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Como se livrar da humilhação no trabalho?

Casos de assédio moral triplicam na Justiça em quatro anos. Veja o que fazer para evitar problemas no trabalho e não prejudicar sua carreira

Terror psicológico no ambiente de trabalho: denúncias em São Paulo passando de 78 para 216 ações judiciais (Raul Junior/EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 4 de abril de 2013 às 11h49.

São Paulo - Há três anos, o acreano Jorge da Silva Tavares, hoje com 35, era vendedor da Renosa, fabricante da Coca-Cola em Mato Grosso. Lá, foi vítima de assédio moral . A empresa permitiu que a equipe comercial fosse submetida a um ritual de humilhação que consistia em dar semanalmente um troféu ao funcionário de pior desempenho.

Tudo ocorria na frente de todos os demais. "A coisa começou na base da brincadeira", conta Jorge. "O problema foi quando a situação passou a ter um tom de humilhação. Por diversas vezes fui chamado de incompetente na frente da minha equipe", diz.

Após ser demitido, há dois anos, Jorge entrou com uma ação na Justiça por danos morais. Em primeira instância, conseguiu indenização de 10 000 reais. A companhia recorreu e, com nova decisão favorável a Jorge, no ano passado, o valor acabou pulando para 25 000 reais.

A história de Jorge é um típico caso de assédio moral ou terror psicológico no ambiente de trabalho. Dados do Ministério do Trabalho revelam que o número de denúncias no Estado de São Paulo quase triplicou nos últimos quatro anos, passando de 78 para 216 ações judiciais.

Um levantamento feito pela advogada trabalhista Sylvia Romano mostra que um terço da população economicamente ativa já sofreu algum tipo de assédio durante o trabalho no Brasil. A pressão por resultados e a competição acirrada no mundo corporativo são os principais fatores do aumento da incidência de casos.

Com a maior ocorrência de ações na Justiça, as empresas passaram a dar mais atenção ao assunto. Recentemente foi assinado em São Paulo um acordo entre bancos e sindicatos para reduzir casos de assédio moral nas instituições financeiras. O tipo mais comum de assédio é aquele em que o chefe ofende um subordinado.


As maiores vítimas são as mulheres, correspondendo a 70% dos casos, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). As vítimas estão distribuídas por todas as faixas etárias, com uma leve concentração de casos em profissionais que têm entre 45 e 55 anos.

"Esses são considerados ultrapassados ou, por ter salários altos, acabam recebendo ameaças de que podem ser substituídos por profissionais que ganhem menos", diz Sylvia.

Impacto na carreira

Se você acredita ser vítima de assédio no trabalho, é preciso avaliar bem o cenário antes de tomar qualquer medida.

Embora seja uma ofensa pessoal inaceitável, nem sempre o caminho da denúncia é o melhor para a carreira. Isso porque há consequências para a reputação do profissional, ainda que ele tenha razão perante a lei.

Especialistas no assunto e headhunters recomendam cautela na hora de mover uma ação judicial contra a companhia. Em primeiro lugar, deve- se avaliar se o assédio moral pode ser comprovado para a Justiça. Segundo Roberto Heloani, advogado e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), para que um processo judicial se justifique, é preciso tornar evidentes os problemas psicológicos originados no ambiente de trabalho devido ao assédio.

Outro ponto é verificar se existe uma situação de perseguição e humilhação repetitiva. O ideal é evitar que a situação chegue ao extremo. Como se faz isso? "Impondo limites desde o início", diz Mariá Giuliese, sócia-diretora da Lens e Minarelli, empresa de recolocação de executivos.

"Se o chefe o desqualifica, diga numa conversa informal que se sentiu mal com a situação", diz. Quanto menos a pessoa precisar levar o problema à Justiça, melhor. "Sempre traz algum prejuízo à vítima ", diz Mariá.


O medo de retaliações fez com que a auditora paulistana R.M., de 34 anos, optasse por não entrar com ação contra seu chefe. Ela trabalhava numa das principais consultorias do país quando um novo gestor assumiu a área em que atuava. Além de gritar com toda a equipe, ele costumava falar abertamente que não gostava de dar explicações e chamava as pessoas de lixo.

"Até que um dia eu estava num cliente e ele jogou uma pasta em cima de mim", lembra. Sua primeira providência foi falar com um dos sócios e expor a situação. Ele não acreditou na história.

Duas semanas depois, R.M. pediu demissão. "Foi um baque, porque trabalhar lá sempre foi meu grande sonho", conta. Procurar canais dentro da empresa, como a ouvidoria, pode ser uma alternativa.

"Desde que esse órgão funcione de fato", diz o coach Silvio Celestino, de São Paulo, que observa que, além das ouvidorias serem burocráticas, em muitos casos elas acabam tendo como integrante o próprio gestor que comete o assédio. Manter o sigilo é uma preocupação que toda pessoa deve ter. "Não se deve falar com os colegas, nem colocar no currículo ou mencionar o assunto numa entrevista de emprego", diz Silvio.

Uma dica é requerer segredo de Justiça ao processo, uma vez que se trata de fatos que possam causar constrangimento à pessoa. As empresas pesquisam informações sobre o candidato e podem se deparar com o processo.

O maior risco é a forma como o recrutador vai interpretar a história. "Mesmo que o candidato à vaga comprove ter razão, ele corre o risco de ser visto como um problema", afirma Silvio.

Se o assunto for inevitável durante uma entrevista de emprego, existe uma maneira adequada de abordá- lo. "Não saia dizendo que processou determinada firma", diz Marcelo, da Michael Page.

