Nossos familiares têm com a empresa onde trabalhamos um contrato psicológico. De forma sutil e implícita, é como se trabalhassem na mesma empresa onde trabalhamos. (Connect Images/Getty Images)
Repórter
Publicado em 8 de janeiro de 2025 às 13h56.
Imagine uma cena típica de almoço em família. Todos à mesa, comendo enquanto a conversa corre solta. Independente do cardápio, é comum que algum parente compartilhe aspectos do seu emprego, comente sobre seus colegas de equipe, seu chefe e sobre os produtos e serviços que a empresa comercializa. Como costumam ser esses comentários? Apreciativos? Depreciativos? E qual a importância desses testemunhos? Quando ouvimos um parente falar sobre sua experiência de trabalho, o que mais nos chama a atenção? O que soa como mais relevante para nossos ouvidos?
Agora imagine um vínculo bem próximo de parentesco com essa pessoa: você é seu cônjuge, irmão, irmã, filho, filha, pai ou mãe. Como esses comentários mexem com você?
Para compreender como as famílias enxergam as experiências de trabalho dos seus parentes, a Winx, uma HR Tech focada em pesquisas de clima, engajamento e cultura, realizou uma pesquisa em 2023, e que foi realizada pela segunda vez entre agosto e outubro de 2024. Por meio de uma pesquisa on-line, a Winx ouviu neste ano 3.261 familiares de funcionários de 15 empresas em torno de um questionário com 20 questões. As respostas seguiram a lógica da Escala Likert (aquela que vai do concordo totalmente ao discordo totalmente) e produziram resultados de favorabilidade. Os funcionários destas 15 empresas trabalham em 19 estados do Brasil.
De acordo com a pesquisa a qual a Exame teve acesso exclusivo, existe um impacto relevante sobre como a família enxerga a empresa em que um parente trabalha, e não é difícil entender o porquê. Veja as principais conclusões.
Nossos familiares têm com a empresa onde trabalhamos um contrato psicológico. De forma sutil e implícita, é como se trabalhassem na mesma empresa onde trabalhamos. Ainda que indiretamente, sentirão o que sentimos. Moldarão em suas mentes uma reputação herdada da nossa experiência.
As interações com a empresa onde nosso parente trabalha podem ser inúmeras. Ele pode ser funcionário em uma empresa que interage com a organização onde trabalhamos. É sua cliente, fornecedora, financiadora, patrocinadora ou investidora. Podemos consumir produtos e serviços dessa empresa onde nosso familiar está empregado. Dependendo do que ouvimos sobre essa marca – sobretudo de fontes afetivas – teremos mais ou menos simpatia por ela.
Quando um membro da família compartilha percepções negativas da empresa onde trabalha, difícil ficarmos indiferentes. Deixaremos de recomendá-la, não mais compraremos dela, ou até desistiremos de investir em suas ações na Bolsa. Esses são apenas alguns exemplos dessas consequências.
Além das 20 perguntas fechadas, os familiares dos funcionários dessas empresas usaram campos em aberto para responder livremente três perguntas:
A inteligência artificial da Winx analisou as respostas fechadas e os comentários qualitativos das famílias, considerando o seguinte recorte: se o familiar pudesse dar uma declaração hipotética e ideal sobre a experiência do seu parente, o que diria? A empresa dos sonhos para as famílias seria assim descrita:
“Desde que meu cônjuge iniciou nesta empresa, sinto que ganhou uma nova consciência sobre saúde integral a partir das várias iniciativas das quais participa por lá. Percebo que está com mais atenção à qualidade da sua alimentação e do seu bem-estar físico geral.”
“Quando estamos em família, é comum mencionar a conexão que tem com seus colegas de trabalho. Sinto que a empresa cuida tanto das condições físicas para trabalhar quanto dos relacionamentos.”
“Meu cônjuge sente orgulho das suas realizações e admira os produtos e serviços da empresa. Sente-se reconhecido, valorizado, desafiado e sempre aprendendo.”
