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Brasil precisa apressar o passo nas reformas, diz conselheiro de Guedes

Langoni credita o baixo crescimento visto nesse início de ano ao desgaste natural provocado pela negociação das reformas

Guedes: o ex-presidente do Banco Central Carlos Langoni é um dos principais conselheiros do ministro (Adriano Machado/Reuters)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 20 de abril de 2019 às 10h51.

Brasília - Um dos principais conselheiros do ministro Paulo Guedes , o ex-presidente do Banco Central Carlos Langoni diz que o País precisa "apressar o passo" e acelerar o cronograma de reformas desenhado pela equipe econômica, que inclui mexer na Previdência e na estrutura tributária para então promover a abertura comercial.

Isso porque o processo de "desaceleração sincronizada" da economia mundial impõe mais desafios ao Brasil. "O ideal é que até o fim do ano possamos entrar na agenda pró-mercado", diz Langoni, que é diretor do Centro de Economia Mundial da FGV.

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Essa agenda envolve o "choque de energia barata" anunciado por Guedes, um dos temas que Langoni aborda em seus encontros frequentes com o ministro.

A ideia é desregulamentar o setor e abrir o mercado de gás de forma a aumentar os investimentos e baixar o custo ao consumidor final. "Há potencial para deslanchar uma onda de investimentos em setores como petroquímica, fertilizantes, siderurgia, mineração, papel e celulose", diz.

Langoni credita o baixo crescimento visto nesse início de ano ao desgaste natural provocado pela negociação das reformas e acredita que se trata de um período de transição. "

No curto prazo, há um paradoxo: ao colocar as fichas da reforma da Previdência, que é essencial, aumenta-se o estresse político e isso acaba contaminando expectativas. O efeito de curtíssimo prazo é fazer com que a atividade econômica sofra". A seguir, os principais trechos da entrevista:

O senhor tem tido audiências frequentes com o ministro Paulo Guedes. Do que tratam?

Tenho ajudado em duas áreas, ainda que de maneira informal. Uma delas é o que chamo de "reforma esquecida", a abertura da economia. Não fazemos um movimento de abertura há 20 anos. Faltava visão clara dos governos sobre a importância da abertura como instrumento para alavancar um processo de crescimento sustentado.

Por que ela é tão importante?

A abertura toca na veia das fontes de crescimento: aumenta a taxa de investimento e a produtividade. O efeito é composto. Só que a América Latina tem longa tradição de superproteção. O que tenho defendido junto ao ministro Paulo Guedes é um processo de abertura tridimensional: não apenas de acesso a mercado, mas também de acesso a investimento e tecnologia. O Brasil vai superar a marca histórica de US$ 100 bilhões de investimento estrangeiro direto assim que essa agenda de reformas começar a ser implementada, e isso tem de fazer parte de uma estratégia de negociação externa.

Será uma agenda bilateral?

Não é nem questão de opção. O Brasil não pode ficar parado esperando que a Organização Mundial do Comércio (OMC) resolva seus problemas. Tenho defendido a tese de que deveríamos finalizar a negociação com a União Europeia, que está madura, abrir logo uma agenda com os Estados Unidos, já que se desenha uma parceria estratégica com eles, e fazer simultaneamente o mesmo com a China.

Quando começam esses movimentos de negociação?

Em economia, a ordem dos fatores altera o produto. É natural que Paulo Guedes tenha começado pela Previdência. Sem um ajuste fiscal sustentado, nada mais funciona. Você não pode pensar em abrir a economia, em atrair investimentos estrangeiros, nem mesmo em privatizar se tem trajetória explosiva da dívida pública em relação ao PIB. Mas não é a única reforma.

Há debate sobre se a reforma da Previdência vai garantir sozinha a retomada do crescimento.

Temos um paradoxo no curto prazo. É preciso começar pela Previdência, mas, sendo a primeira reforma, ela testa a capacidade do governo e o grau de governabilidade junto ao Congresso. Esse movimento gera um estresse político que realmente aumenta a incerteza e acaba contaminando as expectativas. Isso era inevitável. O efeito de curtíssimo prazo é fazer com que a economia sofra. Mas é uma transição. No momento em que a reforma for aprovada, lá para julho e agosto, ainda que com ajustes na potência fiscal final, você entra com a agenda da reforma tributária e com a modernização de marcos regulatórios, que inclui o gás.

