Ato contra fundos abutres: governo não sabe se credores aceitarão cobrar em Buenos Aires (Enrique Marcarian/Reuters)
Da Redação
Publicado em 23 de setembro de 2014 às 19h17.
A Argentina está sendo pressionada novamente, a uma semana do vencimento de um título da sua dívida reestruturada.
Por ordem judicial, o governo não pode fazer os pagamentos em Nova York e ainda não sabe se os credores aceitarão transferir a sede das cobranças para Buenos Aires.
No dia 30 de setembro, a Argentina terá que pagar cerca de 200 milhões de dólares a credores da dívida reestruturada em 2005 e 2010. Esses credores aceitaram reembolsos de até 70% do valor nominal devido pelo governo argentino.
"Como acontece em todos os casos destes pagamentos de títulos, há um mês de carência, mas, considerada a crise econômica no país, a situação pode se tornar mais grave, caso não se chegue a um acordo", explicou à AFP Matías Carugati, economista-chefe da consultoria Management & Fit.
O governo não sabe se os credores aceitarão cobrar em Buenos Aires, alternativa possibilitada por uma lei aprovada recentemente a fim de mudar a sede de pagamento da dívida.
O pagamento está completamente bloqueado desde que os fundos especulativos que litigaram na justiça americana para obter o pagamento de 100% do valor dos títulos conseguiram uma decisão favorável ao recebimento de 1,33 bilhão de dólares pela dívida em default.
Com a rejeição argentina em cumprir a sentença, o juiz Thomas Griesa bloqueou o dinheiro enviado pelo Executivo argentino a Nova York, destinado aos credores da dívida reestruturada.
Se a Argentina pagar 1,33 bilhão de dólares determinados por Griesa aos fundos especulativos, por contrato teria que igualar a oferta aos demais credores.
Financeiramente, esta decisão seria impossível de ser cumprida pela Argentina, abalada por uma forte escassez de divisas.
A cláusula Rufo, que determina o mesmo tratamento a todos os credores, vence em janeiro de 2015.
"O tempo corre e a regulamentação da lei que muda a sede de pagamento pode não chegar a tempo", disse à AFP o economista Guido Sandleris, professor da Escola de Negócios da Universidade Torcuato Di Tella.
O economista Matías Carugati lembrou que "até agora a resposta dos credores foi nula". "É uma lei que tem o objetivo de mostrar boa vontade e capacidade de pagamento", disse o economista da Management & Fit.
"A presidente Cristina Kirchner quer seguir com este discurso de que a Argentina paga e o juiz Griesa não deixa o país pagar, mas a regulamentação (da lei) é muito difícil".
O juiz Griesa determinou que a Argentina não pode realizar pagamentos aos credores da dívida reestruturada caso não pague simultaneamente aos fundos litigantes.
A Argentina conseguiu na ONU uma recomendação para redigir um documento legal para futuras reestruturações, algo que significa um apoio mas que não tem consequências até o momento.
Uma economia asfixiada
O presidente da Comissão de Orçamento e Fazenda da Câmara dos Deputados, Roberto Feletti, afirmou nesta terça-feira que "se a decisão de Griesa for revertida, o crescimento da economia será superior a 2,8%".
Em meio ao problema da dívida, a Argentina sofre uma forte tensão cambial em um contexto recessivo.
Sandleris disse que "houve uma forte desvalorização do peso no mercado paralelo e um freio na economia". A brecha entre o dólar oficial (8,45 pesos) e o paralelo (15,30) superou os 80%.
Muitos analistas concordam que a Argentina vai precisar de um financiamento externo no ano que vem para superar a asfixia atual.
"A moratória teve impacto negativo. O caminho de normalização do acesso ao crédito internacional se viu interrompido", considerou Sandleris.
Carugati assegura que para "enfrentar a recessão, o financiamento externo não chegará antes que o país saia do default seletivo".
A temida aceleração da dívida
Os bancos envolvidos neste conflito legal, o BoNy e o Citibank foram advertidos por Buenos Aires para liberar os depósitos.
O juiz Griesa convocou uma nova audiência para sexta-feira após um pedido de medida cautelar apresentado na segunda-feira pelo Citibank para pagar no dia 30 de setembro os credores na Argentina.
Existe também um risco maior, o de um aumento da dívida, caso os credores exijam o pagamento imediato de toda a dívida, em função dos contratos assinados.
"Acho que os credores de títulos têm pouco a ganhar com essa estratégia", disse Sandleris.
Carugati, no entanto, acredita que esse risco não é alto, "mas, sim, mais (alto) do que antes". "Se isso acontecer será um problema para a Argentina, porque o montante da moratória será ainda maior".