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Por trás do recorde de reeleição, emendas podem influenciar eleição para o Congresso em 2026

Cila Schulman vê deputados concorrendo com mais recursos e maiores chances de serem reeleitos e avalia impacto da abstenção nas eleições, e nas pesquisas

Faltam respostas institucionais diante do crescimento da abstenção, que impactam também nas pesquisas eleitorais (Pedro França/Agência Senado)

Publicado em 31 de outubro de 2024 às 14h46.

Atribuídas como um dos pilares para o recorde de reeleição nas eleições municipais de 2024, as emendas parlamentares destinadas a municípios por deputados federais podem implicar também em uma baixa taxa de renovação no Congresso Nacional na eleição de 2026, de acordo com Cila Schulman, CEO do Instituto de Pesquisa Ideia.

Em entrevista ao podcast Eleições 2024 da EXAME, a analista política avalia que, se as chamadas "emendas pix" se mantiverem com a mesma lógica pelos próximos dois anos, os atuais congressistas vão "concorrer com mais recursos e maiores chances de se reelegerem".

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"Eles [deputados] também são os donos do recurso, porque o prefeito também agradece o 'nobre deputado pelo recurso recebido'. Eu vejo uma baixa renovação e uma volta da política tradicional. Mesmo que a gente tenha chamado atenção para o Pablo Marçal, essa foi uma campanha da política tradicional, porque mesmo esses candidatos bolsonaristas, eles já estão na política, já ocuparam cargos", afirma.

Ao todo, 3.038 prefeitos buscaram se reeleger nas eleições municipais que terminaram no último domingo, 27 de outubro. Após o segundo turno, o saldo total dos que obtiveram sucesso nas urnas foi de 2.460 governantes, de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Um levantamento feito pelo jornal O Globo, mostrou que dos 112 municípios que mais receberam as emendas pix e onde o prefeito tentou um segundo mandato, 105 saíram vitoriosos, um índice de 93,7%.

O que são as emendas pix e o impacto na eleição de 2024

Criadas em 2019, essas emendas são um ummecanismo pelo qual verbas federais são repassadas diretamente aos municípios pelo Congresso com a dispensa de vários critérios técnicos. O montante enviado também pode ser gasto pelos chefes do Executivo municipal livremente. Em agosto deste ano, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino determinou que o Congresso Nacional e o governo federal criem regras para dar mais transparência ao mecanismo, que é criticado pela ausência de critérios.

Mas o impacto das emendas no recorde de reeleição já era previsto por especialistas desde o início da campanha eleitoral, como apontou a EXAME com base em um estudo da Arko Advice e em entrevistas com especialistas. A análise, à época, era de que a alta aprovação dos prefeitos na maioria das capitais e os recursos enviados diretamente por deputados e senadores para os munícipes de suas bases, davam fôlego para a busca por um segundo mandato.

Cila também lembra que, neste pleito, as candidaturas estavam abastecidas por um fundo eleitoral volumoso de R$ 4,9 bilhões.

"E com as emendas e o fundo eleitoral gordo, você vê que nessa campanha não havia uma necessidade de ir atrás de empresários para contribuírem com as campanhas. Claro que o nível de recurso é proporcional ao nível de eleitores de uma cidade, mas você tem ali uma capacidade dos partidos políticos de tomarem uma decisão e bancarem seus candidatos independentemente de outros recursos. No Brasil, dois anos são muita coisa, mas hoje eu acredito que terá mais políticos concorrendo com mais recurso e maiores chances de se reelegerem", explica a CEO do Ideia.

Abstenção tem sido um fenômeno crescente

Outra hipótese que tem sido aventada para apontar o recorde de reeleição neste ano é alta taxa de abstenção.

Segundo o TSE, a taxa dos que não compareceram às urnas no segundo turno das eleições deste ano foi de 29,26%, a segunda maior desde 2000. Até então a maior havia sido registrada em 2020, com 29,5%, ano  em que o Brasil vivia os efeitos da pandemia de covid-19.

A CEO do Instituto ideia credita o recorde ao fato de que no Brasil, apesar de constitucionalmente o voto ser obrigatório, na prática, ele não é por causa da "facilidade que o eleitor tem para justificar", principalmente após a pandemia.

Além disso, em alguns casos, a multa de R$ 3,51 para quem não exerce seu direito ao voto é inferior ao custo de deslocamento, por exemplo em cidades que não tem transporte coletivo gratuito aos domingos. Em outros casos, pesam também características locais de cada pleito. Em cinco capitais, por exemplo, o número dos eleitores que se abstiveram ou votaram nulo ou branco foi superior ao total de votos que teve o candidato vencedor.

É o caso do prefeito reeleito Eduardo Paes (PSD) no Rio de Janeiro. Embora reconduzido ao cargo no primeiro turno com 60,47% dos votos válidos, a soma dos que não foram votar ou não votaram nele ou em seus adversários é de 1.930.202 contra 1.861.856 votos que Paes recebeu.

"O eleitor percebia um favoritismo tão grande do Eduardo Paes, que talvez ele olha e fala que o voto dele não vai importar. Mas tem o fenômeno de que nenhum dos candidatos representa o eleitor", comenta Cila, em referência ao que pode ter ocorrido em São Paulo, Belo Horizonte, Goiânia e Porto Alegre, onde o número de abstenção voto branco e nulo é maior do que o do vencedor.

A analista política avalia, contudo, que ainda faltam respostas institucionais diante do crescimento da abstenção e que os institutos de pesquisa têm se preocupado com a questão em suas análises sobre as corridas eleitorais pelo país.

"Eu lembro que na eleição de 20222, quando trouxemos essa discussão, teve muita crítica, como se o instituto de pesquisa quisesse justificar o resultado. Mas não era, é porque realmente é um fenômeno que temos que olhar. E tem também uma descrença no sistema eleitoral. Essa é uma questão que ficou depois da tentativa de descredibilizar o sistema eleitoral do país, isso é uma tragédia mesmo e há um trabalho que precisa ser feito para recuperar", finaliza Cila Schulman.

Acompanhe tudo sobre:Eleições 2024Política

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