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Marco Civil completa seis meses sem afetar vida do usuário

“Aconteceu o previsto, na verdade: não deveríamos sentir nada na pele”, disse a INFO o advogado Victor Haikal, do escritório Patrícia Peck Pinheiro Advogados

Marco Civil: ele nasceu para garantir direitos dos usuários e regulamentar atuação de empresas na rede (Gustavo Lima/Câmara dos Deputados)
DR

Da Redação

Publicado em 23 de dezembro de 2014 às 20h59.

São Paulo - Depois de anos tramitando pela Câmara dos Deputados , o Marco Civil da Internet finalmente entrou em vigor em 2014 – mais precisamente no dia 23 de junho.

Celebrado por grandes nomes da web como um exemplo de legislação a ser seguido, o documento elaborado de forma colaborativa nasceu com o propósito de garantir os direitos dos usuários e regulamentar a atuação de empresas na rede.

Mas seis meses depois de entrar em vigor, a elogiada nova lei ainda não foi regulamentada – e, por isso mesmo, foram poucas as mudanças vistas até agora.

“Aconteceu o previsto, na verdade: não deveríamos sentir nada na pele”, disse a INFO o advogado Victor Haikal, do escritório Patrícia Peck Pinheiro Advogados.

Segundo o especialista em direito digital, o Marco Civil foi feito para não afetar a vida dos usuários que já não prejudicavam ninguém.

Quem teve comportamentos inadequados, no entanto, “passou a ser tratado de forma diferente” – mas ainda de forma relativamente tímida.

No caso das empresas, a situação já é ligeiramente diferente, como explicou o próprio Haikal. “Houve impacto direto na contratação, por exemplo, de serviços em nuvem”, contou o advogado.

Graças ao Marco Civil, empresas de ramos como este que atuam diretamente no Brasil e têm representantes por aqui passaram a ser mais “protegidas”, de certa forma.

“E nesse sentido, a legislação já provocou perturbações na força.”

Gisele Arantes, advogada do escritório Assis e Mendes, e Renato Opice Blum, também especialista em direito digital e presidente do conselho de TI da FecomercioSP, concordam nestes pontos.

Segundo Gisele, o documento fez com que “as empresas fossem obrigadas a adaptar suas políticas”.

Blum, por sua vez, ressalta o impacto que a nova lei teve em regras internas, obrigando companhias a atualizar as normas de privacidade e a melhorar a segurança na hora de armazenar dados (que incluem os ainda polêmicos logs de acesso).

Regulamentação e polêmicas – Ainda assim, são poucas as mudanças provocadas pela chegada do Marco Civil da Internet até agora, algo que se deve ao fato de a lei não estar regulamentada.

Como destacaram os advogados, o processo deve ser feito em duas partes e iniciado apenas no ano que vem, sobre responsabilidade da Anatel e do Comitê Gestor da Internet (CGI.br).

E é ali no meio que os pontos mais polêmicos devem ser ajustados, na opinião dos consultados pela reportagem.

Para Haikal, por exemplo, a regulamentação deve trazer novas discussões relacionadas à neutralidade da rede e ao armazenamento de dados, algo que ainda não é exatamente regulado.

Mas tudo isso, novamente, afetará mais as operadoras e empresas prestadoras de serviço.

“O usuário poderá sentir algo nas atividades corriqueiras apenas caso a neutralidade seja comprometida e haja degradação de dados trafegados”, disse o advogado. Mas ele mesmo não acredita em mudanças nesta parte.

Gisele, por sua vez, já espera que erros, especialmente os relacionados à obrigatoriedade do cumprimento da lei, sejam corrigidos.

Segundo ela, apesar de as regras existirem, o Marco ainda não impõe penalidades a quem não aplicá-lo, e sim as condiciona à futura regulamentação.

Blum reforça este ponto: “A cultura do Brasil ainda está muito relacionada a multas”, disse o especialista – e justamente por isso, muitas empresas vão esperar até a regulamentação para se mexer e seguir tudo que a legislação exige, mesmo que isso signifique gastos bem mais elevados.

Os especialistas também esperam que o processo prometido para o ano que vem resolva a complicação envolvendo os logs de acesso, ponto mais controverso do Marco.

Para Haikal, ainda há pontos que permitem uma interpretação errada da lei, dando brechas para que empresas até optem por não guardar as informações.

O tipo de dado e a especificação de “uso” também não ficam muito claros no artigo – e esses, para o advogado, “são pontos que deveriam ter sido tratados com maior cuidado pelo legislador”.

Blum e Gisele ainda foram além quando trataram da guarda de logs e IPs.

Para ambos, o artigo na legislação é considerado até um retrocesso, de certa forma, e muito porque acabou reduzindo o período pelo qual as empresas são obrigadas a manter os dados em seus servidores.

A advogada lembra que um posicionamento já existente do Supremo Tribunal de Justiça previa que os registros ficassem armazenados por três anos – prazo que cairá para seis meses após a regulamentação da legislação.

E ainda relacionado aos logs, Blum disse que a proteção deles não deveria ser tratada em um Marco Civil, e sim ter uma lei própria.

Veredito – Em suma, segundo Gisele, após seis meses em vigor, “o Marco Civil deixa uma impressão neutra, de que está lá, mas ainda não é aplicado de forma alguma”.

E muito disso se deve ao fato de ter sido aprovado “às pressas” – algo motivado pelo evento NETMundial, realizado em São Paulo em abril deste ano, e pelo caso Edward Snowden, na visão da advogada.

Justamente por isso, ela também não é muito otimista quanto à rapidez na regulamentação, organizada por dois órgãos historicamente conflitantes em seus interesses: a Anatel e o CGI.br.