“A flexibilidade de trabalhar 2 dias da semana em home office é fundamental para meu parente se estressar menos com o trânsito e com a insegurança da rua.”
O texto acima leva em conta o perfil quantitativo mais representativo do familiar dessa pesquisa: é cônjuge do gênero feminino, de 26 a 39 anos, que convive com seu parente e que se declara independente financeiro dele.
“A família se engaja mais com a empresa do seu parente quando percebe sua atenção para a saúde integral dos seus funcionários”, afirma Rogério Chér, sócio fundador da Winx. “Saúde foi a preocupação principal das famílias em 2023 e aumentou de modo significativo em 2024”, diz Chér.
O tipo de empresa que ganha mentes e corações das famílias, de acordo com a pesquisa, tem programas de conscientização para cuidados médicos, suporte para uma rigorosa disciplina com checkups regulares, além de orientação quanto à dieta alimentar dos seus funcionários.
“É como se a família dissesse o seguinte: aqui está meu parente para trabalhar com vocês. Cuide dele por nós. Incentive seus cuidados com saúde e alimentação. Empresas assim ganham enorme simpatia dos familiares!”, afirma Luís Alexandre Chicani, CEO e fundador da Bencorp, patrocinadora da pesquisa da Winx.
A Duas Rodas, empresa de aromas para alimentos, foi uma das companhias que participou da pesquisa e que aposta em ações voltadas à saúde e bem-estar dos funcionários, como programa diário de ginástica laboral e o programa “Rumo à vitalidade”, que oferece acompanhamento personalizado para grupos de risco, como pessoas com sobrepeso, obesidade ou doenças crônicas.
“Esses funcionários participam de atividades conduzidas por nutricionistas, educadores físicos e psicólogos, aprendendo a adotar uma rotina mais saudável, com alimentação equilibrada, prática de exercícios e controle do estresse”, afirma Clodoaldo Heidemann, gerente corporativo de relações humanas das Duas Rodas.
Ainda sobre incentivo à alimentação saudável, a Duas Rodas oferece em seus restaurantes um cardápio balanceado desenvolvido por nutricionistas e que respeita restrições alimentares e necessidades de dietas especiais. “Também realizamos palestras sobre a importância de uma dieta equilibrada, com reforço e dicas na nossa rede social interna”, diz Heidemann.
Outro ponto de destaque dessa pesquisa é o trabalho remoto. Embora as famílias compreendam a relevância do trabalho presencial, é evidente o quanto apreciam empresas que oferecem alguma flexibilidade.
Quando o familiar tem parente com trabalho parcialmente remoto, suas respostas são em média 7 pontos percentuais mais favoráveis do que aqueles que trabalham 100% presencialmente. “O raciocínio é que trabalhar alguns dias em casa traz menos fadiga, mais conexão com a família e uma vida mais saudável”, afirma Chér.
A seguradora HDI Liberty, por exemplo, oferece como benefício flexibilidade no horário (desde que seja cumprida a jornada de trabalho) e aposta no regime de trabalho híbrido, segundo Delane Giannetti, diretora de talentos da HDI Liberty.
“Trabalhamos duas vezes na semana fisicamente no escritório, o que tem ajudado no bem-estar dos funcionários. Valorizamos os trabalhos que sejam colaborativos no escritório, como encontros com clientes e reuniões de equipes”, afirma Giannetti, que acredita que a felicidade do funcionário impacta tanto internamente, quanto os clientes e a família. “Queremos oferecer um ambiente em que o funcionário tenha prazer de trabalhar”.
Por trás desse desejo, novamente a saúde integral dos parentes ganha relevo. Quando podem organizar parte da semana trabalhando remotamente, isso traz impactos altamente desejados pelos familiares:
Dormir melhor, aliás é um significativo desejo dos familiares. Uma das perguntas dessa pesquisa com pior avaliação se refere ao impacto do trabalho na qualidade do sono dos parentes funcionários. Segundo a Dra. Monica Andersen, Biomédica, Professora da Universidade Federal de São Paulo e Diretora do Instituto do Sono (também patrocinadora da pesquisa Winx), a pessoa que chega em casa e não dorme direito perturba a família toda.
