"Todo mundo quem?": um perfil de brasileiros que não usam redes sociais
Com propósito de explorar o "olho a olho", brasileiros deixam de lado o Facebook, o Instagram e o WhastApp
Clara Cerioni
Publicado em 7 de março de 2019 às 06h00.
Última atualização em 7 de março de 2019 às 06h00.
São Paulo — No ano passado, uma mobilização de jovens no Reino Unido e nos Estados Unidos chamou a atenção para o impacto das redes sociais no cotidiano dos usuários.
Com um movimento nomeado deLogged Off Generation, o grupo promoveu, em poucos meses, uma evasão em massa do Facebook e estimulou a debandada dos usuários de outras redes sociais, como Instagram, WhatsApp e Snapchat.
A tendência, que parecia se limitar a sociedades com índices elevados de desenvolvimento e acesso democrático à internet, não demorou a se espalhar para outros países, como o Brasil.
Mesmo com a influência da internet nas eleições presidenciais do ano passado, da oferta de vagas de emprego e das publicidades estarem todas voltadas ao digital hoje em dia, ainda há uma parcela de brasileiros que escolheu não ter acesso a essas informações.
EXAME obteve com exclusividade os resultados da pesquisa investigativa "Todo Mundo Quem?", que traça um novo perfil de quem decidiu abandonar o uso das redes sociais para se dedicar ao "olho a olho".
Idealizado e conduzido pelos pesquisadores Filipe Techera e Luiza Futuro, o estudo identificou um novo perfil emergente de brasileiros, que foram chamados de Nativos Sociais.
Essas são as pessoas que não enfrentam as barreiras de acesso à internet, relacionadas à má distribuição de renda, ineficiência do sistema educacional e ao analfabetismo digital, mas optam por ficar fora das redes sociais.
"Elas estão cansadas de viver um tempo em que há notificações urgentes, que não são reais, e se envolver em relações construídas com base na internet", conta Luiza Futuro.
Os dados revelam que quatro em cada dez não usuários de redes sociais estão abaixo dos 45 anos. Além disso, cinco em cada dez são da classe social C (com renda mensal entre 4 e 10 salários mínimos).
De acordo com Filipe Techera, esse último resultado mostra como o senso comum, de que pessoas com rendas menores não têm acesso à internet nos grandes centros urbanos, está equivocado.
Um dos entrevistados para a pesquisa, de 31 anos e morador de Salvador, relatou que se incomoda com quem sempre está mexendo no celular.
"Se eu estou num lugar e as pessoas estão o tempo inteiro de cabeça baixa dividindo espaço contigo, eu sempre pontuo, porque realmente me incomoda. Porque de fato é um desrespeito. Cria uma ilusão de conexão", afirmou. Seu nome foi preservado pelos pesquisadores.
O estudo entrevistou mais de 11 mil pessoas, entre 16 e 79 anos, em grandes regiões metropolitanas do país, com o objetivo de mapear o fenômeno comportamental daqueles que não usam nenhuma forma moderna de comunicação.
"Queríamos dar visibilidade a quem não participa de canais oficiais nas redes, porque desde as ações de empresas privadas até as agendas da sociedade civil e dos estados estão sendo pautadas pela internet. Não estamos conversando com os 209 milhões de brasileiros", explica Filipe Techera.
Fonte de informação
Durante as entrevistas, os pesquisadores questionaram os não usuários das redes sociais se havia o sentimento de desinformação. A resposta, segundo eles, foi geral: "o que for importante passará na televisão ou no rádio".
De acordo com o estudo, oito em cada dez entrevistados assistem televisão diariamente e a usam como fonte de informação. Em relação ao rádio, a parcela é de cinco em cada dez não usuários das redes.
"A maior parte das casas que visitamos estava com a TV ligada quando chegamos, mesmo sem ninguém assistindo, quase como uma ambientação sonora. Todos diziam que, se a informação for necessária e relevante, sairá na TV", diz Filipe Techera.
Próximos passos das redes sociais no Brasil
Para Luiza Futuro, as redes sociais devem se tornar um espaço dinâmico, porque a tendência é que cada vez mais brasileiros deixem de usá-las.
"Precisamos ter em mente que existem lugares importantes para crescimento, como o YouTube, o Spotify e o Airbnb. Todas elas são consideradas redes sociais, que têm normas e tendências comprometidas com a qualidade do serviço. A queda do Facebook já está acontecendo e uma onda de conscientização está tomando conta dos usuários", afirma.