo de aumento da arrecadação é menor; por isso, vamos diminuir a meta de resultado primário. Essa seria uma abordagem razoável, não a de fazer uso da contabilidade criativa", completou Teresa.
A economista considera que há uma preocupação do governo com a política fiscal. Mas sugere ter havido erros de estratégia.
Diante da redução do ritmo de crescimento da arrecadação, o governo preferiu não mexer na meta de superávit primário, de 3,1% do PIB, e valeu-se de recursos "criativos" para cumpri-la. Ao mesmo tempo, o Tesouro Nacional afrouxou os compromissos fiscais de Estados e municípios e minou sua própria capacidade de cobrá-los.
Em artigo para o blog econômico Vox-Lacea, Teresa esmiuçou cada um dos três grupos de recursos criativos usados pelo Tesouro no cálculo do resultado primário. Primeiro, as estatais Petrobras e Eletrobras foram excluídas da definição de setor público. Os investimentos públicos do Programa de Aceleração do Crescimento e benefícios fiscais foram igualmente excluídos do cálculo.
O segundo grupo diz respeito à antecipação de dividendos de empresas e bancos federais e de vendas de direitos de exploração de petróleo do pré-sal nos cálculos.
Os restos a pagar - despesas não pagas pelo governo no ano fiscal devido - foram limados das contas. No terceiro estão os empréstimos concedidos pelo Tesouro Nacional ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e à Caixa Econômica Federal desde 2009, como meio de impulsionar o consumo e os investimentos. Esses empréstimos não foram considerados no cálculo.
Teresa alerta que os incentivos de ordem fiscal concedidos como meio de expandir a atividade econômica, além de omitidos nas contas, não provocaram a reação esperada. Para ela, houve outro erro de avaliação: os gargalos na infraestrutura e no mercado de trabalho continuam a criar incertezas e perda de competitividade, mas não foram atacados pelo governo.
Manifestações
Por mais legítimas que sejam as manifestações em dezenas de cidades, esse fenômeno não ajuda a economia brasileira no momento em que "os investimentos não estão arrancado", que não há política regulatória "firme e estável" e que o governo continua dando sinais diferentes ao empresariado, adverte a ex-diretora do FMI.
Para Teresa, os protestos agravam o cenário econômico do País. Tudo ainda pode piorar se o governo optar pelo aumento da repressão.
"Os investidores na economia real não têm sinais claros do governo. Hoje há isenções, amanhã não. A taxa de juros básica cai hoje e amanhã sobe. As taxas de retorno das concessões públicas caem e, quando os investimentos não chegam, aumentam. Infelizmente, com os protestos, vai ser pior. Quem vai investir no Brasil?"