O que o mercado automotivo precisa consolidar para a transformação digital
Quanto menos exposição o time de vendas tiver ao processo, mais maduro e transformador o processo será
Bússola
Publicado em 12 de junho de 2022 às 17h00.
Que a transformação digital também chegou ao mercado automotivo — e o quanto isso é necessário —, ninguém tem dúvidas. Números não faltam para mostrar que a corrida pela digitalização é uma realidade. O levantamento do Índice Cesar de Transformação Digital (ICTd) junto com o Automotive Business registrou uma maturidade de 66,15% no ambiente de transformação digital do setor. E, para mais de 60% dos participantes da pesquisa, a digitalização faz parte do planejamento estratégico.
Segundo uma pesquisa da Accenture, as Fabricantes Originais de Equipamentos (OEMs) podem aumentar o faturamento em até 6,5%, graças ao suporte da tecnologia para modificar os ecossistemas produtivos. E ressalta que os players que não se digitalizarem correm o risco de perder até 15% de sua lucratividade por deixar passar oportunidades.
Dito isto, será que estamos depositando nossos esforços no lugar certo? Quando se fala em transformação digital, a primeira coisa que vem à cabeça é: mais sistemas, mais telas, mais tecnologia. E assim, vamos empilhando soluções em torno de um contexto que já é intrinsecamente complicado.
Será que a transformação digital significa necessariamente sair da era do papel para entrar na era de múltiplos sistemas que não se comunicam?
Hoje, um vendedor ou operacional de uma empresa de veículos precisa lidar com inúmeras aplicações diferentes — app do banco, sistema de CRM, ERP (Enterprise Resource Planning, ou sistema de gestão integrado) para lidar com estoque, sistema para gerenciar documentação, sistema de contrato, sistema de emissão de nota fiscal, sistema para gerenciar anúncios digitais, marketplace, atendimento e tantos outras. É um vai e vem de diferentes telas que acaba exigindo literalmente um treinamento de boas-vindas para que os novos funcionários não se percam, contando quase sempre com equipes maiores do que realmente as lojas precisam.
A transformação digital do mercado de veículos precisa vir acompanhada do sumiço do operacional, e não ser a extensão dele. O exemplo do que aconteceu no varejo com o cartão de crédito, parece ser uma ótima provocação. Há alguns anos, comprar com o cartão de crédito exigia que o cliente fosse presencialmente à loja. Ao chegar lá, o vendedor ligava na operadora do cartão, checava com o atendimento se o cliente tinha crédito e se poderia liberar a compra; colocava o cartão na maquininha de plástico, acompanhada de um papel carbono e tirava uma cópia física do cartão, que seria enviada por malote para o banco.
Uma década ou duas depois, o cliente chega na loja, encosta o cartão na maquininha e o comprovante da compra é impresso. Ir à loja é opcional; porque, da tela do seu celular, tudo isso já é realidade, 24 x 7.
O que mudou no processo? Na prática, nada. Para falar a verdade, ele ficou até mais extenso. Ao encostar o cartão na maquininha, ou finalizar a compra em um check-out digital, em tempo real é rodado um antifraude, entra na jogada um adquirente, às vezes, um subadquirente, um emissor ou um banco, uma bandeira. Milhares de informações são cruzadas e trocadas em milissegundos.
A mágica, na verdade, é uma ilusão. Todo esse operacional sumiu da frente do vendedor e do cliente, que têm a sensação de tudo acontecer com um toque de mágica.
Transformar digitalmente uma operação não quer dizer torná-la mais complexa para quem opera.
Passa necessariamente por uma transformação anterior do ecossistema que atende o segmento. Sistemas que não se comunicam, processos expostos e necessidade de treinamento quase infinito são coisas que precisam ficar no passado.
Para achar o caminho da inovação é preciso muito mais do que contratar um software. É preciso montar um ecossistema que se integra e se comunica em tempo real. Tem que rever processo, visão de mundo dos times; colocar de fato a experiência do cliente no centro. O software não faz nada sozinho, ele não é a bala de prata. Mais transformação, menos operacional.
*Orlando Seabra é CEO e fundador da Credere, fintech especializada na venda financiada de veículos.
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