Economia

Analistas temem aumento da corrupção com boom econômico

"Somos um país rico, mas com costumes de países pobres", resume Gil Castello Branco, presidente da Contas Abertas

Manifestação em Brasília contra a corrupção: dificuldades de combater o problema (Valter Campanato)

Manifestação em Brasília contra a corrupção: dificuldades de combater o problema (Valter Campanato)

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Da Redação

Publicado em 3 de fevereiro de 2012 às 14h26.

Brasília - A queda em série de ministros por supostas irregularidades é apenas a ponta do iceberg da corrupção que corrói o Brasil de forma endêmica, atravessa a política e representa um de seus maiores desafios para se consolidar como potência econômica mundial, segundo especialistas.

"Somos um país rico, mas com costumes de países pobres", declarou à AFP Gil Castello Branco, presidente da Contas Abertas, uma ONG especializada na luta contra a corrupção.

Das estatísticas ao cinema, passando pelas denúncias diárias da imprensa, a corrupção é retratada no Brasil como um monstro de sete cabeças, sendo apenas a mais visível a relacionada com a política (o suborno, o pagamento de favores e o tráfico de influência), mas não menos grave que a ineficiência estatal e a corrupção policial.

Incorporada à história brasileira, a corrupção é uma das maiores preocupações das classes alta e média em tempos de bonança, e potencial ameaça para os milionários investimentos realizados pelo Brasil para acolher o Mundial de Futebol de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, segundo analistas.

"Acredito que, na mesma proporção em que aumenta a quantidade de grandes obras, o risco de corrupção também sobe. O corrupto vai onde o capital está", disse Castello Branco.

A sexta economia mundial é a pior classificada depois da China entre os países mais ricos em relação à corrupção, segundo o índice de Transparência Internacional.

Desde a criação, em 1995, deste indicador, que reflete a percepção de empresários e especialistas diante da corrupção no setor público, o Brasil tem uma classificação média de 3,7 em uma escala de um a 10, sendo 1 o mais corrupto.


A corrupção custa todos os anos aos brasileiros entre 1,4% e 2,3% do PIB, uma porcentagem que pode alcançar os 146 bilhões de dólares, segundo a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que apresentou em dezembro um dos poucos estudos que tenta quantificar o problema.

"A percepção da corrupção no Brasil se manteve nos últimos anos de forma constante e bastante alta", disse à AFP Fernando Filgueiras, coautor do estudo "Corrupção e Controles Democráticos no Brasil", publicado em 2011.

Como ele, são vários os especialistas que acreditam que os controles públicos aumentaram nos últimos anos de democracia, mas a impunidade continua sendo muito alta e o sistema político em todos os níveis deixa um amplo espaço à corrupção.

"Apenas o governo federal dispõe por lei de 90 mil cargos de confiança (de livre nomeação), enquanto nos Estados Unidos são apenas 9.051 e na Grã-Bretanha 300", disse à AFP Claudio Abramo, diretor da ONG Transparência Brasil.

"O controle é melhor do que antes, mas a justiça não vai no mesmo ritmo", complementou Marco Antonio Teixeira, pesquisador sobre o tema da Fundação Getúlio Vargas.

O contraste do Brasil como um país rico, mas do Terceiro Mundo na questão da transparência, emergiu com o caso inédito da renúncia forçada de sete ministros por supostas irregularidades em pouco mais de um ano de governo de Dilma Rousseff.

O mais recente caso foi o do ministro das Cidades, Mario Negromonte, que renunciou na quinta-feira, perseguido por denúncias de irregularidades.

No entanto, Dilma goza de uma popularidade recorde de 72% graças ao bom momento da economia e porque a opinião pública relaciona as renúncias com seu combate à corrupção, e na prática conserva a tradição de assegurar o apoio do Congresso em troca de quotas de poder.


Dilma governa com uma coalizão integrada por 10 partidos, já que o Partido dos Trabalhadores (PT) tem apenas 85 dos 581 assentos na Câmara dos Deputados.

Assim, os ministros perderam os cargos, mas seus partidos conservam os ministérios, e inclusive os sucessores foram eleitos de comum acordo entre a presidente e os grupos políticos.

"Se for somado a isso um sistema de financiamento (privado) das campanhas eleitorais extremamente frágil e sem controle eficiente, é constituída uma margem por onde a corrupção entra no sistema político", disse Filgueiras.

Entretanto, os brasileiros mantêm uma atitude ambivalente diante do problema da corrupção.

"Hoje, o brasileiro sabe que a corrupção é um problema sério e (que tem) suas consequências para a vida coletiva. Contudo, este mesmo cidadão não rejeita favorecer um familiar no poder público se tiver a oportunidade", explica Filgueiras.

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