“Talvez precisemos de um novo Snowden para que os dois cheguem a um acordo benéfico para o usuário”, disse ela.

Sem isso, o que teremos mesmo é apenas “uma lei que pode fazer bonito no resto do mundo, mas que ainda não funciona”.

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São Paulo - Depois de anos tramitando pela Câmara dos Deputados , o Marco Civil da Internet finalmente entrou em vigor em 2014 – mais precisamente no dia 23 de junho.

Celebrado por grandes nomes da web como um exemplo de legislação a ser seguido, o documento elaborado de forma colaborativa nasceu com o propósito de garantir os direitos dos usuários e regulamentar a atuação de empresas na rede.

Mas seis meses depois de entrar em vigor, a elogiada nova lei ainda não foi regulamentada – e, por isso mesmo, foram poucas as mudanças vistas até agora.

“Aconteceu o previsto, na verdade: não deveríamos sentir nada na pele”, disse a INFO o advogado Victor Haikal, do escritório Patrícia Peck Pinheiro Advogados.

Segundo o especialista em direito digital, o Marco Civil foi feito para não afetar a vida dos usuários que já não prejudicavam ninguém.

Quem teve comportamentos inadequados, no entanto, “passou a ser tratado de forma diferente” – mas ainda de forma relativamente tímida.

No caso das empresas, a situação já é ligeiramente diferente, como explicou o próprio Haikal. “Houve impacto direto na contratação, por exemplo, de serviços em nuvem”, contou o advogado.

Graças ao Marco Civil, empresas de ramos como este que atuam diretamente no Brasil e têm representantes por aqui passaram a ser mais “protegidas”, de certa forma.

“E nesse sentido, a legislação já provocou perturbações na força.”

Gisele Arantes, advogada do escritório Assis e Mendes, e Renato Opice Blum, também especialista em direito digital e presidente do conselho de TI da FecomercioSP, concordam nestes pontos.

Segundo Gisele, o documento fez com que “as empresas fossem obrigadas a adaptar suas políticas”.

Blum, por sua vez, ressalta o impacto que a nova lei teve em regras internas, obrigando companhias a atualizar as normas de privacidade e a melhorar a segurança na hora de armazenar dados (que incluem os ainda polêmicos logs de acesso).

Regulamentação e polêmicas – Ainda assim, são poucas as mudanças provocadas pela chegada do Marco Civil da Internet até agora, algo que se deve ao fato de a lei não estar regulamentada.

Como destacaram os advogados, o processo deve ser feito em duas partes e iniciado apenas no ano que vem, sobre responsabilidade da Anatel e do Comitê Gestor da Internet (CGI.br).

E é ali no meio que os pontos mais polêmicos devem ser ajustados, na opinião dos consultados pela reportagem.

Para Haikal, por exemplo, a regulamentação deve trazer novas discussões relacionadas à neutralidade da rede e ao armazenamento de dados, algo que ainda não é exatamente regulado.

Mas tudo isso, novamente, afetará mais as operadoras e empresas prestadoras de serviço.

“O usuário poderá sentir algo nas atividades corriqueiras apenas caso a neutralidade seja comprometida e haja degradação de dados trafegados”, disse o advogado. Mas ele mesmo não acredita em mudanças nesta parte.

Gisele, por sua vez, já espera que erros, especialmente os relacionados à obrigatoriedade do cumprimento da lei, sejam corrigidos.

Segundo ela, apesar de as regras existirem, o Marco ainda não impõe penalidades a quem não aplicá-lo, e sim as condiciona à futura regulamentação.

Blum reforça este ponto: “A cultura do Brasil ainda está muito relacionada a multas”, disse o especialista – e justamente por isso, muitas empresas vão esperar até a regulamentação para se mexer e seguir tudo que a legislação exige, mesmo que isso signifique gastos bem mais elevados.

Os especialistas também esperam que o processo prometido para o ano que vem resolva a complicação envolvendo os logs de acesso, ponto mais controverso do Marco.

Para Haikal, ainda há pontos que permitem uma interpretação errada da lei, dando brechas para que empresas até optem por não guardar as informações.

O tipo de dado e a especificação de “uso” também não ficam muito claros no artigo – e esses, para o advogado, “são pontos que deveriam ter sido tratados com maior cuidado pelo legislador”.

Blum e Gisele ainda foram além quando trataram da guarda de logs e IPs.

Para ambos, o artigo na legislação é considerado até um retrocesso, de certa forma, e muito porque acabou reduzindo o período pelo qual as empresas são obrigadas a manter os dados em seus servidores.

A advogada lembra que um posicionamento já existente do Supremo Tribunal de Justiça previa que os registros ficassem armazenados por três anos – prazo que cairá para seis meses após a regulamentação da legislação.

E ainda relacionado aos logs, Blum disse que a proteção deles não deveria ser tratada em um Marco Civil, e sim ter uma lei própria.

Veredito – Em suma, segundo Gisele, após seis meses em vigor, “o Marco Civil deixa uma impressão neutra, de que está lá, mas ainda não é aplicado de forma alguma”.

E muito disso se deve ao fato de ter sido aprovado “às pressas” – algo motivado pelo evento NETMundial, realizado em São Paulo em abril deste ano, e pelo caso Edward Snowden, na visão da advogada.

Justamente por isso, ela também não é muito otimista quanto à rapidez na regulamentação, organizada por dois órgãos historicamente conflitantes em seus interesses: a Anatel e o CGI.br.

“Talvez precisemos de um novo Snowden para que os dois cheguem a um acordo benéfico para o usuário”, disse ela.

Sem isso, o que teremos mesmo é apenas “uma lei que pode fazer bonito no resto do mundo, mas que ainda não funciona”.

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