Abin Paralela: tudo o que se sabe sobre monitoramento de ministros do STF, políticos e jornalistas
Segundo a investigação da PF, a suposta organização criminosa também produzia dossiês e notícias falsas. O caso ficou conhecido como "Abin Paralela"
Repórter de Brasil e Economia
Publicado em 11 de julho de 2024 às 15h41.
Última atualização em 11 de julho de 2024 às 16h51.
A Polícia Federal (PF) deflagrou nesta quinta-feira, 11, a quarta fase da Operação Última Milha, que tem como objetivo desarticular uma suposta organização criminosa de espionagem ilegal de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), deputados, senadores, ex-presidenciáveis e jornalistas utilizando-se de sistemas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). A estrutura também produzia dossiês enotícias falsas para ter ganhos políticos, aponta a investigação da PF.O caso ficou conhecido como "Abin Paralela".
O ministro do STF, Alexandre de Moraes, relator do caso, atendeu o pedido da PF e decretou a prisão de cinco investigados, além de autorizar afastamentos da função, buscas e compartilhamento de informações para apuração sobre monitoramento ilegal de pessoas e autoridades públicas. Após o caso ser divulgado, Moraes tornou público a sua decisão, a representação da PF e o parecer da PGR.
A decisão foi tomada no âmbito das investigações do usodo sistema de inteligência First Mile, da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), por delegados, agentes e servidores públicos. Segundo a PF, foram constatados elementos concretos de uma organização criminosa que atuava em núcleos para elaboração de dossiês contra ministros, parlamentares e outras pessoas a fim de divulgar narrativas falsas e incitar, direta ou indiretamente, tentativa de golpe de Estado e enfraquecimento das instituições.
“Os investigados, segundo a Polícia Federal, participaram de uma estrutura espúria infiltrada na Abin voltada para a obtenção de toda a ordem de vantagens para o núcleo político, produzindo desinformação para atacar adversários e instituições que, por sua vez, era difundida por intermédio de vetores de propagação materializados em perfis e grupos controlados por servidores em exercício na Abin. O relatório da Polícia Federal traz prova da materialidade e indícios suficientes dos graves delitos praticados”, destacou o ministro em sua decisão.
Entre as autoridades monitoradas pela organização estão o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), o ex-presidente da Casa, Rodrigo Maia, o ex-governador de São Paulo, João Dória, e os ministros do STF Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luis Roberto Barroso e Luiz Fux. Jornalistas, como a colunista da Folha de S.Paulo, Mônica Bergamo, também foram monitorados pelos acusados, de acordo com os investigadores.
A PF também aponta em seu relatório que foi realizada uma"instrumentalização" da Abin para monitorar pessoas relacionada às investigações que envolvem a família do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Os investigados, em um dos casos, realizaram ações clandestinas para tentar "achar podres" de auditores da Receita Federal responsáveis por relatórios financeiros sobre o senador Flávio Bolsonaro (PL).
As investigações identificaram ainda a atuação do deputado federal Alexandre Ramagem (PL), que chefiava a Abin durante o governo Bolsonaro, para abrir um procedimento administrativo contra auditores da Receita Federal para anular a investigação contra Flávio Bolsonaro e retirar os servidores da Receita de seus cargos. Hoje,Ramagem é pré-candidato à prefeitura do Rio.
A PF vê os possíveis crimes de:
- organização criminosa;
- tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito;
- interceptação clandestina de comunicações;
- invasão de dispositivo informático alheio.
No parecer sobre o caso, a Procuradoria-Geral da República indicou que os elementos apresentados pela investigação apontam a existência de uma organização que pretendia atacar o sistema republicano.
“As ações do grupo criminoso não se esgotam em um único inquérito, sendo importante o compartilhamento de provas para o melhor enquadramento das condutas praticadas", aponta.
Quem foi preso na operação da PF sobre a "Abin Paralela"?
- Mateus de Carvalho Sposito;
- Richards Dyer Pozzer;
- Rogério Beraldo de Almeida;
- Marcelo Araújo Bormevet;
- Giancarlo Gomes Rodrigues.
- José Matheus Sales Gomes;
- Daniel Ribeiro Lemos.
Quem foi espionado pela "Abin Paralela", segundo a PF?
- STF: ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luis Roberto Barroso e Luiz Fux;
- Congresso: deputado federal Arthur Lira (presidente da Câmara dos Deputados), o ex-deputado Rodrigo Maia (ex-presidente da Câmara dos Deputados), os deputados federais Kim Kataguiri (União) e Joice Hasselmann, o ex-deputado Jean Wyllys (PSOL) e os senadores Alessandro Vieira (MDB), Omar Aziz (PSD), Renan Calheiros (MDB) e Randolfe Rodrigues.
- Executivo: ex-governador de São Paulo, João Dória, os servidores do Ibama Hugo Ferreira Netto Loss e Roberto Cabral Borges, os auditores da Receita Federal do Brasil Christiano José Paes Leme Botelho, Cleber Homen da Silva e José Pereira de Barros Neto.
- Jornalistas: Monica Bergamo, Vera Magalhães, Luiza Alves Bandeira e Pedro Cesar Batista.
O que é a "Abin Paralela"?
Em 22 de abril de 2020, em reunião no Palácio do Planalto, Bolsonaro disse para seus ministros que tinha o seu próprio serviço de informações, alegando que Abin, PF e outros centros de inteligência do governo não funcionavam.“Sistemas de informações: o meu funciona. O meu, particular, funciona”, disse. “Prefiro não ter informação do que ser desinformado por sistema de informações que eu tenho.”
Uma reportagem do O Globo, de março de 2023, mostrou que a Abin utilizou um programa secreto chamado FirstMile para monitorar a localização de pessoas predeterminadas por meio dos aparelhos celulares durante a gestão Bolsonaro.
Após a reportagem,a PF abriu um inquérito e identificou que a ferramenta foi utilizada para monitorar políticos, jornalistas, advogados e adversários do governo.