Clima favorável à reforma tributária: mobilização nacional e crise fiscal
A reforma foi tema da live de hoje, que reuniu as principais autoridades envolvidas na formulação das propostas em discussão no Congresso
Mariana Martucci
Publicado em 8 de setembro de 2020 às 21h03.
O Brasil parece mais amadurecido e preparado para implantar uma reforma tributária que traga simplificação, transparência e justiça, melhorando o ambiente de negócios e atraindo investimentos. Apesar de alguns impasses, o momento nunca foi tão favorável para a aprovação da reforma, com ampla mobilização nacional em torno do tema e o senso de urgência diante da grave situação fiscal do país.
Esse foi o cenário traçado pelos participantes da live promovida nesta terça-feira, 8, pela Bússola, para debater os caminhos da reforma tributária. Estiveram presentes no webinar Armando Monteiro, ex-senador e ex-ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;senador Roberto Rocha, presidente da Comissão Mista da Reforma Tributária; deputado federal Aguinaldo Ribeiro, relator da Reforma Tributária; Vanessa Canado, assessora especial do Ministério da Economia; e Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal.
Armando Monteiro afirmou logo na abertura do debate que, há anos, assiste a vários ensaios frustrados sobre reforma tributária, mas essa o deixa otimista por conta das exigências do atual contexto histórico.
“Talvez o agravamento da crise fiscal do Brasil dê sentido agora a uma urgência dessas agendas inconclusas de reformas. Estou otimista. Há uma maior disposição reformista no Congresso. As duas PECs (45 e 110) foram subscritas por importantes lideranças do Congresso Nacional. O processo histórico de debate terminou provocando um alinhamento conceitual no parlamento, todas convergem para o que eu chamo de ‘IVA da nova geração’, de base ampla, que também prevê credito amplo e que contempla os bens intangíveis”, resumiu.
Monteiro acredita que o grave problema fiscal brasileiro, agravado pela pandemia só será resolvido pela via do crescimento. E, segundo ele, nada melhor do que uma reforma tributária para melhorar o ambiente de operação das empresas, estimular os investimentos e melhorar a produtividade da economia.
O ex-ministro alertou, porém, para alguns pontos sensíveis que ainda precisam ser resolvidos, como por exemplo, o impasse entre União e estado sobre os fundos de desenvolvimento regional. “Os estados querem uma fonte segura de recursos e a União só se dispõe a vincular recursos que são instáveis, como os royalties, ou desvinculação de fundos federais. Outro ponto de atenção seria que os grandes municípios não querem abrir mão da sua base tributária atual. É impossível construir um IVA amplo mantendo essa base de competência dos municípios”, afirmou.
Sobre estas questões, a assessora especial do Ministério da Economia, Vanessa Canado, afirmou que “é necessário ressignificar essa demanda dos estados porque a União está com uma condição bastante diferente daquela de alguns anos atrás. Temos hoje seis fundos de desenvolvimento regional, três deles com alocação orçamentária não executada desde 2017, por desinteresse do setor privado nestes recursos, e os três constitucionais, com os recursos do IPI e do Imposto de renda, que são os que hoje têm mais projetos executados (cerca de R$ 13 bilhões)”.
Vanessa explicou que o governo federal está conversando com os estados sobre a parcela do IVA relativa à alíquota da União, que seria composta de PIS e Confins (que passaria a ser a CBS) e IPI. Segundo a assessora, mais da metade do IPI já vai para os fundos de desenvolvimento regional e os fundos de participação. A CBS vai toda para a previdência. E ademais, alocar uma parcela do IVA federal para o fundo de desenvolvimento regional, igual ao que os estados querem, seria muito complicado porque a União teria que cobrar tributos de outra base, já que a base de consumo já está comprometida. Teria que ser a base de renda, mas grande parte do imposto de renda já é compartilhado.
Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal, ressaltou que estudos estimam que, em 15 anos, os resultados da reforma proposta pela PEC 45 podem elevar o PIB potencial do Brasil em 20%, considerando somente os efeitos diretos. “Esse crescimento gera recursos, gera receitas para a União, que abre espaço fiscal que pode ser usado na negociação com os estados”, alertou.
Em suas participações no debate, o senador Roberto Rocha, presidente da Comissão Mista da Reforma Tributária, e o relator do projeto, deputado federal Aguinaldo Ribeiro, fizeram questão de reforçar que o calendário está sendo respeitado, ao mesmo tempo em que nada está sendo deixado para trás.
“Nós seguimos nosso calendário normalmente, com os debates necessários.Ninguém pode se queixar da ausência de debate sobre todos os pontos. Somente no Senado, foram mais de 250 horas de audiências públicas na CCJ, além de diversos encontros e audiências mistas. Estamos com o seguinte calendário: chegar ao fim do mês de setembro lendo o relatório do deputado Aguinaldo, depois teremos o período de vistas coletivas de uma semana e no dia 07 de outubro fazer a votação na Comissão Especial”, afirmou Roberto Rocha.
O deputado Aguinaldo Ribeiro garante que o brasileiro não sabe o quanto paga de impostos porque o sistema é cumulativo e pouco transparente. “O nosso sistema é extremamente complexo. Nossa ambição é fazer com que o cidadão saiba o quanto paga de imposto e o quanto desse imposto volta em benefício dele, com total transparência. Precisamos construir juntos um sistema tributário simplificado, transparente e com justiça tributária e segurança jurídica. Todos nós, o Parlamento, o governo, a sociedade e os entes federados. Uma convergência que conduza à progressividade: quem recebe menos paga menos, quem recebe mais paga mais”, ponderou.