Tecnologia

Telegram vs. Justiça Eleitoral: app pode ser expulso do país

Em meio ao debate sobre o impacto das fake news no processo eleitoral, TSE avalia suspensão do serviço russo de mensagens, que não tem representação no Brasil

Ministro Luís Roberto Barroso: pouco tempo antes de entregar a gestão do TSE, o ministro aperta o cerco contra as fake news nas eleições de 2022 (Sopa Images/Getty Images)

Ministro Luís Roberto Barroso: pouco tempo antes de entregar a gestão do TSE, o ministro aperta o cerco contra as fake news nas eleições de 2022 (Sopa Images/Getty Images)

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e as principais plataformas digitais que atuam no Brasil vão assinar, hoje, 15, um documento para barrar a disseminação de fake news nas eleições deste ano. O acordo não é novo, já que funciona informalmente desde o ano passado, mas a intenção do evento é renovar o memorando e focar no pleito que está próximo.

Na lista de participante constam as redes sociais Twitter, TikTok, Facebook, WhatsApp, Google, Instagram, YouTube e Kwai. O evento será realizado a partir das 11h, com transmissão ao vivo e a participação do presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, e representantes das plataformas.

Que tal viajar mais no mundo pós-pandemia? Conheça o curso de liberdade financeira da EXAME Academy

Barroso, por sinal, entende bem e até intimamente a dificuldade de conter as fake news que circulam nas redes. O ministro teve que conviver com ataques do presidente Jair Bolsonaro à confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro e com uma penca de teorias conspiratórias sobre manipulações que ocorreriam nos bastidores do TSE via hackers.

O anúncio desta terça-feira é uma forma de o ministro fortalecer a defesa do sistema pelo qual trabalhou e o ocorre quase como um ato final de sua gestão. O colega Edson Fachin assume o cargo no próximo dia 22.

No entanto, na saída, há outras pedras incomodas no sapato de Barroso: o aplicativo de mensagens russo Telegram que não está participando do acordo assinado hoje. O app tampouco respondeu o contato do TSE para discutir eleições — e não foram poucos.

Por cartas, ligações e emails, o presidente do TSE requisitou ao CEO do app Pavel Durov que uma reunião fosse marcada com representantes do mensageiro no Brasil. No encontro, seriam discutidas as ações que o serviço poderia criar para mitigar o efeito massivo da distribuição de mensagens em grupos do Telegram.

Barroso ressaltou no ofício que o Telegram é um aplicativo de “rápido crescimento no Brasil”, e instalado em 53% dos smartphones ativos disponíveis no país. O app possui também uma alta capacidade de viralização com grupos que podem comportar até 200 mil membros, em relação aos canais, o Telegram possui uma dinâmica que se assemelha muito mais a redes sociais, não modera conteúdo — a não ser em casos como de terrorismo.

Além disso, o aplicativo é usado por políticos de todos os partidos, inclusive pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), como uma forma de divulgação de ações, além de um canal direto com eleitores. “No entanto, é por meio dele que muitas teorias da conspiração e informações falsas sobre o sistema eleitoral estão sendo disseminadas sem qualquer controle”, afirmou publicamente o ministro.

Sem o contato, o Barroso tem dito em entrevistas que a suspensão do aplicativo de mensagens Telegram é uma medida viável caso o Telegram continuasse a ignorar a Justiça Eleitoral. Caberia, nesse caso, ao Congresso Nacional suspender o serviço da plataforma no Brasil.

Em uma posição do TSE publicada no mês passado, o órgão afirmou que “nenhum ator relevante” às Eleições 2022 pode operar sem uma representação jurídica adequada, e que seria responsabilizada em eventuais descumprimentos da legislação eleitoral.

Um cenário de bloqueio de aplicativo já foi experimentado pelos brasileiros, que tiveram em mais de uma oportunidade o WhatsApp suspenso após decisão judicial.

Por ser considerada uma medida extrema, que interfere até mesmo em comunicações que envolvem a economia do país, o bloqueio atualmente abre a discussão de que é preciso uma violação grave para justificá-lo. "Seria como cortar a luz de um bairro inteiro porque uma pessoa não pagou a conta", afirma Adriano Mendes, sócio da Assis e Mendes Advogados, especializado em proteção de dados e de direito digital.

"O Brasil tem até mesmo mecanismo diplomáticos que podem pressionar o Telegram por uma resposta. Um deles é a convenção de Budapeste, um instrumentos internacional que permite às nações membro obterem aspectos penais, processuais e cooperativos no enfrentamento às práticas ilícitas no ambiente virtual", afirma Mendes. "Seria possível, por exemplo, durante o pleito, conseguir os dados do criminoso que operasse alguma central de distribuição de fake news", diz.

A constitucionalidade de um possível bloqueios está em discussão em uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) e ainda não há prazo para que o app deixe de funcionar no país.

Na Alemanha, app bloqueou 64 perfis

Diferentemente da postura de ignorar autoridades brasileiras, na Alemanha o Telegram acatou uma pressão do governo e bloqueou, na semana passada, 64 contas que disseminavam informações falsas, discursos de ódio contra minorias e combinavam até atos terroristas. A informação da suspensão das contas foi revelada pelo jornal alemão Süddeutsche Zeitung.

Foi a primeira vez que o app tomou a atitude no país, e só ocorreu após Ministério do Interior e o Departamento de Investigações pressionarem a plataforma. Além disso, a ministra do Interior da Alemanha, Nancy Faeser, conversou com os altos representantes da empresa.

As contas desativadas pertenciam a diversas pessoas que geriam grupos que espalham a desinformação sobre a pandemia de covid-19 e organizam protestos violentos contra o governo.

A Alemanha vinha pressionando o Telegram para desativar as contas e tomar medidas mais duras contra discursos de ódio. O tom subiu quando a ministra do Interior disse que poderia banir o aplicativo do país. O governo também estava disposto a aplicar multas em valores que poderiam chegar a até 55 milhões de euros.

Em entrevista a um jornal alemão na semana passada, Nacy Faese disse que vai continuar pressionando o telegram para que a plataforma cumpra as leis do país. "O Telegram não deve mais ser um acelerador para extremistas de direita, teóricos da conspiração e outros agitadores. Ameaças de morte e outras mensagens perigosas de ódio devem ser apagadas e ter consequências legais", disse.

Em outros países o Telegram também sofre restrições. Na China, o app é proibido sendo possível somente com VPN. Na Indonésia e na Índia é liberado, mas com algumas restrições como a garantia de que cumpra as leis locais de não disseminar o ódio ou mesmo incitar crimes e protestos violentos contra o governo. Rússia e Paquistão liberaram o app, após ter sido bloqueado por anos. Frequentemente os dois países aplicam restrições aos conteúdos. No Brasil, o Telegram seguirá alvo de intenso escrutínio até as eleições de outubro.

Acompanhe tudo sobre:Capa do DiaEleiçõesRedes sociaisTelegramTSE

Mais de Tecnologia

Como o Google Maps ajudou a solucionar um crime

China avança em logística com o AR-500, helicóptero não tripulado

Apple promete investimento de US$ 1 bilhão para colocar fim à crise com Indonésia

Amazon é multada em quase R$ 1 mi por condições inseguras de trabalho nos EUA