A praga dos jargões só atrapalha sua carreira.Veja o porquê
Falar e escrever mal prejudica a vida profissional. Veja como melhorar sua comunicação e transmitir as ideias com clareza
Da Redação
Publicado em 8 de setembro de 2013 às 09h25.
São Paulo - O escritor angolano José Eduardo Agualusa é tido como o predileto da presidente brasileira, Dilma Rousseff. Em seu livro Milagrário Pessoal (2010), ele faz uma crítica às palavras fracas, muitas das quais lotam o vocabulário corporativo.
A protagonista da história é uma jovem linguista cujo trabalho é usar um software para descobrir novas palavras — os neologismos — em jornais e revistas e, quando for o caso, registrá-las em dicionário.
Mas isso pouco acontece. As gírias que repetimos no trabalho, mostra o escritor, pouco contribuem para a comunicação e não merecem a inclusão oficial em nosso vocabulário. Veja o que ele diz neste trecho do livro: "Entre as palavras recém-nascidas, a taxa de mortalidade é elevada. Muitas padecem de graves defeitos congênitos. São frágeis, mal respiram, não resistem ao duro processo da seleção natural".
O trabalho é a fonte primária dessas palavras fracas e desprovidas de sentido e precisão, que dificultam a comunicação e atrapalham o desempenho do profissional que as profere. Do chão de fábrica às mesas de conselho, ninguém escapa dos jargões, estrangeirismos, lugares-comuns e gírias. Quem nunca ouviu ou recebeu e-mails com termos como "agregar valor ao negócio", "sinergia" ou "approach"?
"A comunicação ruim é uma praga nas empresas", afirma Edison Rosa, consultor de comunicação, de São Paulo. De acordo com ele, muitos profissionais acham que usar jargão o tempo todo transmite a ideia de domínio da área e impressiona os colegas. "O problema é que, muitas vezes, a mensagem é simplesmente ininteligível ou pedante", diz o consultor.
Uma pesquisa feita no LinkedIn , rede social com mais de 135 milhões de usuários — 6 milhões só no Brasil —, mostra que palavras como "inovador" e "criativo" aparecem em mais de 3.000 perfis.
Para Danielle Restivo, gerente de comunicação corporativa do LinkedIn para Canadá e Brasil, as pessoas usam essas palavras para descrever sua experiência profissional como forma de se enquadrar em um grupo. "São expressões que se tornaram populares e parecem mais importantes do que são", diz Danielle.
Faltam vocabulário e capacidade de argumentar e de dar clareza aos discursos. "Os profissionais se escondem atrás dessas palavras porque têm um vocabulário pobre", diz Osório Antônio Candido da Silva, professor da BSP e da Fundação Instituto de Administração (FIA), em São Paulo, e especialista em técnicas de comunicação e expressão verbal.
De acordo com ele, as pessoas têm dificuldade de se expressar e pouca familiaridade com a língua portuguesa. "Muitas são fluentes em inglês mas não conseguem explicar algo simples em seu próprio idioma."
Cuidado com a gramática
Os ruídos de comunicação prejudicam a carreira. Uma pesquisa feita pelo Project Management Institute Brasil (PMI) em 2010 com 300 companhias nacionais e multinacionais mostrou que em 76% delas os projetos não dão certo porque os profissionais não sabem escrever nem falar bem. “
"Hoje em dia, uma enorme parcela de pessoas chega ao mercado de trabalho sem competência para redigir um texto formal de qualidade", diz a professora Maria Clara Jorgewich Cohen, autora do livro Comunicação Escrita – A Busca do Texto Objetivo (Editora E-Papers).
O mais grave, ela ressalta, é que a maioria dos profissionais não admite que precisa melhorar. "Muitos ficam constrangidos de frequentar cursos porque ocupam altos cargos", diz Maria Clara.
A percepção de que a deficiência do idioma é crescente parte do próprio mercado. Hoje, escolas de idiomas oferecem aulas de português para brasileiros. Várias têm ampliado o número de treinamentos.
A Fundação Fisk, por exemplo, oferece o curso Português sem Tropeços desde o segundo semestre de 2008 e atualmente atende mais de 5.000 alunos em todo o país. Dos matriculados, 70% vêm de empresas, principalmente das áreas financeira e comercial, e a maioria é composta por gestores.
"Percebemos que existia no mercado um desnível entre a competência técnica e a habilidade de comunicação", diz o professor Elvio Peralta, diretor superintendente da Fisk de São Paulo.
De acordo com Elvio, embora a cobrança pelo segundo idioma seja alta no mercado, o profissional não pode descuidar da própria língua. "Quem não tem o domínio do português com certeza será malvisto", afirma. "Há deficiências graves em concordância verbal e nominal e referentes à nova ortografia."
