Obama limita atividades da NSA, mas mantém coleta de dados
Em um esperado discurso que delineou as mudanças nos programas de espionagem, Obama disse ter limitado a interceptação de comunicações de líderes estrangeiros
Da Redação
Publicado em 17 de janeiro de 2014 às 17h44.
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, limitou nesta sexta-feira as atribuições da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês), ao estabelecer proteções às liberdades civis, apesar de manter a coleta de informações.
Em um esperado discurso que delineou as mudanças nos programas revelados pelo ex-analista de inteligência Edward Snowden, Obama disse também ter limitado a interceptação de comunicações de líderes estrangeiros aliados.
Outro ponto proposto por Obama é oferecer novos mecanismos de proteção a milhões de estrangeiros que tiveram seus dados coletados pela NSA por meio do monitoramento de suas comunicações telefônicas e de Internet.
"Considerando o poder único do Estado, não é suficiente que os líderes digam: 'Confiem em nós, não vamos cometer abusos com os dados que coletamos", disse Obama.
O conjunto de propostas do presidente americano representa um compromisso entre as exigências dos defensores das liberdades civis, que consideram inconstitucional a coleta de dados, e as resistências a qualquer mudança na comunidade de Inteligência.
O centro dessa renovação é o compromisso presidencial de por fim à coleta de metadados telefônicos, que detalham a duração, a origem e o destino das chamadas, mas não seu conteúdo.
"Acredito que os críticos estão certos quando apontam que, sem salvaguardas, esse tipo de programa pode ser usado para conseguir mais informações sobre nossas vidas privadas e abrir a porta para programas de coleta de dados mais intrusivos", admitiu, ressaltando que é necessária "uma nova abordagem".
"Por isso, ordenei uma transição que eliminará o programa de coleta de metadados como existe atualmente, a Seção 215, e criará um mecanismo que preserve as capacidades que temos, sem que o governo mantenha esses metadados", completou.
Esses programas de vigilância foram implementados após os atentados do 11 de Setembro, em 2001, contra os Estados Unidos.
O presidente orientou o procurador-geral dos Estados Unidos, Eric Holder, e a própria NSA a apresentarem em 60 dias uma alternativa para armazenar esses dados. Disse ainda que, a partir de agora, os agentes da NSA devem pedir permissão a um tribunal para terem acesso aos dados de um potencial suspeito.
Obama deixou claro, no entanto, que a retenção de dados telefônicos pode se tornar uma ferramenta vital para que os mecanismos de inteligência detectem contatos entre "suspeitos de terrorismo", e que, por isso, deve continuar.
O presidente não antecipou como, nem nas mãos de qual instância ou organização ficarão armazenados os dados coletados de milhões de comunicações eletrônicas.
No plano externo, Obama afirmou que o novo conjunto de diretrizes determina um freio explícito à interceptação de comunicações de líderes estrangeiros.
"Deixei claro para a comunidade de inteligência que, a menos que tenha um claro propósito de segurança nacional, não vamos monitorar as comunicações de chefes de Estado e de Governo entre nossos amigos e aliados mais próximos", prometeu.
Ele disse ainda ter instruído suas equipes de segurança a "trabalhar com nossos associados estrangeiros para aprofundar nossa coordenação e cooperação de forma a reconstruir a confiança".
Ao mesmo tempo, anunciou que serão implementados mecanismos para proteger a privacidade dos cidadãos estrangeiros, cujos dados tenham sido interceptados pela Inteligência americana.
"Deixem-me ser claro: nossas agências de Inteligência continuarão coletando informação sobre as intenções dos governos ao redor do mundo", alertou.
Segundo ele, considerando-se que os serviços de Inteligência de todos os países do mundo realizam essa atividade, "não vamos pedir desculpas porque nossos serviços são mais eficientes".
O presidente avaliou que serão necessários vários anos para se ter uma dimensão correta dos danos provocados pelas revelações de Snowden, que expôs o sistema de Inteligência nacional.
"A forma sensacionalista como essas revelações foram feitas lançam mais sombras do que luzes, ao mesmo tempo em que revelam métodos para nossos adversários que podem ter impacto em nossas operações de uma forma que, possivelmente, não compreenderemos por inteiro por muitos anos", afirmou.
Para o fundador do "site" WikiLeaks, Julian Assange, o anúncio de Obama muda muito pouco na rotina de trabalho da NSA. Assange definiu o discurso de Obama como "vergonhoso" e, em entrevista à rede CNN, considerou que as novas diretrizes terão um efeito pequeno.
Segundo ele, Obama foi "arrastado, batendo o pé e gritando", em seu pronunciamento desta sexta. "É vergonhoso para um chefe de Estado fazer isso por 45 minutos, sem dizer quase nada", ironizou.
Obama "se mostra reagente a fazer qualquer reforma concreta e, infelizmente, hoje vemos muito poucas reformas concretas", avaliou.
Assange manifestou seu ceticismo em relação à medida que obriga os agentes da NSA a obter autorização da Corte de Vigilância de Inteligência Estrangeira (Fisa, na sigla em inglês) para poder acessar dados de uma pessoa específica.
"A Fisa é conhecida por ser a mais secreta corte cativa nos Estados Unidos, produzindo leis secretas feitas por juízes", afirmou.O fundador do WikiLeaks também questionou se a nomeação de um advogado público para a Fisa conseguirá mudar a situação atual.
"Um advogado público permanente na Fisa de forma secreta dificilmente produzirá um resultado decente", criticou, acrescentando que o compromisso de não espionar líderes estrangeiros tampouco faz sentido.
"'Não vamos espionar (a chanceler alemã) Angela Merkel, ou o primeiro-ministro (britânico David) Cameron. Ou o primeiro-ministro da Austrália. Mas deixem-me continuar espionando todos os outros com quem falamos'. Não significa nada não espionar os líderes mundiais", minimizou.