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Infraestrutura: confiança sobre investimentos persiste, mas cenário econômico acende sinal amarelo

Expectativa positiva para o mercado foi apontada na 12ª edição do Barômetro da Infraestrutura, estudo da EY e da ABDIB que mostra ainda a infraestrutura social voltando a ganhar espaço na agenda dos investidores

Sem uma reversão da situação fiscal e econômica do Brasil, "é grande a possibilidade de a percepção na próxima edição do barômetro se deteriorar", observa o responsável pelo estudo (Elza Fiúza/Agência Brasil)

Publicado em 15 de janeiro de 2025 às 06h02.

Os gestores, investidores e especialistas que apoiam a estruturação de projetos de infraestrutura preveem para os próximos seis meses um cenário favorável para investimentos no setor brasileiro. É o que revela a 12ª edição do Barômetro da Infraestrutura divulgada nesta quarta-feira, 15.

O estudo mostra que 52,9% desses agentes do mercado apontaram como favorável a promoção de investimentos em infraestrutura no primeiro semestre deste ano.

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A pesquisa é realizada semestralmente pela empresa de consultoria EY com a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (ABDIB) com o objetivo de identificar o ânimo de empresários e especialistas dos setores de infraestrutura sobre os temas que impactam a realização de investimentos, ambiente de negócios e o desenvolvimento de projetos. Ao todo, foram realizadas 353 entrevistas, de forma digital, entre os dias 22 de outubro a 11 novembro de 2024.

O índice positivo segue a tendência já identificada no levantamento anterior, referente ao último semestre do ano passado, quando 52,2% também estavam com boas expectativas.

O dado atual alcançou o melhor resultado das 12 edições da pesquisa, superando em mais de 12 pontos percentuais a média histórica de 40,66%. Esse otimismo reforça o potencial de retomada do setor, mesmo diante de desafios econômicos.

A pesquisa aponta que o cenário global se mostra desafiador para o crescimento econômico. Dentre os obstáculos mencionados, cita o ciclo de juros elevados , que persiste nas economias mundiais, e a intensificação dos conflitos geopolíticos, que potencializa as incertezas.

A EY e ABDIB também acrescentam que a política monetária restritiva impacta diretamente as economias emergentes, resultando em uma maior dificuldade para aquisição de crédito por meio de financiamentos externos, por exemplo.

Em nível local, a maioria dos stakeholders entrevistados (49,3%) avalia que a expectativa de crescimento econômico no próximo semestre está estável, mas caiu o total que se diziam otimista, de 36,4% para 31,7%. Para esses agentes, o principal desafio é a alta dos juros, que coloca um cenário desfavorável para investimentos, como apontam 69,9% dos entrevistados.

A lista de desafios é seguida pela insegurança jurídica-regulatória, apontada por 62%, e a falta de mecanismos de financiamento mais adequados às necessidades do setor, segundo 50,2%. Assim como os obstáculos ao aprimoramento dos investimentos a insuficiência de entidades estruturadoras em atender às demandas de infraestrutura do país (41,3%) e a necessidade de maior participação dos bancos de desenvolvimento no financiamento (31,3%).

O estudo também registrou um ligeiro aumento na proporção de participantes com uma visão desfavorável sobre o cenário de investimentos em infraestrutura , que passou de 18,5% para 20,4%.

Apesar de modesto, esse crescimento interrompeu a sequência de três edições consecutivas de queda nesse indicador, refletindo a influência de incertezas macroeconômicas que ainda preocupam parte dos investidores.

Gustavo Gusmão, sócio da EY na área de Infraestrutura e responsável pelo estudo, explica que a manutenção de boas expectativas para o setor, apesar do receio sobre o cenário econômico, mostra a resiliência do setor de infraestrutura, acostumado, segundo ele, a "momentos de dificuldade".

Com base nas entrevistas com os agentes do mercado, Gusmão observa que projetos de longo prazo e a estruturação avançada de iniciativas, impulsionadas por instituições como o BNDES, a Caixa Econômica Federal e o Fundo de Investimento em Infraestrutura Social (FIIS), tornam os investimentos menos vulneráveis às incertezas econômicas de curto prazo. Além de manterem um pipeline crescente e diversificado.

