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Estudo refaz contas públicas desde 2002 e encontra surpresas

Pesquisadores do Ipea refizeram contas prejudicadas por contabilidade criativa, pedaladas e transferências fora do Orçamento

 (./Thinkstock)

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João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 17 de maio de 2017 às 06h00.

Última atualização em 17 de maio de 2017 às 06h00.

São Paulo - A piora das contas públicas brasileiras foi muito além dos déficits fiscais.

Contabilidade criativa, pedaladas fiscais, transferências fora do Orçamento e outros mecanismos usados nos últimos anos prejudicaram a própria credibilidade dos números apresentados.

Uma tentativa de "remontar" as estatísticas acaba de ser feita por Sérgio Wulff Gobetti e Rodrigo Octávio Orair, pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Em um texto para discussão, eles apresentam novos números mensais "acima da linha" (diferença entre receitas e despesas primárias, sem contar variação do endividamento) para o período de janeiro de 2002 a abril de 2016 nos três níveis de governo.

Além das distorções causadas pelas manobras citadas, o "pente fino" dos pesquisadores também encontrou outras inconsistências, lacunas e mudanças metodológicas que causam “ruídos” nos números.

Primeira conclusão: as despesas cresceram mais rápido do que o PIB em todos os anos do período, com raras exceções em anos de forte ajuste contracionista (1999, 2003 e 2015), quando a despesa teve queda real.

E no geral, o que aumentou mais foram os gastos sociais no plano federal e os gastos com pessoal no plano regional, especialmente nos municípios, que assumem maior responsabilidade por saúde e educação.

O que os autores questionam é a ideia de que a piora do resultado primário a partir de 2010 foi por causa de mais aumento de gastos. Segundo eles, o problema foi um novo modelo de subsídios e desonerações.

"Entre outros motivos, o governo federal acreditou que o setor privado, por meio desses incentivos, seria mais ágil e rápido do que o setor público para realizar investimentos e sustentar o crescimento econômico", diz o texto.

Mas essa nova receita de expansão fiscal tentada nos últimos anos, além de ter custo elevado, acabou se provando incapaz de sustentar o crescimento e desembocou em déficits e crise.

Subsídios

Um dos casos citados pelos pesquisadores de distorções no período foi a capitalização da Petrobras em 2010 com títulos públicos próprios da União e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Só nessa operação, a receita foi inflada em R$ 74,8 bilhões e a despesa em R$ 42,9 bilhões: um saldo de R$ 31,9 bilhões, já que parte dos títulos tiveram como origem o BNDES.

Quando o Tesouro empresta ao BNDES, isso não entra no resultado primário, pois ele ganha como contrapartida um crédito no banco.

Só que o Tesouro paga taxas de mercado enquanto o BNDES paga taxas menores, o que configura um subsídio implícito.

Em 2015, por exemplo, o Tesouro quitou (e contabilizou como despesa daquele ano) R$ 14,6 bilhões em subsídios concedidos nos anos anteriores para o BNDES.

Já os pesquisadores espalharam essa despesa temporalmente, o que muda a coisa de figura: R$ 1,3 bilhão em 2010, R$ 2,2 bilhões em 2011, R$ 2 bilhões, em 2012, R$ 4,1 bilhões em 2013 e R$ 5,9 bilhões em 2014.

Recentemente, o governo anunciou mudanças para aproximar as taxas de juros subsidiado de níveis mais próximos das de mercado.

Isso ajuda por dois motivos: torna a política monetária mais potente, já que ela passa a influenciar mais diretamente a totalidade do crédito, e diminui o nível de subsídio do Tesouro, reduzindo as distorções.

Isso sem falar na restrição fiscal colocada na Constituição: o teto de gastos atrelado à inflação, impedindo que os gastos tenham qualquer crescimento por pelo menos uma década.

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