7 perguntas para o Livres, que deixou o PSL após filiação de Bolsonaro
Movimento com proposta liberal abandonou o PSL após entrada de Bolsonaro e, agora, testa novos meios para influenciar a política além das eleições
Talita Abrantes
Publicado em 15 de abril de 2018 às 13h00.
Última atualização em 15 de abril de 2018 às 13h26.
São Paulo - Dos grupos criados nos últimos tempos com o propósito de renovar o sistema político e partidário brasileiro, o Livres parece ter sido aquele que mais experimentou o peso da lógica que ainda impera nas relações políticas brasileiras.
Enquanto outros movimentos tentaram uma via mais independente e suprapartidária, o Livres nasceu com o propósito de ser uma espécie de "startup" de renovação dentro do Partido Social Liberal ( PSL ). O acordo, segundo o grupo, era claro: quanto mais apoio conseguisse, maior seria seu espaço dentro do partido.
O acordo foi cumprido de 2016 até janeiro de 2018, quando a liderança nacional do PSL anunciou que o deputado federal Jair Bolsonaro , que está em segundo nas pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República, seria o candidato presidencial do partido.
Naquele momento, o Livres comandava 12 dos 27 diretórios estaduais da sigla. "Sempre quisemos criar um partido que fosse liberal tanto nos costumes quanto na economia. Não achamos que o Bolsonaro é liberal nem na economia, nem nos costumes", diz Paulo Gontijo, atual presidente nacional do movimento.
A solução foi romper com o partido. Dos 12 diretórios antes comandados pelo movimento, somente um continuou no PSL. Ao Livres restou uma nova estratégia: não se unir a nenhuma outra legenda e alargar o propósito de renovação política para além das metas eleitorais. Entre as propostas está a formação de lideranças tanto políticas quanto sociais, criação de projetos e divulgação dos princípios defendidos pelo movimento.
Para as eleições deste ano, ao menos Rondônia e Sergipe terão candidatos ao governo estadual que são membros do Livres. Nos outros estados, haverá candidaturas aos legislativos estadual e federal — mas o número ainda não foi definido.
Os postulantes a um cargo eletivo estão liberados para se filiar a qualquer partido, com exceção das legendas mais à esquerda e do PSL, é claro. Gontijo, que mira a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, por exemplo, vai se lançar pelo PPS. Augusto Peluccio é pré-candidato ao governo de Rondônia pelo Podemos.
O compromisso dos membros é respeitar os 17 princípios defendidos pelo Livres.
De todos os principais movimentos de renovação política, o Livres é aquele que mais se alinha ao discurso liberal. Ao contrário de outras iniciativas, o grupo não se limita a propostas liberais apenas na economia, mas também defende a liberdade nos costumes com o apoio, por exemplo, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Veja trechos da entrevista que Paulo Gontijo concedeu ao site EXAME:
EXAME: Enquanto todos os movimentos de renovação política se declaravam independentes, por que o Livres decidiu ser uma startup dentro de um partido?
Paulo Gontijo: A gente tinha a ideia original de que iríamos conseguir reformar o PSL de dentro. Tínhamos um acordo de que se conseguíssemos crescer, iríamos ganhar mais espaço. Fomos crescendo e ganhando espaço, até um momento em que não fomos mais convenientes.
Para quem não foi mais conveniente?
Para a presidência do PSL. A partir do momento em que nosso projeto de constituir uma bancada nova renovava, de fato, o partido, eles optaram por trazer o Bolsonaro para dentro da sigla sob o risco de jogar esse trabalho fora.
Por que a entrada do Bolsonaro foi um problema para o movimento?
A gente sempre quis criar um partido que fosse liberal tanto nos costumes quanto na economia. A gente não acha que o Bolsonaro é liberal nem na economia, nem nos costumes. O problema é ideológico. E a condução de todo o processo foi feita de uma forma muito pouco transparente. Soubemos da entrada do Bolsonaro quando saiu uma nota para a imprensa. Não concordamos com esse jeito de fazer política e não acho que seria coerente ficar nessas circunstâncias.
O que essa atitude mostra sobre a política partidária no Brasil?
Mostra que o poder é muito concentrado na presidência dos partidos, que os mecanismos de controle não existem, que há muita pouca transparência e uma cultura de pegar um trabalho constituído e simplesmente descartá-lo ao sabor das conveniências do momento.
Qual é a estratégia a partir de agora?
O Livres está se considerando um movimento suprapartidário, o que significa que não vamos para nenhum outro partido. Vamos nos focar em tentar renovar a política através de ideias e lideranças. A gente sai do campo eleitoral e fica no campo da sociedade como um todo.
A partir de agora, vamos promover nossas ideias e qualificar os membros do Livres para que eles sejam boas lideranças, seja como empreendedores sociais ou quadros políticos. A gente quer instituir projetos. Estamos estudando dois projetos que são importantes para nós: adaptação dos refugiados em Roraima e um trabalho de empreendedorismo em populações carcerárias.
Como será a relação com os membros do Livres que se candidatarem nestas eleições?
O que a gente faz é preparação de lideranças: preparamos os membros do Livres para, independente da escolha deles de serem candidatos ou simplesmente lideranças políticas não eleitorais, que eles sejam capacitados e apoiados.
A gente não vai entrar em bloco em partidos. A gente liberou a base, desde que os membros não se filiem aos partidos mais extremos como PT [ou os demais partidos mais] a esquerda e o PSL na extrema-direita.
Por que, a princípio, a visão de estar dentro de um partido parecia mais efetiva do que a de ser um movimento suprapartidário?
Tem prós e tem contras. Quando você está dentro de um partido, tem-se acesso a algumas ferramentas legislativas que tornam a sua ação política mais efetiva. Claro que a partir do momento em que você está dentro de um partido, há um grande descrédito da sociedade com relação a você.
Uma coisa interessante que aconteceu após a saída do PSL, e por que saímos para manter nossa integridade, foi que passamos a ser muito mais bem aceitos e ter muito menos desconfiança da sociedade sobre nossas propostas e motivações. Ganhamos liderança em novos estados, muitos intelectuais toparam se juntar ao projeto e colaborar gratuitamente para isso. A ação política fica mais indireta, mas, por outro lado, a gente ganhou em respeito, prestígio e novos quadros.