O tal "choque de energia barata". Chegamos ao segundo ponto que o sr. trata com Guedes.

Exato. Essa é uma ideia que levei. Temos aqui um exemplo clássico de como no Brasil os marcos regulatórios geram distorções absurdas que acabam penalizando o que é fundamental para o País ser competitivo, como o custo da energia. Essa produção de petróleo enorme que vamos ter nos próximos anos vem necessariamente acompanhada de gás. Só uma pequena parcela desse gás pode ser reinjetado (no campo, para auxiliar a própria extração de petróleo). Com oferta tão grande, como explicar que o Brasil tem hoje um custo do gás para o setor industrial muito maior que o de outros países? É um caso típico de disfunção regulatória. De um lado, a Petrobras exercia e ainda exerce monopólio feroz na produção, no transporte e na distribuição, pois participa como acionista minoritária de distribuidoras. Ela produz, transporta e vende para ela mesma - ou vende para terceiros a um preço absurdo.

Já há iniciativas do governo em curso. Em quanto tempo dá mudar esse cenário?

As ideias todas já estão muito bem definidas e sendo encaminhadas pelos ministérios da Economia e de Minas e Energia e pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). São todas decisões infra legislativas e ajustes regulatórios e isso pode ser feito até maio, início de junho no mais tardar. Por um lado, teremos a autoliberalização da Petrobras, em que ela vai reduzir participação no mercado. Na outra ponta, criaremos a figura do consumidor livre de gás natural, a exemplo do que existe no setor elétrico. Vai ser um choque de competitividade, que poderá deslanchar onda de investimentos de grande porte em setores-chave como petroquímica, fertilizantes, vidro, siderurgia, mineração, papel e celulose. Isso sem subsídio ou incentivo.

Setores da Petrobras resistem ao plano, conforme mostrou troca de mensagens flagrada pelo jornal O Estado de S. Paulo entre Guedes e integrantes da equipe econômica. O cronograma pode atrasar?

É natural que uma mudança tão radical no sentido de liberalizar o mercado, que até agora esteve controlado 100% pela Petrobras, encontre resistências. Mas estou convencido de que o benefício para o Brasil é tão evidente que isso será superado. Tenho absoluta confiança na competência e visão liberal do presidente Roberto Castello Branco. O argumento que surge agora, de primeiro criar uma gestora dos gasodutos e só depois fazer a abertura desse mercado, pode atrasar em até cinco anos o processo. Na minha opinião, não faz sentido. Primeiro, você tem de criar o mercado. Vamos vencer essas barreiras. Trata-se de uma visão distorcida e isso será esclarecido (dentro da Petrobras).

Quais os riscos para essa agenda de reformas que Guedes propõe?

Vejo mais o risco de timing, do processo de ajuste fiscal ser mais demorado do que gostaríamos. O FMI colocou muito bem: a economia mundial entrou num ciclo de desaceleração sincronizada. Não é recessão, mas é desaceleração gradual e bastante generalizada, que atinge tanto economias avançadas como emergentes. O Brasil precisa apressar o passo. Quanto mais cedo entrarmos num ciclo virtuoso, tudo fica mais fácil, inclusive o ajuste fiscal. A agenda que está posta é tão pró-Brasil que não tenho dúvidas de que será implementada. A dúvida é em que ritmo. E isso me deixa preocupado. Não pode ser gradual demais. O ideal é que até o fim do ano a gente entre na agenda pró-crescimento.

Será possível zerar o deficit fiscal já agora, como prometeu Guedes?

Zerar o déficit fiscal de forma sustentada vai demorar algum tempo. Isso pode acontecer em dois anos. E, a partir daí, gerarmos superávit. Estou projetando crescimento acima de 3% a partir de 2020. O PIB potencial praticamente pode duplicar se esse conjunto de reformas for implementado. Entraremos em outro padrão de crescimento. Com esses ajustes, entrando para a OCDE, o Brasil recupera o grau de investimento até o fim desse governo. Sou otimista porque o diagnóstico está correto. Vamos abrir um espaço para o setor privado que há muitos anos ele não tem.

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