Opinião: quem é o responsável por fraudes com maquininhas de cartão? Comerciantes ou credenciadoras?
Decisão recente do TJSP reflete um movimento crescente para limitar a responsabilização das credenciadoras em casos de fraude, reconhecendo que o papel dos comerciantes na prevenção de riscos
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Publicado em 23 de dezembro de 2024 às 15h00.
Autores: Bianca Roder, Bruna Barbosa e Gisele de Assis, advogadas especialistas em Meios de Pagamento pelo asbz
Em recente julgamento 1003268-55.2023.8.26.0126, a 14ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo ( TJSP ) reforçou o entendimento de que credenciadoras de maquininhas de cartão não têm responsabilidade irrestrita por fraudes envolvendo seus terminais.A decisão, que manteve a improcedência de uma ação indenizatória, destaca a importância de comerciantes adotarem medidas diligentes para prevenir prejuízos em suas operações.
O caso envolvendo uma rede de hotéis
O caso envolveu uma rede de hotéis que, após identificar uma queda expressiva no faturamento, descobriu que funcionários desviaram valores por meio de manipulação das maquininhas de cartão. A fraude consistia em passar o cartão do cliente em um terminal pessoal dos funcionários e simular transações na maquininha do hotel, estornando-as logo em seguida.O prejuízo ultrapassou meio milhão de reais.
Apesar de a fraude ter sido praticada internamente por seus próprios funcionários, a rede de hotéis buscou responsabilizar a credenciadora, alegando falta de suporte para identificar o esquema. Em sua defesa, a credenciadora demonstrou que oferecia ferramentas de controle e relatórios capazes de indicar inconsistências e que a fiscalização cabia ao próprio estabelecimento comercial.
Decisão judicial: responsabilidade e controle interno
Na sentença de primeira instância, o juiz afastou a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, considerando a relação entre as partes como de fornecimento de insumos. O magistrado também concluiu que a fraude decorreu da falta de controle interno da rede de hotéis, e não de qualquer falha nos serviços da credenciadora.A sentença destacou ainda que os relatórios que poderiam ter apontado as fraudes estavam disponíveis para consulta, mas não foram utilizados de maneira eficaz.
A 14ª Câmara de Direito Privado do TJSP confirmou integralmente a decisão, destacando que “não houve qualquer falha nas transações realizadas através dos terminais disponibilizados” e que “os Hotéis Autores não comprovaram ter agido com a diligência necessária a quem administra uma rede de hotéis”. O Tribunal também enfatizou que os hotéis não monitoraram adequadamente se os pagamentos dos clientes eram efetivamente registrados nos caixas da empresa.
Tendências no judiciário e impactos no setor
Essa decisão reflete um movimento crescente no Judiciário de limitar a responsabilização das credenciadoras em casos de fraude, reconhecendo que os comerciantes têm um papel essencial na prevenção de riscos. Essa tendência, que se alinha a entendimentos recentes do Superior Tribunal de Justiça ( STJ ), sinaliza um novo olhar sobre a dinâmica das responsabilidades no ecossistema de pagamentos,reforçando um modelo mais equilibrado e eficaz para lidar com fraudes e outras irregularidades.
Atribuir responsabilidades proporcionais a cada agente – comerciantes, credenciadoras e consumidores – pode trazer maior equilíbrio às relações contratuais, incentivando a adoção de medidas preventivas mais robustas por parte dos estabelecimentos comerciais. Para o setor de credenciamento, essa diretriz judicial reduz o risco de interpretações que imponham a essas empresas uma espécie de "seguro universal" contra fraudes, o que poderia impactar negativamente a sustentabilidade econômica do modelo de negócios.
Prevenção de fraudes e segurança jurídica
Além disso, ao limitar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em relações entre empresas que atuam como parceiras comerciais, a decisão contribui para uma maior segurança jurídica no mercado.Isso permite que credenciadoras invistam mais em tecnologias de segurança e inovação, sem receio de enfrentar passivos desproporcionais em situações de má gestão ou falta de controle interno de seus clientes.
Por fim, o julgamento ressalta a necessidade de uma governança sólida e de boas práticas de gestão nos estabelecimentos comerciais. Hotéis, restaurantes, postos de gasolina, e-commerces e outros negócios que utilizam maquininhas de cartão como parte essencial de suas operações devem encarar a prevenção de fraudes como uma prioridade estratégica, integrando-a aos processos internos.
A decisão do Judiciário reflete um avanço no reconhecimento da corresponsabilidade entre os participantes do sistema de pagamentos,promovendo um setor mais equilibrado, resiliente e melhor preparado para enfrentar os desafios crescentes na mitigação de riscos e na segurança das transações financeiras .
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