"Apenas aponte uma situação que o desagradou e pela qual você não deseja passar novamente." Pode ser que essa atitude o elimine frente aos concorrentes, porém, Marcelo argumenta: "Será que vale a pena entrar numa organização desse tipo?". A escolha é sua.

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São Paulo - Há três anos, o acreano Jorge da Silva Tavares, hoje com 35, era vendedor da Renosa, fabricante da Coca-Cola em Mato Grosso. Lá, foi vítima de assédio moral . A empresa permitiu que a equipe comercial fosse submetida a um ritual de humilhação que consistia em dar semanalmente um troféu ao funcionário de pior desempenho.

Tudo ocorria na frente de todos os demais. "A coisa começou na base da brincadeira", conta Jorge. "O problema foi quando a situação passou a ter um tom de humilhação. Por diversas vezes fui chamado de incompetente na frente da minha equipe", diz.

Após ser demitido, há dois anos, Jorge entrou com uma ação na Justiça por danos morais. Em primeira instância, conseguiu indenização de 10 000 reais. A companhia recorreu e, com nova decisão favorável a Jorge, no ano passado, o valor acabou pulando para 25 000 reais.

A história de Jorge é um típico caso de assédio moral ou terror psicológico no ambiente de trabalho. Dados do Ministério do Trabalho revelam que o número de denúncias no Estado de São Paulo quase triplicou nos últimos quatro anos, passando de 78 para 216 ações judiciais.

Um levantamento feito pela advogada trabalhista Sylvia Romano mostra que um terço da população economicamente ativa já sofreu algum tipo de assédio durante o trabalho no Brasil. A pressão por resultados e a competição acirrada no mundo corporativo são os principais fatores do aumento da incidência de casos.

Com a maior ocorrência de ações na Justiça, as empresas passaram a dar mais atenção ao assunto. Recentemente foi assinado em São Paulo um acordo entre bancos e sindicatos para reduzir casos de assédio moral nas instituições financeiras. O tipo mais comum de assédio é aquele em que o chefe ofende um subordinado.


As maiores vítimas são as mulheres, correspondendo a 70% dos casos, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). As vítimas estão distribuídas por todas as faixas etárias, com uma leve concentração de casos em profissionais que têm entre 45 e 55 anos.

"Esses são considerados ultrapassados ou, por ter salários altos, acabam recebendo ameaças de que podem ser substituídos por profissionais que ganhem menos", diz Sylvia.

Impacto na carreira

Se você acredita ser vítima de assédio no trabalho, é preciso avaliar bem o cenário antes de tomar qualquer medida.

Embora seja uma ofensa pessoal inaceitável, nem sempre o caminho da denúncia é o melhor para a carreira. Isso porque há consequências para a reputação do profissional, ainda que ele tenha razão perante a lei.

Especialistas no assunto e headhunters recomendam cautela na hora de mover uma ação judicial contra a companhia. Em primeiro lugar, deve- se avaliar se o assédio moral pode ser comprovado para a Justiça. Segundo Roberto Heloani, advogado e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), para que um processo judicial se justifique, é preciso tornar evidentes os problemas psicológicos originados no ambiente de trabalho devido ao assédio.

Outro ponto é verificar se existe uma situação de perseguição e humilhação repetitiva. O ideal é evitar que a situação chegue ao extremo. Como se faz isso? "Impondo limites desde o início", diz Mariá Giuliese, sócia-diretora da Lens e Minarelli, empresa de recolocação de executivos.

"Se o chefe o desqualifica, diga numa conversa informal que se sentiu mal com a situação", diz. Quanto menos a pessoa precisar levar o problema à Justiça, melhor. "Sempre traz algum prejuízo à vítima ", diz Mariá.


O medo de retaliações fez com que a auditora paulistana R.M., de 34 anos, optasse por não entrar com ação contra seu chefe. Ela trabalhava numa das principais consultorias do país quando um novo gestor assumiu a área em que atuava. Além de gritar com toda a equipe, ele costumava falar abertamente que não gostava de dar explicações e chamava as pessoas de lixo.

"Até que um dia eu estava num cliente e ele jogou uma pasta em cima de mim", lembra. Sua primeira providência foi falar com um dos sócios e expor a situação. Ele não acreditou na história.

Duas semanas depois, R.M. pediu demissão. "Foi um baque, porque trabalhar lá sempre foi meu grande sonho", conta. Procurar canais dentro da empresa, como a ouvidoria, pode ser uma alternativa.

"Desde que esse órgão funcione de fato", diz o coach Silvio Celestino, de São Paulo, que observa que, além das ouvidorias serem burocráticas, em muitos casos elas acabam tendo como integrante o próprio gestor que comete o assédio. Manter o sigilo é uma preocupação que toda pessoa deve ter. "Não se deve falar com os colegas, nem colocar no currículo ou mencionar o assunto numa entrevista de emprego", diz Silvio.

Uma dica é requerer segredo de Justiça ao processo, uma vez que se trata de fatos que possam causar constrangimento à pessoa. As empresas pesquisam informações sobre o candidato e podem se deparar com o processo.

O maior risco é a forma como o recrutador vai interpretar a história. "Mesmo que o candidato à vaga comprove ter razão, ele corre o risco de ser visto como um problema", afirma Silvio.

Se o assunto for inevitável durante uma entrevista de emprego, existe uma maneira adequada de abordá- lo. "Não saia dizendo que processou determinada firma", diz Marcelo, da Michael Page.

"Apenas aponte uma situação que o desagradou e pela qual você não deseja passar novamente." Pode ser que essa atitude o elimine frente aos concorrentes, porém, Marcelo argumenta: "Será que vale a pena entrar numa organização desse tipo?". A escolha é sua.

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