A Companhia de Idiomas é outra escola que oferece cursos de português para brasileiros. “Quando é a empresa que nos procura, fazemos um levantamento das necessidades já percebidas pelo RH e aplicamos um teste para detectar exatamente quais áreas precisam ser trabalhadas”, diz Ligia Crispino, sócia-diretora da escola.
Assim, os cursos podem abordar a produção oral e escrita, regras de gramática e a nova ortografia — depende do que é necessário para melhorar a comunicação com o público.
O antigo curso de reciclagem é chamado oficina de comunicação. Isso porque, afirma Ligia, quando a solicitação vem da direção ou do RH, muitos alunos não querem dispor do tempo que têm para estudar português. "O objetivo é sensibilizá-los da importância que a comunicação tem para os negócios", diz Ligia.
O uso correto do idioma pode ser a diferença entre um desempenho eficaz e o fiasco nas relações com colegas e clientes. Deixe de lado o preconceito e abuse do vasto vocabulário da língua portuguesa. De nada adianta falar mais de um idioma e ser especialista num assunto se você não conseguir transmitir ideias em seu próprio idioma. Solte o verbo, mas de maneira correta.
Comunicação sem ruídos
A gerente financeira Edjane Andrade, de 38 anos, da empresa de tecnologia Amadeus, de São Paulo, voltada para o setor de turismo, sabe que não pode descuidar da língua portuguesa. Em março de 2011, ela fez um curso sobre reforma ortográfica que abordou também o uso excessivo de expressões em idioma estrangeiro, jargões e vícios. "Para quem deseja ter uma carreira sólida e, principalmente, atingir um cargo de liderança, falar e escrever bem em português é essencial", diz Edjane.
Jargões fora do vocabulário
O advogado paulista Maurício da Costa, de 30 anos, diretor jurídico da Cooperativa Central de Produção Industrial de Trabalhadores em Metalurgia, procurou um curso de português para diminuir o emprego de jargões como "proativo" e "inovador". "Usava muitas palavras desse tipo e sabia que precisava mudar esse hábito", afirma.
Como aprimorar a comunicação oral e escrita
- Evite o uso sem necessidade de palavras já desgastadas, como "paradigma", "valor" e "sinergia". Evite os verbos ingleses aportuguesados, como printar, startar, linkar, atachar.
- Elimine gerundismos como "vou estar apresentando", "vamos estar demonstrando".
- Não complique. Desenvolva um vocabulário simples e objetivo para apresentar suas ideias.
- Pronuncie bem as palavras. Não corte o "s" e o "r" finais nem o "i" intermediário.
- Fuja dos cacoetes no meio do raciocínio, como "tá ok?", "é assim", "né", "bem", "então", "certo?", "é o seguinte".
São Paulo - O escritor angolano José Eduardo Agualusa é tido como o predileto da presidente brasileira, Dilma Rousseff. Em seu livro Milagrário Pessoal (2010), ele faz uma crítica às palavras fracas, muitas das quais lotam o vocabulário corporativo.
A protagonista da história é uma jovem linguista cujo trabalho é usar um software para descobrir novas palavras — os neologismos — em jornais e revistas e, quando for o caso, registrá-las em dicionário.
Mas isso pouco acontece. As gírias que repetimos no trabalho, mostra o escritor, pouco contribuem para a comunicação e não merecem a inclusão oficial em nosso vocabulário. Veja o que ele diz neste trecho do livro: "Entre as palavras recém-nascidas, a taxa de mortalidade é elevada. Muitas padecem de graves defeitos congênitos. São frágeis, mal respiram, não resistem ao duro processo da seleção natural".
O trabalho é a fonte primária dessas palavras fracas e desprovidas de sentido e precisão, que dificultam a comunicação e atrapalham o desempenho do profissional que as profere. Do chão de fábrica às mesas de conselho, ninguém escapa dos jargões, estrangeirismos, lugares-comuns e gírias. Quem nunca ouviu ou recebeu e-mails com termos como "agregar valor ao negócio", "sinergia" ou "approach"?
"A comunicação ruim é uma praga nas empresas", afirma Edison Rosa, consultor de comunicação, de São Paulo. De acordo com ele, muitos profissionais acham que usar jargão o tempo todo transmite a ideia de domínio da área e impressiona os colegas. "O problema é que, muitas vezes, a mensagem é simplesmente ininteligível ou pedante", diz o consultor.
Uma pesquisa feita no LinkedIn , rede social com mais de 135 milhões de usuários — 6 milhões só no Brasil —, mostra que palavras como "inovador" e "criativo" aparecem em mais de 3.000 perfis.
Para Danielle Restivo, gerente de comunicação corporativa do LinkedIn para Canadá e Brasil, as pessoas usam essas palavras para descrever sua experiência profissional como forma de se enquadrar em um grupo. "São expressões que se tornaram populares e parecem mais importantes do que são", diz Danielle.
