Aplicativo Daki promete entrega em até 15 minutos. (Daki/Reprodução)
Julia Storch
Publicado em 26 de abril de 2021 às 13h27.
Um dia, vi um post no Instagram falando de um novo app que estava sendo lançado. Não sei o que acontece, mas preciso experimentar todas as coisas novas que passam na minha frente. Baixei o app. A promessa era a seguinte: "delivery, em Pinheiros, em até 15 minutos".
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Fui cética. Confesso que fui. Pedi coisas do tipo Kiro e Coca-Cola. Talvez uma barra de chocolate. Chegou em 10 minutos. Era o dia de inauguração do app.
Eu me perguntava: quem precisa de qualquer coisa em 15 minutos? Posso esperar o Rappi por 40 minutos. Posso andar até o mercado. Posso até ficar sem o chocolate.
Teria apostado contra o app que se chama Daki (aliás, bom nome). Se eu tivesse analisando para investir, não teria investido. Achava boba a promessa de 15 minutos. E mais: duvidava que eles manteriam os prometidos 15 minutos com a escala. Na minha cabeça, eu tinha a referência da Rappi e pensava: 'Daqui a pouco, vou pedir ingredientes para fazer um guacamole, eles vão entregar os ingredientes, vai faltar o abacate porque 'estava em falta'. Vão me reembolsar R$ 2,37 em Daki Créditos'.
Corta para: eu falando desse app sem parar. Peço Daki toda semana. Eventualmente mais de uma vez por dia. Ainda chega em 15 minutos, no máximo. E nunca faltou abacate.
Daki é meu novo vício. Se eu estivesse criando o posicionamento da marca, explicaria o produto assim: Daki é como um mercadinho de bairro, mas não tem loja, tem app. O mix é pequeno, mas bem preciso. Dois sorvetes, mas são aqueles dois que você tem desejo às 10 da noite. Pão artesanal, mas só no fim de semana, e um pain au chocolat que já deve ser responsável por uns quilos a mais no meu peso. As bebidas têm cara de geladeira de morador de Pinheiros. E tem pilhas e fósforos também. Do que mais você precisa?
A chave é a entrega grátis. Eu peço como quem está indo na esquina buscar um pão.
Eis que percebo um fato interessante: o Daki está ressignificando meu senso de conveniência. Está me mimando enquanto consumidora.
Não sei como será meu estilo de vida depois da pandemia. Sei que antes da pandemia eu ia ao mercado. Nos primeiros meses da pandemia, o mercado vinha até mim e chegava no dia seguinte. Depois, vinha até mim e chegava nas horas seguintes, mas tinha que ficar de olho no app para responder às perguntas sobre produtos que estavam faltando. Me sentia naquele jogo de auditório: "você troca um chocolate belga por uma banana?”. Agora, eu marco de jantar na casa de amigos, peço Daki, calço o tênis, chamo o Uber, desço e já chegou (gelado) o vinho que prometi levar. Daki é minha despensa.
Então, percebi: todo meu conceito sobre disromper um mercado estava errado.Temos a impressão que algo disruptivo é algo super diferente, inventivo, que resolve dores graves do consumidor. A verdade é que quando penso em inovações que realmente mudaram nossa vida, como Waze, Facebook, Google, Apple, Amazon, Uber, eu relembro que a dor do consumidor não era tão absurda assim. A gente se locomovia, encontrava amigos, buscava conteúdo, tinha computadores, comprava livros e pedia táxis.
A beleza consiste em facilitar algo de forma que poderia até mesmo ser considerado desnecessário. Mas, de supetão, essa disrupção se instala em nossa vida e muda tudo de forma impressionante - tão deliciosamente impressionante quanto um pain au chocolat que chega na sua casa em 15 minutos.
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Guta Tolmasquim é estrategista de marcas e CEO da Brand Gym, empresa especializada em branding para empreendedores. Além de recém viciada em pain au chocolat com Kiro.