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Contratos baseados em resultados: a mão e o coração invisíveis do mercado

Eles podem trazer capital privado para causas sociais, mas contratos com valores elevados ainda dependem de investidores com objetivos sociais

Talvez precisássemos mesmo é de um “coração invisível”. (Jesada Wongsa/Getty Images)
Talvez precisássemos mesmo é de um “coração invisível”. (Jesada Wongsa/Getty Images)
I
Impacto Social

Publicado em 9 de setembro de 2021 às, 12h00.

Última atualização em 10 de setembro de 2021 às, 16h22.

Por Fernando Deodato Domingos

As forças de mercado são por vezes lembradas devido à expressão “mão invisível”: o equilíbrio da oferta e demanda ditando preços praticados e o fluxo de produtos e serviços na economia. No entanto, desigualdades de renda e de acesso a serviços de qualidade ao redor do mundo mostram que essa “mão” pode não alcançar a todos. Determinados grupos são “tão invisíveis” que podem acabar por vezes não contemplados.

Talvez precisássemos mesmo é de um “coração invisível”. E é com essa promessa que contratos baseados em resultados são utilizados em iniciativas socioambientais. Como colocado no documentário “The Invisible Heart” (disponível aqui), esses contratos seriam capazes de atrair investimentos do mercado de capitais para causas urgentes em que governos necessitam de ajuda. Isso ocorreria devido aos pagamentos condicionais a objetivos socioambientais. Os contratos mais comentados neste sentido são os chamados Social Impact Bonds (SIB). Já falamos no blog sobre SIB, sendo usados para conservar a floresta amazônica, em projetos de cuidados paliativos ou mesmo no combate à pandemia. Sua aplicação perpassa diversos setores da economia e muitos os defendem como o futuro do impact investing, investimentos que aliam interesses financeiros aos sociais.

Mas não é tudo tão fácil. Esses contratos são por vezes criticados devido à baixa escala, uma vez que podem carecer de investimentos substanciais, perecendo como eternos projetos piloto. Em uma pesquisa recente, investigo se a orientação social do investidor pode estar relacionada com o tamanho dos contratos, em valor investido. Então, vejo que os investidores sociais (como o Banco Mundial e entidades sem fins lucrativos) estão presentes em contratos muito maiores do que investidores tradicionais (como bancos e fundos) ou mesmo aqueles que explicitam metas sociais além de retornos financeiros (por exemplo, os fundos de impacto).

O contraintuitivo é que muitos esperavam que esses contratos pudessem atrair maiores montantes de capital dos investidores tradicionais, motivados financeiramente. No entanto, um maior fluxo de capital proveniente de investidores sociais sinalizaria que tais iniciativas, na verdade, funcionariam simplesmente como uma alternativa de investimento àqueles já motivados socialmente. Por exemplo, uma entidade sem fins lucrativos pode optar por contratos baseados em resultados em vez de ações filantrópicas, ambos com fins socioambientais.

Cabe então um olhar mais atento. Em meu estudo, concluo que investidores sociais foram (e ainda são) extremamente importantes para promover o uso de SIB e outros contratos de impacto social. Os investidores tradicionais estão apenas começando a se envolver com esses mecanismos, aumentando investimentos ano a ano. Uma vez que as incertezas relativas aos retornos forem diminuídas, o que vem acontecendo à medida que contratos se mostram eficientes, aqueles não puramente motivados por objetivos sociais terão mais incentivos para investir. O mercado, agindo por meio de organizações e indivíduos com vontades sociais e econômicas, talvez não seja nem tão egoísta, nem tão altruísta. Afinal, ele é formado por organizações e, em última instância, pessoas. Vemos então que “coração” e “mão” invisíveis andam juntos.