Faltam vocabulário e capacidade de argumentar e de dar clareza aos discursos. "Os profissionais se escondem atrás dessas palavras porque têm um vocabulário pobre", diz Osório Antônio Candido da Silva, professor da BSP e da Fundação Instituto de Administração (FIA), em São Paulo, e especialista em técnicas de comunicação e expressão verbal.
De acordo com ele, as pessoas têm dificuldade de se expressar e pouca familiaridade com a língua portuguesa. "Muitas são fluentes em inglês mas não conseguem explicar algo simples em seu próprio idioma."
Cuidado com a gramática
Os ruídos de comunicação prejudicam a carreira. Uma pesquisa feita pelo Project Management Institute Brasil (PMI) em 2010 com 300 companhias nacionais e multinacionais mostrou que em 76% delas os projetos não dão certo porque os profissionais não sabem escrever nem falar bem. “
"Hoje em dia, uma enorme parcela de pessoas chega ao mercado de trabalho sem competência para redigir um texto formal de qualidade", diz a professora Maria Clara Jorgewich Cohen, autora do livro Comunicação Escrita – A Busca do Texto Objetivo (Editora E-Papers).
O mais grave, ela ressalta, é que a maioria dos profissionais não admite que precisa melhorar. "Muitos ficam constrangidos de frequentar cursos porque ocupam altos cargos", diz Maria Clara.
A percepção de que a deficiência do idioma é crescente parte do próprio mercado. Hoje, escolas de idiomas oferecem aulas de português para brasileiros. Várias têm ampliado o número de treinamentos.
A Fundação Fisk, por exemplo, oferece o curso Português sem Tropeços desde o segundo semestre de 2008 e atualmente atende mais de 5.000 alunos em todo o país. Dos matriculados, 70% vêm de empresas, principalmente das áreas financeira e comercial, e a maioria é composta por gestores.
"Percebemos que existia no mercado um desnível entre a competência técnica e a habilidade de comunicação", diz o professor Elvio Peralta, diretor superintendente da Fisk de São Paulo.
De acordo com Elvio, embora a cobrança pelo segundo idioma seja alta no mercado, o profissional não pode descuidar da própria língua. "Quem não tem o domínio do português com certeza será malvisto", afirma. "Há deficiências graves em concordância verbal e nominal e referentes à nova ortografia."
A Companhia de Idiomas é outra escola que oferece cursos de português para brasileiros. “Quando é a empresa que nos procura, fazemos um levantamento das necessidades já percebidas pelo RH e aplicamos um teste para detectar exatamente quais áreas precisam ser trabalhadas”, diz Ligia Crispino, sócia-diretora da escola.
Assim, os cursos podem abordar a produção oral e escrita, regras de gramática e a nova ortografia — depende do que é necessário para melhorar a comunicação com o público.
O antigo curso de reciclagem é chamado oficina de comunicação. Isso porque, afirma Ligia, quando a solicitação vem da direção ou do RH, muitos alunos não querem dispor do tempo que têm para estudar português. "O objetivo é sensibilizá-los da importância que a comunicação tem para os negócios", diz Ligia.
O uso correto do idioma pode ser a diferença entre um desempenho eficaz e o fiasco nas relações com colegas e clientes. Deixe de lado o preconceito e abuse do vasto vocabulário da língua portuguesa. De nada adianta falar mais de um idioma e ser especialista num assunto se você não conseguir transmitir ideias em seu próprio idioma. Solte o verbo, mas de maneira correta.
Comunicação sem ruídos
A gerente financeira Edjane Andrade, de 38 anos, da empresa de tecnologia Amadeus, de São Paulo, voltada para o setor de turismo, sabe que não pode descuidar da língua portuguesa. Em março de 2011, ela fez um curso sobre reforma ortográfica que abordou também o uso excessivo de expressões em idioma estrangeiro, jargões e vícios. "Para quem deseja ter uma carreira sólida e, principalmente, atingir um cargo de liderança, falar e escrever bem em português é essencial", diz Edjane.
Jargões fora do vocabulário
O advogado paulista Maurício da Costa, de 30 anos, diretor jurídico da Cooperativa Central de Produção Industrial de Trabalhadores em Metalurgia, procurou um curso de português para diminuir o emprego de jargões como "proativo" e "inovador". "Usava muitas palavras desse tipo e sabia que precisava mudar esse hábito", afirma.
Como aprimorar a comunicação oral e escrita
- Evite o uso sem necessidade de palavras já desgastadas, como "paradigma", "valor" e "sinergia". Evite os verbos ingleses aportuguesados, como printar, startar, linkar, atachar.
- Elimine gerundismos como "vou estar apresentando", "vamos estar demonstrando".
- Não complique. Desenvolva um vocabulário simples e objetivo para apresentar suas ideias.
- Pronuncie bem as palavras. Não corte o "s" e o "r" finais nem o "i" intermediário.
- Fuja dos cacoetes no meio do raciocínio, como "tá ok?", "é assim", "né", "bem", "então", "certo?", "é o seguinte".