Proibição em alta nos contratos pode fazer ações trabalhistas explodirem
Contratos de trabalho com cláusulas não concorrenciais se multiplicam após a reforma trabalhista. Caso emblemático pode gerar milhares de ações trabalhistas
Camila Pati
Publicado em 10 de abril de 2018 às 06h00.
Última atualização em 20 de janeiro de 2020 às 12h04.
São Paulo – Contratos de trabalho com cláusulas não concorrenciais estão em alta desde a Reforma Trabalhista . Uma cláusula desse tipo, quando inserida no contrato ou em um aditivo do documento, determina que o profissional não trabalhe para a concorrência durante algum tempo depois que sair da companhia.
“O objetivo das empresas é assegurar seus diferenciais competitivos, evitando que o ex-empregado leve para empresa concorrente know-how adquirido, carteira de clientes, inovações, segredos comerciais, processos internos”, explica a advogada Mayra Palópoli, do escritório Palópoli & Albrecht Advogados.
O alta de contratos com esse impedimento desde a entrada em vigor da Reforma Trabalhista é da ordem dos 30%, sobretudo em empresas de tecnologia de ponta e áreas comerciais de grande complexidade, segundo dados da EXEC, consultoria especializada em seleção de executivos. A cláusula também é comum em contratos de trabalho no mercado financeiro.
O aumento dessa prática é explicado pela maior flexibilidade de negociação permitida pela nova legislação. Para quem ganha acima do dobro do teto da previdência, ou seja, quem tem salário igual ou maior a 11.062,62, a reforma trabalhista deu autonomia nunca antes vista na relação com o empregador.
Mas, para que a cláusula seja válida, é preciso que o profissional seja compensado. O entendimento entre os juízes do Trabalho é de que é obrigação da empresa que não abre mão da cláusula não concorrencial indenizar seus ex-funcionários que ficarão impedidos de trabalhar.
“A compensação usualmente se traduz em pagamento de salários, mas pode compreender também cursos para preparar para a nova atividade, serviço de headhunter ou benefícios e salários”, diz Mayra. Além disso, a cláusula, obrigatoriamente, deve ter um período de duração (não pode ser indeterminado ou por toda a vida) e delimitar a área de proibição.
Caso emblemático pode render milhares de ações trabalhistas idênticas
No mês passado, a 3ª turma do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (TRT2) condenou a Vallourec Tubos do Brasil a indenizar o ex-funcionário Omar de Carvalho Paiva Neto por conta de clausula não concorrencial determinada no contrato de trabalho que mantinham.
A Vallourec inseriu cláusula não concorrencial determinando que Paiva Neto ficasse dois anos após o fim do contrato sem trabalhar na sua área de atuação. Mas não pagou indenização, em contrapartida.
“Em primeira instância, o juiz entendeu que a empresa não exerceu o direito da cláusula porque nada foi dito na rescisão contratual. O TRT2 modificou a decisão e determinou o pagamento dos salários”, diz a advogada.
Agora, a empresa terá de pagar 24 salários equivalente à sua última remuneração (estabelecida em 16.498 reais) além dos juros e correções, e o valor total deve passar de 400 mil reais.
“Este caso é emblemático e pode representar centenas ou milhares de ações idênticas. Muitas vezes no momento da contratação, a empresa acha importante a cláusula não concorrencial e na hora da demissão nem faz muito sentido, mas esquece de abrir mão de seu direito de proteger segredos industriais ou algo do gênero, que tenha seu valor para o negócio”, explica Mayra.
Que cuidados tomar ao aceitar essa cláusula no contrato?
“O profissional deve se atentar para as restrições impostas, especialmente o período e área de proibição e verificar se a compensação é capaz de dar-lhe ferramentas para buscar colocação em outro segmento ou área; e ainda se os valores são suficientes para manter seus gastos durante um período”, diz Mayra.
A empresa também deve se preocupar, segundo ela. A cláusula de não concorrência exige altos custos de compensação e só deve ser utilizada para profissionais que efetivamente detenham conhecimento relevante da empresa, diz a especialista. “Não deve ser inserida como padrão nos contratos de trabalho porque uma vez prevista, não permite a simples liberação do profissional para trabalhar livremente”, indica.