Embora a situação econômica atual preocupe, o baixo custo de elaboração de projetos frente ao retorno potencial sustenta a confiança dos investidores, observa o executivo. No entanto, se o cenário econômico adverso persistir por mais tempo, pode haver a mudança para uma percepção mais pessimista.

"A nossa percepção é que a tendência, dado [o intervalo de tempo] da pesquisa até hoje, se a situação fiscal, econômica, ainda continuar nebulosa, sem uma sinalização clara de reversão desse quadro, e permanecendo assim por mais dois, três meses, a possibilidade das percepções da próxima edição do Barômetro, que sai no meio do ano, se deteriorar é grande", avalia Gusmão, apontando para um risco.

"O setor é resiliente até certo ponto. Se começar a ficar uma percepção contínua de desconfiança, isso pode impactar o nível de interesse e de atração para o mercado de infraestrutura", completa.

Infraestrutura social de volta à agenda

Outro aspecto positivo retratado no estudo é sobre o grau de concretização das expectativas em relação à promoção de investimentos nos últimos seis meses, com 49,3% afirmando que essas expectativas foram parcialmente alcançadas e 7,4% indicando a concretização total delas.

Pela quarta edição consecutiva, os setores de saneamento básico, energia elétrica e rodovias assumem as três primeiras posições na pesquisa, respectivamente, com potencial de intenções de investimento nos próximos anos.

A colocação, de acordo com o responsável pelo estudo, mostra que setores, por serem mais consolidados e maduros no mercado brasileiro, trazem maior previsibilidade para os investidores. Além de historicamente terem forte demanda e, com isso, necessidade de aprimoramentos.

Mas a nova edição do barômetro, contudo, trouxe uma novidade no ranking: a infraestrutura social mostrando-se como um dos destaques para 2025.

O setor cresce na esteira em que os investimentos por meio de PPPs (Parceria Público-Privada) e concessões também ganham fôlego. Segundo o sócio da EY, por conta da estruturação de projetos e financiamento o foco na agenda social pelo governo federal.

"Percebemos, conversando também com o BDDES e a Caixa, que já existe uma demanda muito grande dos entes subnacionais por receber apoio para esse tipo de projeto em infraestrutura social. Estamos prevendo que 2025 e 2026, de fato, terão um crescimento muito grande para esse setor, principalmente escolas", destaca Gusmão.

'Ano dos leilões'

As expectativas positivas de investimento apontadas no relatório também refletem a quantidade recorde de leilões para este ano. Após um 2024 de recorde de investimentos privados na infraestrutura — R$ 197 bilhões —, o Brasil vê um cenário virtuoso de leilões em 2025.

O estudo não direcionou aos agentes do mercado de infraestrutura uma pergunta específica sobre o tema.

Mas, em conversas com o setor, Gustavo Gusmões observa que o volume de leilões e investimentos em infraestrutura, ainda que sejam um sinal positivo do avanço dos projetos, levantam desafios relacionados ao cronograma dos leilões.

"Muitos não têm uma estrutura para estudar tanta coisa ao mesmo tempo. E mesmo que tenham tempo para estudar... imagina se ganha três projetos de grande porte ao mesmo tempo. Muitas vezes, ele [estruturador] não vai ter uma estrutura de funding para poder também comportar os três projetos. É uma boa notícia que tenham muitos projetos, mas é preciso um cronograma  espaçado para que possam ter o tempo de preparo", comenta o executivo da EY.

A previsão para este ano, que ainda deve ser atualizada, é de mais de 90 certames e mais de R$ 200 bilhões em investimentos contratados, como revelou a EXAME na edição de dezembro da revista.

O assunto foi, inclusive, tema de discussão no primeiro episódio do podcast EXAME INFRA, que estreou neste ano. No programa, o secretário de Parcerias e Investimentos de São Paulo, Rafael Benini, afirmou ser precisotomar muito cuidado tanto com o tamanho quanto com a qualidade dos projetos.

"Estamos falando da qualidade dos projetos, da capacidade de execução de engenharia e de compra de insumo. Precisávamos talvez sentar e organizar todos esses projetos. São mais de 90, o que inclui prefeitura, estados, governo federal. Precisávamos sentar e conversar sobre isso e tentar medir os impactos disso sobre a economia. No final, o que acontece vai ficar mais caro para todo mundo", afirmou Benini.

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