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Evoluímos? Vingança e lei do "olho por olho" ainda imperam nas empresas

Pesquisa da Kellogg School of Management investiga quais os tipos de reação que podemos ter para diferentes agressões no ambiente de trabalho

Escritório: pesquisa mostra que reação das pessoas a agressões é, no geral, orientada por "empatar" o jogo (Skynesher/Getty Images)

Maurício Grego

Publicado em 2 de setembro de 2019 às 05h50.

Última atualização em 2 de setembro de 2019 às 16h43.

Conflitos no local de trabalho podem prejudicar a cultura do escritório, desde fofocas sem fim até colegas que acabam em brigas cruéis e intermináveis.

Como os funcionários acabam entrando nesses ciclos de negatividade? Essa é a principal pergunta que Cynthia Wang, professora clínica de administração e organizações da Kellogg School , estuda em uma nova pesquisa.

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Ocasionalmente, a maldade de baixo nível faz parte da maioria dos locais de trabalho. Mas quando o mafamu comportamento se torna endêmico, os escritórios que ignoram tais práticas correm risco.

“É altamente custoso para as organizações, pois diminui a eficiência e prejudica a moral, um fator fundamental para o bom funcionamento organizacional”, diz Wang, sem mencionar os riscos de reputação enfrentada pelas empresas caso a fama de cultura negativa se espalhe.

Atualmente, há muitas pesquisas sobre o chamado comportamento negativo no local de trabalho, uma categoria que inclui má conduta grave, como assédio sexual e transgressões cotidianas, como navegar no site da Amazon enquanto se deveria estar terminando um projeto.

Esses estudos focaram principalmente os indivíduos, identificando tendências de personalidade ou atitudes entre os “maus elementos” que cometem as infrações. No entanto, na verdade, algumas condutas indevidas mais intratáveis no local de trabalho não são oriundas de únicos indivíduos.

Elas envolvem pelo menos duas pessoas: se há um valentão no escritório , também há alguém sendo intimidado. Wang e seus colegas queriam captar esse contexto social mais amplo e entender como os alvos do comportamento no local de trabalho reagem a provocações.

Os pesquisadores esperavam descobrir mais a respeito de um debate de longa data em sua área: quando as pessoas são maltratadas, elas reagem prontamente (“olho por olho”), denunciam o mau comportamento para o gestor ou tentam por panos quentes na situação e encerrar o assunto?

Para descobrir isso, Wang se uniu a Lindsey M. Greco, da Oklahoma State University, Ernest H. O'Boyle, da Universidade de Indiana, Joongseo Kim, da Universidade Estadual da Pensilvânia-Erie, e Jennifer A. Whitson, da Universidade da Califórnia, em Los Angeles. O que a equipe de pesquisadores descobriu foi uma evidência robusta de que as pessoas buscam, em sua maioria, empatar o jogo.

“Descobrimos que é mais uma forma de reação “olho por olho”, em geral, com alguma evidência também de denúncias para o gestor”, explica Wang. Além do mais, existe a vontade de dar o troco na mesma moeda, seja você o alvo de transgressão leve ou grave.

A pesquisa também sugere como os gestores podem efetivamente cortar o mau comportamento pela raiz.

Medindo a má conduta no escritório

Como você estuda o comportamento negativo no trabalho? Como as ações e reações envolvidas poderem ser muito complexas, não se trata de algo que os pesquisadores pudessem capturar facilmente em um experimento de laboratório. Por isso, eles optaram pela meta-análise, selecionando dados de outros estudos publicados e colocando-os em novos usos.

Isso envolveu a pesquisa de centenas de artigos de periódicos sobre a má conduta no local de trabalho e a identificação daqueles que capturaram informações úteis sobre o comportamento negativo de uma das partes e como a outra parte reagiu no local de trabalho.

No final, a amostra da equipe, composta por 207 estudos (a maioria com dados coletados por meio de questionários), incluiu quase 97 mil indivíduos e representou um conjunto diversificado de setores, incluindo a área da saúde, serviços e governo.

Os pesquisadores analisaram apenas os casos em que mais de uma pessoa estava envolvida e onde poderiam identificar um alvo claro, seja outra pessoa (como em casos de bullying ou sabotagem) ou a própria organização (como em casos de absenteísmo ou desvio de verbas ou bens no local de trabalho).

Para cada instância de comportamento negativo, os pesquisadores também foram capazes de determinar se um indivíduo era o agente ou o alvo do comportamento, uma vez que essas informações foram captadas pelos estudos originais que agregaram.

A equipe classificou os dados desses estudos publicados em grupos, determinando se cada comportamento era leve, moderado ou grave, bem como se era passivo (tal como não comparecer ao trabalho), ativo (gritar com um colega), ou um pouco de ambos (como reclamar aos colegas de trabalho pelas costas do chefe).