“O sono é 1/3 das nossas vidas. E, quando esse 1/3 não está na quantidade e na qualidade necessárias, o funcionário e toda a sociedade sofrem com o desfecho dos outros 2/3, que é a vigília”, afirma Dra. Monica. "Quando aumentamos a quantidade e a qualidade do nosso sono, temos uma qualidade de vida melhor."
Para explicar a importância do sono na saúde e produtividade dos funcionários, a HDI Liberty realizou uma semana com palestras sobre saúde física e mental, e um dos especialistas que participou foi o do sono. “Por meio dessas palestras orientamos os nossos funcionários a como ser mais saudáveis, inclusive quando o assunto é o sono, algo tão importante para a saúde integral”, diz Giannetti. “Em caso de diagnósticos como apneia do sono, encaminhamos o funcionário para um tratamento”.
A pesquisa mostra que existe uma expectativa das famílias das empresas que empregam seus parentes atuarem na qualidade do sono dos seus funcionários. São fartos os problemas ligados a este tema: insônia crônica, sonolência durante as atividades diurnas em razão de noites mal dormidas, roncos, apneia do sono e uso inadequado de remédios para dormir.
“O que vale mais hoje são as medidas de higiene de sono. Como estamos vivendo cada vez mais, é também importante vivermos melhor e o sono é, sem dúvida, um componente fundamental. Isso determina em grande medida como o indivíduo comparece ao trabalho no dia seguinte”, afirma Anderson.
O que a pesquisa realizada pela Winx traz como evidência pode ser colocada em forma de pergunta: como a empresa empregadora do meu parente pode apoiá-lo em sua saúde integral?
O apoio à saúde mental tem ganhado a atenção de muitas empresas, como o da Duas Rodas. “Promovemos palestras regulares sobre o cuidado com a saúde mental e capacitamos nossos líderes para estabelecer um clima de confiança e empatia. Assim, nossos colaboradores se sentem mais à vontade para buscar ajuda quando necessário”, afirma Heidemann.
Mas para as famílias, a preocupação vai além da saúde mental – tão em foco desde a pandemia. Esperam apoio das empresas também para o bem-estar físico dos seus entes queridos.
Para ajudar na área de saúde integral, a HDI Liberty aposta em atividades de saúde física, como Gympass e até uma ergonomista local, que ajuda os funcionários a manter uma postura saudável frente ao computador, conta Giannetti. “Dentro do ambiente de trabalho, a profissional orienta o tempo que precisamos levantar, como esticar o corpo e qual postura manter para não ter dores musculares, seja para profissionais no escritório ou em home office”, afirma.
A Fini, empresa de balas e doces, também possui programas de qualidade de vida, como “Melhor Maternidade e Paternidade” com encontros trimestrais e acompanhamento durante todo o período gestacional. “Tem sido um programa super diferenciado para a família, tanto para as mulheres quanto para os homens”, afirma Elisangela Lima, diretora global do grupo the Fini Company. A companhia também aposta em um programa de acolhimento para as doenças crônicas e também o “Melhor Abraço” que é o programa de apoio no caso de perda de pessoas na família, além de oferecer assistência ao empregado e sua família para os cuidados com a saúde financeira, social, psicossocial e jurídica.
No final, a pesquisa com essas organizações evidencia benefícios corporativos - quando se coloca atenção também nos familiares dos funcionários. De acordo com a Winx, essas 15 empresas obtiveram ótimas respostas para os seguintes temas:
“Algumas empresas irão olhar para essa pesquisa com indiferença. Outras, lançarão iniciativas nesta direção e ampliarão não apenas o engajamento dos seus funcionários, mas também estenderão esse efeito para suas famílias”, afirma Chér.
As iniciativas internas dessas companhias criam um ciclo virtuoso entre empresa, funcionário e família, afirma Chér, que liderou o estudo. “Um ciclo, aliás, muito positivo. Trata-se da conquista de um grupo seleto de empresas: aquelas que se tornam as mais queridas pelas famílias.”