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Intervenção não precisa continuar se estratégia for mantida, diz general

À frente há quatro meses do modelo mais ousado de combate à violência no Estado nos últimos anos, Braga Netto evitou falar sobre sensação de segurança

Walter Braga Netto: "Tem um plano de gestão, um plano de transição e legado, tem um plano de reestruturação das forças de segurança" (./Reuters)
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Reuters

Publicado em 21 de junho de 2018 às 19h55.

Última atualização em 22 de junho de 2018 às 14h41.

Rio de Janeiro - Os índices de criminalidade já começaram a reagir de forma consistente à atuação militar, e a intervenção federal na área de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro não precisa continuar no próximo governo desde que seja cumprido o plano elaborado, disse à Reuters o interventor designado por Brasília, general Walter Braga Netto.

Na semana passada, Braga Netto entregou ao presidente Michel Temer um planejamento estratégico para a intervenção, com medidas que ficarão de legado da gestão militar na área de segurança.

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"Não precisa continuar", disse Braga Netto em entrevista à Reuters, nesta quinta-feira, em seu gabinete no Palácio Duque de Caxias, sede do Comando Militar do Leste.

"Tem um plano de gestão, um plano de transição e legado, tem um plano de reestruturação das forças de segurança. Se o planejamento que nós deixarmos... se quem assumir mantiver o planejamento, não houver indicações políticas ou casuísticas não há necessidade da intervenção (continuar)", acrescentou.

O decreto da intervenção está previsto para terminar em 31 de dezembro deste ano.

Para o general é uma ilusão achar que as Forças Armadas são capazes de acabar completamente com a violência, e dizer que os militares são a solução do país "é o desespero de um país que está sem valores".

"Criança não respeita professor, não respeita pai. Temos excessos de direitos e poucas obrigações. Começa a surgir uma instituição com grande credibilidade, como as Forças Armadas, as pessoas começam a achar que é a salvação da pátria", disse .

"O Brasil precisa se estruturar e não há necessidade de intervenção federal se houver disciplina e vontade política de tocar o que foi planejado", avaliou.

À frente há quatro meses do modelo mais ousado de combate à violência no Estado do Rio de Janeiro nos últimos anos, Braga Netto evitou entrar na discussão da sensação de segurança, por considerá-la filosófica.

O general preferiu lançar mão de estatísticas de criminalidade, que, segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), já mostram uma melhora com a ação do militares. Ele admitiu que não se chegou no esperado ainda, mas ressaltou que "já atingimos vários objetivos".

Os dados mostram que a letalidade violenta (que reúne crimes como mortes em operações, homicídios dolosos, lesão corporal seguida de morte e morte de decorrente da ação policial) teve uma queda de 9,6 por cento entre março e maio deste ano. Os homicídios dolosos caíram 16,7 por cento, roubos de veículos recuaram 18,21 por cento e os roubos de cargas caíram quase 18 por cento no período.

Mas o roubo de rua, cujo alvo principal são os celulares, subiu no período 6 por cento, e o general já solicitou à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para que celulares roubados sejam definitivamente bloqueados e colocados fora de uso a partir do acionamento do IMEI (código de segurança do aparelho).

"Há no imaginário popular uma visão que com a intervenção o crime vai à zero. Isso não se consegue. O que queremos é reduzir os índices e acabar com essa ostensividade que existe."

Sem guerra civil

Apesar dos dados mais positivos, os últimos dias foram de muita violência no Rio de Janeiro. Na véspera da entrevista, um adolescente de 14 anos morreu quando ia para a escola no conjunto de favelas da Maré, na zona norte da capital, vítima de bala perdida. Ali, a polícia, com apoio de alguns equipamentos das Forças Armadas, fez uma operação onde seis suspeitos morreram.

Estatísticas extraoficiais apontam para mais de 100 casos de balas perdidas no Estado este ano.

"Para nós é inconcebível o dano colateral e um tiro que acerta uma criança ou terceiros. Nós só atiramos quando há certeza para outros", afirmou Braga Netto.

Para ele, muitos policiais do Rio de Janeiro estavam na linha de frente, antes da intervenção, com pouco treinamento de tiros. Agora, para participar de uma operação o policial já deu mais de 300 tiros nos estandes de treino, uma quantidade "muito maior" do que era antes da ação das Forças Armadas.

Nesta quinta-feira, as Forças Armadas iniciaram uma outra operação, em favelas do Leme, área nobre da cidade, para combater quadrilhas rivais que tentam controlar os pontos de vendas de drogas nas comunidades do Chapéu-Mangueira e Babilônia.

No começo do mês, supostos criminosos usaram uma mata para fugir de um cerco policial e foram parar no bairro da Urca, onde estão várias unidades da Forças Armadas e até então considerado um dos últimos redutos de tranquilidade na cidade. O confronto chegou a interromper temporariamente a circulação do bondinho do Pão de Açúcar, um dos principais pontos turísticos da cidade, e também o funcionamento do aeroporto Santos Dumont. Ao menos 7 suspeitos morreram nessa ação.

Apesar dessas situações, o general rejeitou a ideia de que o Rio de Janeiro vive uma guerra civil não declarada.

"Não vivemos uma guerra civil, isso é completamente diferente. Eu estive em área de conflito. O que temos é uma violência muito grande. Guerra é outra coisa. Se houvesse guerra, não ia ter cuidado com dano colateral que nós temos."

Marielle

Um dos crimes de maior repercussão ocorridos durante a intervenção --o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista dela, Anderson Gomes -- segue sem solução.

Segundo Braga Netto, ainda faltam provas necessárias para concluir o caso e embasar bem a denúncia ao Ministério Público e à Justiça. "Mesmo que eu tenho suspeito é preciso ter provas, bem firmadas, porque senão podemos acusar alguém e a pessoa ser solta. Trabalhamos na obtenção de provas concretas, mas não temos prazo."

Mesmo com esses casos de violência ainda ocorrendo no Rio de Janeiro, Braga Netto, afirmou que a intervenção federal vai entregar aos próximos governantes locais e nacionais um Estado muito melhor do que agora, na área de segurança

"Com as ações que estão acontecendo, com as aquisições e com chegada de material e volta de agentes, tudo isso, a tendência é só melhorar. Não há dúvida de que vou entregar um Estado melhor para população... a melhora será palpável", frisou.

Eleições

Num cenário de violência e descrédito com os políticos, tem ressurgido em parcelas da população desejo pela volta do autoritarismo, por meio de uma ampla intervenção militar, e se solidificam as simpatias pelo pré-candidato do PSL à Presidência, deputado Jair Bolsonaro, ex-capitão do Exército.

Braga Netto garantiu que as Forças não têm simpatia maior ou predileção por algum candidato. Ele disse já ter se encontrado com vários candidatos ao governo do Estado e à Presidência da República.

"Bolsonaro para mim é um candidato como outro qualquer. Merece meu respeito como os outros candidatos. Caxias disse o seguinte: minha espada não tem partido. Nossa espada não tem partido", disse, referindo-se ao patrono do Exército, Duque de Caxias.

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