Ações contra garimpo e vistorias: entenda o que é afetado pela paralisação dos servidores do Ibama
Enquanto servidores aguardam retorno sobre reivindicações, grupo especial de combate ao desmatamento está paralisado
Agência de notícias
Publicado em 3 de janeiro de 2024 às 14h27.
As operações de combate ao garimpo ilegal nas terras indígenas Yanomami e Apyterewa, em Roraima e Pará, respectivamente, estão comprometidas. Oenvio de novas equipes do Ibama não deve acontecer devido a uma paralisação de toda as atividades de campo do órgão, iniciada nesta quarta-feira, 3, o que afetará ainda vistorias de obras que precisem de licenciamento ambiental e qualquer repressão a ilícitos ambientais que demande deslocamento de fiscais, em especial na Amazônia.
Os servidores decidiram pela medida porque estão há três meses aguardando um posicionamento do governo federal sobre as reinvindicações para restruturação de carreira, aumento da indenização de fronteira e da gratificação para operações de risco.
Os funcionários do ICMBio também devem aderir ao movimento ainda nesta quarta, o que pode resultar até no fechamento de visitações a parques nacionais. As atividades de campo dos servidores ambientais só vão continuar caso os fiscais já estejam trabalhando nos respectivos locais.
A paralisação, que já conta com quase dois mil adesões, será sobre novos trabalhos, mesmo os programados. Procurado, o Ministério do Meio Ambiente afirmou que está em contato com o Ministério da Gestão e Inovação para apresentação de cronograma das novas etapas de negociação.
Operações contra o garimpo em terras indígenas
Iniciada em fevereiro do ano passado, a operação especial na Terra Indígena Yanomami (TIY) conseguiu bloquear R$2 bilhões de grupos investigados, além de expulsar invasores, destruir balsas, embarcações e aeronaves, e apreender de armas de fogo, ouro e outros minérios. Centenas de acampamentos de garimpos ilegais foram desmantelados e o número de voos clandestinos na região foi reduzido em 90%. Ainda houve a distribuição de dezenas de milhares de cestas básicas à população indígena. Em meados do mês passado, as forças saíram da região para uma pausa programada, e retornariam nos próximos dias.
Sem servidores do Ibama, a operação pode continuar com as polícias, mas não haverá mais autuação de crimes ambientais, com apreensões de material e multas, explica Cleberson Carneiro Zavaski, analista ambiental do ICMBio, e presidente da Associação Nacional dos Servidores em Meio Ambiente (Ascema), que lidera a paralisação.
"A retomada da desintrução dos garimpeiros na TIY ia iniciar essa semana. O efetivo do Ibama é variável, são cerca de 30 a 40, com troca de equipe. Se não tiver fiscais ambientais, a parte de apreensão e multas não é executada. A força policial está para reprimir outros crimes, mas os crimes ambientais são combatidos por nós. O país é continental, mas os servidores são poucos", explica Zavaski, mais conhecido como Binho, que diz que nas últimas semanas teria ocorrido um retorno de garimpeiros à região.
"Há uma informação, em relatórios, que a partir da retirada de parte das tropas federais na segunda semana de dezembro houve retorno de parte dos garimpeiros", disse.
Outra operação comprometida é a desintrução na Terra Indígena Apyterewa, o território indígena onde houve recorde de desmatamento nos últimos quatro anos. Lá, o trabalho se iniciou em novembro e continuou ativo nessa virada de ano. No mês passado, uma emboscada contra servidores da Funai terminou em um agente baleado.
Em seguida, prisões foram realizadas e ao menos 76 invasores já foram retirados, segundo o Ministério dos Povos Indígenas. Servidores do Ibama estão em campo no momento, na área. Eles não paralisarão as atividades. Mas, quando houver o momento da substituição do efetivo, as novas equipes não farão a viagem, diz Zavaski.
Grupo sem efetivo
Além das operações especiais, as ações do Grupo de Controle ao Desmatamento na Amazônia (GCDA) estão comprometidas. O GCDA é dividido em 10 "hot spots" - áreas estratégicas - da Amazônia, onde há maior número de desmatamento e então são realizadas diligências como combate a invasões a florestas e terras públicas, apreensão de madeiras ilegais, vistorias em planos de manejo e propriedades rurais. Como não há efetivo próprio do Ibama em muitos desses estados, as equipes são compostas a partir do recrutamento de servidores de todo o país, em inscrições abertas mensalmente.
Mas, com a paralisação, o primeiro ciclo de atividade do GCDA, que deveria começar na segunda quinzena de janeiro, não deve acontecer.
"O Ibama é um órgão muito pequeno, então precisamos recrutar servidores de outros órgãos do país para participar dessas operações. Em Roraima, por exemplo, o efetivo é muito pequeno e não consegue fazer frente ao desafio do garimpo. Agora, o número de inscrições está muito pequeno, essas operações já vão ficar sem participação do Ibama nesse mês", explica Wallace Lopes, servidor do Ibama e também dirigente da Ascema Nacional.
Enquanto aguardam um posicionamento do governo federal, os servidores realizam nesta quinta-feira, 4, o Conselho Nacional de entidades filiadas à Ascema Nacional, onde ficarão decididos os próximos passos do movimento. Assim, a paralisação, no momento apenas dos trabalhos de campo, poderia se estender aos serviços de escritório e burocráticos, se transformando de fato numa greve.
Dos 2800 servidores do Ibama, há cerca de dois mil já apoiando a paralisação, segundo a Ascema. Há agora a expectativa de adesão dos funcionários do ICMBio, o que estaria próximo de acontecer, diz Zavaski. Se isso acontecer, o principal impacto aconteceria sobre as Unidades de Conservação e os Centros Nacionais de Pesquisa, que realizam pesquisas como monitoramentos de cavernas e de baleias em Abrolhos (BA).
"No momento, só atividade de campo do Ibama está paralisada. Mas deve sair indicativo de paralisação de atividades de campo do ICMBIo, o que pode resultar no fechamento de Unidades de Conservação e suspensão das visitações nos parques", explica Zavaski.
As outras duas carreiras que integram a Ascema são do Serviço Florestal Brasileiro e do próprio Ministério do Meio Ambiente.
Governo federal negocia
Procurado, o Ministério do Meio Ambiente disse que está em diálogo com o Ministério da Gestão e Inovação "para que seja apresentado um cronograma das próximas etapas de negociação com servidoras e servidores do ministério, do Ibama, do ICMBio e do SFB. A reestruturação das carreiras ambientais é uma prioridade para o MMA".