Eles também olharam para o alvo do comportamento, se ele foi direcionado contra o instigador original ou deslocado para outra pessoa ("você me machuca e eu chuto meu cachorro", como Wang descreve).

A análise dessas dimensões separadamente permitiu que os pesquisadores desenvolvessem um quadro com nuances do comportamento negativo no local de trabalho e suas consequências. Por exemplo, poderiam descobrir se a má conduta grave, como o assédio sexual, era mais propensa a gerar uma reação de denúncia ao gestor do que a má conduta leve, como fofocas; ou se formas altamente ativas de comportamento humilhante, como o bullying por parte de um chefe, podem produzir reações mais passivas, como faltar ao trabalho por motivo de doença.

Os pesquisadores não sabiam quais padrões surgiriam, mas esperavam ver uma mistura de denúncias, complacência e reciprocidade, dependendo da circunstância.

Hora da vingança

No final, o que mais sobressaiu para Wang e seus colegas foi uma notável tendência para formas de retaliação recíproca, ou “olho por olho”, em todos os diferentes aspectos da má conduta estudados.

Para analisar como o comportamento negativo no ambiente de trabalho influencia as reações de retaliação, os pesquisadores tomaram as taxas médias de retaliação em um local de trabalho e as usaram para calcular a frequência dos níveis comparáveis de retaliação. Sua análise estatística revelou que, à medida que algum nível de comportamento negativo se tornava mais comum, estava mais consistentemente relacionado a um aumento nas reações recíprocas, ou “olho por olho”. Isto é, a má conduta leve estava mais fortemente associada a reações igualmente leves, e a má conduta grave estava mais fortemente associada à reação de retaliação grave.

Da mesma forma, os pesquisadores descobriram a relação mais forte entre comportamentos e reações igualmente ativos. Portanto, os comportamentos ativos geram reações ativas e os comportamentos passivos produzem reações passivas.

No entanto, houve também evidência de denúncia como reação a certos tipos de mau comportamento. Uma má conduta moderada (não leve ou grave) foi muitas vezes associada a reações mais severas, e um comportamento equilibrado - o qual não é totalmente passivo nem ativo - foi associado a formas mais ativas de retaliação.

Embora os dados não expliquem os motivos, os autores especulam que os comportamentos negativos moderados podem atingir um ponto ideal que os torna mais fáceis de denunciar. "Se for muito leve, pode não ser suficiente para desencadear denúncia", diz Wang.

Analisar se as pessoas retaliariam diretamente contra o agressor original ou se a retaliação foi deslocada provou ser o fato mais desafiador deste estudo, pois havia pouquíssimos estudos existentes que incluíam essa informação. No entanto, com base nos dados disponíveis, a equipe notou algo intrigante. Havia evidência de complacência quando a retaliação era direcionada à pessoa que originalmente lhe prejudicou.

Essencialmente, se João maltratar José, a retaliação de José provavelmente será menos grave se João, em vez de outro colega, for seu alvo. Isso pode indicar algo sobre as relações de poder no trabalho nessas situações, diz Wang. Por exemplo, um leve insulto pode ser a única forma de retaliação disponível se o instigador for o chefe.

Os pesquisadores também analisaram fatores demográficos, como idade, sexo e antecedentes culturais, para ver se tinham algum efeito na retaliação, mas não encontraram padrões consistentes. Quando se trata de se envolver em comportamentos negativos no local de trabalho, todos parecem estar em pé de igualdade.

Acabando com a retaliação no trabalho

Wang se surpreendeu com a evidência consistente e robusta de retaliação recíproca como a reação dominante contra o comportamento negativo no local de trabalho.

“Eu esperava uma reação “olho por olho” até certo ponto, mas também esperava mais denúncias ou comportamentos complacentes, dependendo do contexto", diz ela.

Então, o que isso significa para gestores e executivos? Como o comportamento negativo no local de trabalho é relacional, a punição para esses indivíduos talvez não interrompa o ciclo. Em vez disso, pode ser mais eficaz concentrar-se em ajudar as partes envolvidas em conflito a trabalharem juntas para reduzi-lo. E, pelo fato de o comportamento negativo no local de trabalho gerar ainda mais comportamento negativo, o mais importante que os líderes podem fazer é impedir que as pessoas se tornem instigadoras.

"Se uma pessoa está fofocando, ou está sabotando outras pessoas com pequenas ações, se está tirando seus recursos ou roubando suas ideias, haverá uma reação", diz Wang. “Se conseguir impedir que um deles reaja, conseguirá impedir o outro de agir”.

Texto publicado originalmente no site Kellogg Insight, da Kellog School of Management

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