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Empresa com alma

Presidente do Instituto ETCO analisa como as preocupações sociais, éticas e de governança das empresas estão ajudando a renovar o capitalismo

Trabalho: amadurecimento da ação empresarial não pode se restringir ao formalismo sem conteúdo, que aponta a missão e valores apenas em um quadro (Compassionate Eye Foundation/Steven/Getty Images)

Trabalho: amadurecimento da ação empresarial não pode se restringir ao formalismo sem conteúdo, que aponta a missão e valores apenas em um quadro (Compassionate Eye Foundation/Steven/Getty Images)

Victor Sena

Victor Sena

Publicado em 26 de outubro de 2020 às 12h43.

Última atualização em 26 de outubro de 2020 às 14h40.

A Constituição Federal, no artigo 1º, define a livre iniciativa como um dos fundamentos da República, garantindo, assim, que as empresas podem atuar no mercado, agindo livremente dentro dos parâmetros legais. Nesse artigo inicial, no mesmo inciso IV, estão previstos os valores sociais do trabalho demonstrando que hão de ser respeitados os direitos dos trabalhadores (art. 7º).

Nesses parâmetros constitucionais, trabalho e capital são completados pelos direitos do consumidor, enfeixando o tripé empreendedor: capital, emprego e consumo, formando os chamados stakeholders (investidores, clientes, funcionários, fornecedores, comunidade). Por esse conceito, criado pelo filósofo americano Robert Edward Freeman, o sucesso da empresa depende da geração de valor para esses agentes e, complementando, esse objetivo deve também contemplar o cumprimento das obrigações legais, fiscais e ambientais.

Está moldada a estrutura que vem sendo cada vez mais exigida. Uma empresa, para alcançar o lucro, deve respeitar seus stakeholders, caso contrário, seus resultados serão impactados negativamente. Entre as duas pontas, acionista e consumidor, existe um conjunto de atitudes que deve constituir a formação de princípios e valores que orientam a ação empreendedora. É certo que a sociedade está atenta para posturas que englobam regras de convivência ética.

Interessante notar que programas de integridade, combate aos desvios de conduta e corrupção, promoção da equidade das minorias, garantia de segurança psicológica no ambiente de trabalho, afastando assédios e viabilizando a participação e a interação dos colaboradores, o cumprimento das leis e das obrigações regulamentares, fiscais e ambientais, assegurando os direitos do consumidor, são comportamentos que se entrelaçam, formando os pilares que constituem as bases da livre iniciativa moderna, que não se enquadra no conceito de liberalismo econômico clássico e sim, cada vez mais, nos indicadores ESG.

O amadurecimento da ação empresarial não pode se restringir ao formalismo sem conteúdo, que aponta a missão e valores em um quadro; precisa ser exercitado, construído dia a dia, exigindo uma dimensão ética efetiva.

Vale dizer que a cultura organizacional deve evoluir, estimulando o respeito, propósitos e também as habilidades comportamentais, afastando antigos ditados como “manda quem pode, obedece quem tem juízo” ou “bom cabrito não berra”, que devem ser substituídos por opinar para inovar e não sofrer calado injustiças ou abusos.

Nesse contexto, as empresas muito exigentes no cumprimento de metas são questionadas para criar ambientes mais harmônicos e participativos.

É verdade que, na implementação de padrões de conduta e de programas de integridade, pode haver radicalismos, o que é natural, mas, com a experiência, o equilíbrio vai sendo alcançado, O certo é que nunca a gestão de pessoas e procedimentos foi tão exigida.

E, com a pandemia, uma verdadeira revolução está em curso, gerando desafios, com a aceleração de projetos de home office, flexibilizando horários, enfim, reestruturando as instituições e as relações interpessoais.

Todas essas mudanças estão impulsionando a superação de posturas dogmáticas para atitudes cooperativas: da judicialização para a mediação e composição de conflitos; do conservadorismo para o incentivo constante da inovação; da hierarquia rígida para a valorização da participação com responsabilidade.

Esse é o sentido da evolução: o lucro a qualquer preço não é mais aceitável e só os meios físicos não garantem resultados econômicos e financeiros. É preciso mais.

Empresas com desígnio, com alma que, além dos produtos que vendem ou dos serviços que oferecem, expressa-se na experiência de cada colaborador, em operar não somente dentro da lei, mas dentro da ética para alcançar as metas almejadas.

As pessoas físicas sendo motivadas para se integrarem na construção da identidade e alcance dos objetivos da pessoa jurídica. Lucro, mas com a valorização das pessoas, que desejam trabalhar onde sintam orgulho. A realidade indica que esses conceitos estão renovando o capitalismo.

*Edson Vismona é advogado, presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO) e do  Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade (FNCP). É também fundador e atual presidente do conselho deliberativo da Associação Brasileira de Ouvidores/Ombudsman — ABO. Foi secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo (2000/2002).

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